Capítulo 4 - Duas colheres

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- O que faz aqui? – Pergunto enquanto destravo a janela e a empurro lateralmente permitindo que ele entrasse.

- Eu não tenho seu número, e acho que está tarde para buzinar então... – Ele diz enquanto adentra meu quarto.

- Então você escalou o telhado até o meu quarto? Como fez isso?

- Na verdade foi bem mais fácil do que eu imaginei que seria... pijama legal – ele aponta para mim e sorri.

Tento inutilmente tampar o desenho já desgastado do Piu Piu na camisa do meu pijama mega infantil.

- Então, o que faz aqui? – Que pergunta mais besta... eu deveria estar comemorando, quando na vida achei que isso aconteceria?

- Vim para tomarmos sorvete! O que me diz?

Ele levanta a sacola em sua mão, com uma expressão fofa, mostrando que realmente trouxe um pote de sorvete.

- Vamos até a cozinha então? – Me viro em direção a porta, mas sou surpreendida com sua mão de encontro a minha – O que foi? – A voz quase não sai para fazer a pergunta.

- Ou você pode somente pegar duas colheres e nós podemos continuar assistindo.

Ele aponta com os olhos para a TV.

- É um romance coreano, muito romance mesmo, tem certeza?

- Alguém já te disse que você pergunta demais?

- Já sim, eu vou buscar as colheres tá?

Saio correndo do quarto com meu coração batendo em ritmo de escola de samba, desço a escada e vou em direção a cozinha, pego duas colheres e volto correndo. Chegando ao final da escada minhas pernas fraquejam, uma ansiedade domina o meu corpo e mente, o que faremos assim que eu entrar? Com que intenção ele veio até meu quarto? Por que do nada o garoto dos meus sonhos está entrando em minha vida?

Desço as escadas novamente de forma silenciosa, vou até a sala e disco em meu telefone fixo o número da casa de Clarinha, faço uma oração silenciosa para que ela atenda. Após alguns segundos ouço sua voz sonolenta.

- Alô?

- Por que isso está acontecendo? – Falo sussurrando.

- Informações amiga... – ela diz confusa

- Ele, qual o motivo pra ele estar no meu quarto com um pote de sorvete disposto a assistir pousando no amor comigo? – Descarrego minhas dúvidas.

- Espera, Victor?

- Sim! – Esclareço.

- Ellen, não pensa demais tá, só aproveita o momento, pra saber o que ele quer, você tem que deixar rolar, se ele estiver mal-intencionado, eu mato ele, tudo bem?

- Estou com medo.

- Você sempre está com medo, por isso mal sai de casa. Fura a bolha amiga, vamos viver esse ano, esqueceu?

- Acha que consigo?

- Claro que consegue, você é incrível.

- Você que é!

- Eu sei! Agora eu vou voltar a dormir, e você, vai parar de falar comigo, vai subir as escadas, e mostrar pro garoto maravilha o quanto ele é sortudo por estar na sua presença!

- Ou algo do tipo... – falo rindo.

- AGORA!

Clara desliga o telefone, e eu faço o mesmo. Subo as escadas e paro em frente a porta do meu quarto, a cena que eu presenciava era digna de uma foto. Victor estava usando óculos de grau, deitado em minha cama, abraçado com meu urso de pelúcia assistindo o primeiro episódio de pousando no amor, tão concentrado, tão lindo, e ainda por cima, deitado na mesma cama que eu fantasio todas as noites... Só faltava uma coisa, somente um pequeno detalhe me incomodava.

Passo pela porta do quarto e vou em direção a cama, Victor sorri para mim e acompanha meus passos com o olhar

- O que...

Ele começa a falar algo, porém não termina. Sento a beira da cama, apreciando fixamente sua beleza, levanto uma de minhas mãos lentamente em direção ao seu rosto, eu poderia facilmente tocar em sua pele de porcelana, eu poderia facilmente...

Meus olhos vão de encontro aos seus, e então, volto a realidade, o que eu estava fazendo?

- Me desculpe... – falo sussurrando quase em uma prece.

Abaixo minha mão, meu rosto queimava de vergonha, olho para o chão, tentando pensar em algo para sair daquela situação embaraçosa, droga... Nada vinha a minha mente...

Sinto sua mão gélida e macia tocar a minha, experimento uma linda sensação de carinho, seus dedos roçam nos meus, a vergonha que percorria meu corpo se transforma em calor, volto meu rosto lentamente para o dele. Seus olhos tom de marrom se encontravam os meus. Vejo seus lábios se movimentarem algumas vezes, e então ouço sua voz doce dizendo...

- Eu quero!

Minha respiração aumenta, o calor quase me incendeia, seus lindos lábios se movimentam de novo, e a frase que já era provocativa o suficiente se torna mais quente ainda.

- Eu quero que me toque.

PerdiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora