mais do que os olhos veem ෆ

6. ano novo, amor velho

[Música de referência: maze in the mirror - txt]

A menina bebericava o refrigerante calmamente, tentando assimilar algumas das conversas paralelas que aconteciam ao seu redor. A televisão estava ligada, cenas de "Batman vs Superman: a origem da justiça" passavam incessantemente. Desviando o olhar da tela, massageou seu pescoço e encarou friamente seu celular, sem desbloqueá-lo. O relógio marcava 23:30. 30 minutos para um novo ano. Para uma nova esperança (seja lá o que isso queira dizer).

Naquele cenário, ela sentia os últimos suspiros de 2022.
Os últimos momentos daquele ano tão corrido e estranho.

Em sua mente, uma reprise tentava se formar, sem sucesso. Como um trauma recém-sofrido, não parecia conseguir se lembrar dos dias mais marcantes ou das experiências mais incríveis daquele ano.
Como se nunca tivesse ocorrido.

Como se ainda estivesse presa em 2021.

Não, esqueça disto.
Ainda estava em 2020.

"Eu corro até o fim.
Mas, no espelho, tudo se torna um labirinto."

Ao se levantar da cadeira, indo até o banheiro, a garota posicionou as costas na porta fechada, respirando profundamente. Quantas vezes havia se visto naquele mesmo cenário de final de ano, onde nada parecia terminar ou começar. Sequer os fogos de artifício conseguiam acender a chama da alma dela, apagada há mais tempo do que conseguia recordar-se. Nada naquela comemoração parecia a alegrar. Nem a presença de seus queridos familiares. Nem o sentimento de recomeço.

Estava cansada de voltar ao início, sem saber ao certo para onde estava indo.

Olhou para suas mãos, para as inúmeras linhas em cada palma.
Pensou em sua vida.
Não pensou por muito tempo, pois cansou-se de tentar encontrar uma narrativa linear.
Estava desordenada, em pedaços pontiagudos e espalhados por todo o canto.
E teve medo de se ferir. Como sempre tivera.

Pensou em Chris, a única constante de sua vida. E sorriu sem perceber. Sua grande e bizarra história de amor era a maior lição de sua vida, o maior porto seguro já encontrado por ela, o melhor encontro que já vivenciou.
E se perguntou se ele nunca havia se cansado dela, pensado em desistir de tudo aquilo, desejado não ser parte daquela bagunça.

Tal pensamento a forçou a parar de sorrir.

Encarou-se no espelho, tentando não chorar - ainda mais porque não conseguiria explicar ao restante dos parentes por que seus olhos estavam vermelhos.
E, naquele instante, recebeu uma mensagem dele.

E sentiu como se pudesse flutuar novamente.

"Preciso caber nesse quadro grande.
Ele ainda parece tão pequeno, pequeno.
Por favor, me ache, por favor."

Chris (23:39)
"Oi, amor. Você está bem?"

Ela digitou a resposta com pressa, como se estivesse com medo de mantê-lo esperando.

"Estou, sim! Por que pergunta?"

Chris (23:40)
"Eu estava preocupado, pois percebi que estava um pouco perturbada com algo. Apenas não sei com o quê."