CAPÍTULO UM

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Como um barco no mar
Na tempestade, eu permaneço lúcido
Porque na minha mente só tem você
Na minha mente só tem você


01


O terror que se estendera ao longo de seis tortuosos meses, começou naquele fim de junho com um nariz sangrando e um par de tênis encharcado pela água da chuva. Embora ainda fosse verão, uma tempestade torrencial caía sobre Yeosu lavando a poeira das ruas e regando as plantas secas das velhas casas localizadas no centro da cidadezinha portuária.

De baixo de uma cobertura, a cinco quadras da loja de conveniência, Kim Sunoo observava a chuva paralisado. Ele não viu ninguém na rua Seongsu-dong, olhou por mais um momento e atravessou a chuva correndo. Quando empurrou a porta de entrada do estabelecimento, totalmente encharcado, sentiu seu corpo paralisar. Olhou na direção do balcão, vendo Riki Nishimura o encarar à distância.

Sunoo colocou a mão sobre o nariz que sangrava e correu para os fundos da loja, fugindo da vista do garoto. Já podia ouvir o som do ventilador enferrujado, o vento arrepiando seu corpo molhado da chuva conforme caminhava entre as prateleiras.

Ao longe, ouviu a buzina de um carro quando freou no cruzamento e estacionou em frente à loja. Minutos depois, dois adolescentes saíram do veículo e entraram ali, gargalhando alto e esbarrando nas coisas. Sunoo os reconheceu. Ele pegou um pacote de algodão, gaze e band-aids, e se encolheu na última estante, rezando para que os brutamontes fossem embora sem notá-lo.

Os conhecia do colégio, eram da sua turma e normalmente nutriam um prazer cruel em intimidá-lo sem motivos. Sunoo já estava cansado daquela rotina. Novamente os pensamentos ruins pareciam crescer em sua mente, voltavam com tudo como uma enxaqueca.

O Kim havia se mudado para aquela cidade há oito meses, mas nem ali tinha conseguido fugir das intimidações e do estranhamento. Às vezes, quando se olhava no espelho, ele conseguia ver as coisas que o ódio estava fazendo com seu corpo, embora ele mesmo fosse indiferente a forma como o tratavam.

De qualquer modo, Sunoo não queria sangrar mais do que já sangrava, com a mão pressionando o lado machucado do nariz, então permaneceu ali em silêncio, torcendo para que fossem embora. Alguns minutos depois, os mesmos garotos saíram gritando e xingando sobre não conseguirem comprar cigarros e desapareceram no mesmo carro do qual saíram.

Sunoo mordeu os lábios secos em alívio e somente quando fechou os olhos e contou até cinco, foi que conseguiu se acalmar. Ele caminhou de forma desajeitada até o balcão, rezando para que seu coração voltasse a bater normalmente.

Riki Nishimura estava com a cadeira virada de lado, ouvindo música enquanto resolvia as palavras-cruzadas do jornal. Os fios negros estavam caindo sobre os olhos e ele se mexia suavemente ao som de alguma canção.

Sunoo também o conhecia do colégio, embora nunca tivessem trocado palavra alguma. A lembrança não saía da sua cabeça na época, a primeira vez que esbarrou com Riki durante a troca de aulas. E embora no começo não entendesse os motivos de pensar tanto em outro garoto, quanto mais o tempo passava, mais forte a impressão dele ficava nos pensamentos cotidianos de Sunoo. Na realidade, fazia um tempo que ele tinha adquirido um interesse particular em observar o Nishimura no colégio, às vezes na loja de conveniência ou quando o encontrava no Porto de Yeosu ajudando o pai no trabalho.

De qualquer forma, Sunoo ainda precisava encarar a realidade e tratar seu nariz que sangrava. Àquela altura sua mão estava tremendo por equilibrar tudo aquilo sozinho, então jogou as coisas de uma vez sobre o balcão, chamando a atenção do outro.

Quando se virou, Riki o encarou por um breve momento.

- Seis mil wons. - disse, colocando as coisas em uma sacola.

Sunoo mal abriu a boca, sentindo seu rosto esquentar. Ele tirou o dinheiro úmido do bolso da calça e entregou para o outro, desviando os olhos para o chão.

Riki Nishimura era o tipo de pessoa que quando chegava num local, as pessoas despertavam. Ele era um garoto alto, com o cabelo negro e olhar intimidante, o tipo de olhar que podia ser sentido quase fisicamente. Sua pele era morena, bronzeada pelo sol do Porto. E a voz era grossa e suave. Sunoo podia ver as palavras escorregando da língua dele, como ondas do mar se arrastando para dentro do seu ouvido.

Embora não admitisse, Sunoo sabia exatamente o que aquela falta de ar e calor irracional significavam. Era praticamente impossível para ele controlar aqueles sentimentos ardentes que lhe tiravam o sono a noite. Por mais que lutasse, e como havia lutado, para não pensar em Riki e em sua existência particularmente extraordinária, seus olhos o traíam mais que seu coração, sempre se perdendo naquele garoto bonito e enigmático que de alguma forma havia o cativado.

Como naquele momento, no qual Sunoo levou um tempo considerável o encarando e quase esqueceu de pegar as coisas que tinha comprado.

Riki pareceu não se importar, voltando às palavras-cruzadas como se Sunoo nem existisse. Ele colocou os fones de ouvido e se curvou sobre as folhas espalhadas no balcão.

O Kim sorriu constrangido, pegando suas coisas para dar o fora dali. Olhou para o Nishimura a distância uma última vez, um vislumbre da imagem do garoto passando pelos corredores do Colégio invadiu seus pensamentos.

De repente, Riki o encarou de volta.

Com um único olhar dele em sua direção, Sunoo sentiu todo o calor do verão atravessar seu corpo em um choque elétrico. Seu coração, ele não batia mais no peito, parecia estar prestes a pular da boca.

Consciente das suas próprias emoções, correu para fora dali e parou somente quando chegou nos limites da cobertura lateral do prédio, com o vento arrepiando seu corpo. Naquele horário, a luz do fim de tarde estava quase sumindo no horizonte. Sunoo sentia como se tivesse passado uma eternidade dentro da loja e seu corpo parecia mole após tanto tempo travado em nervosismo.

O sangramento também não parecia dar sinais de melhora e ele buscou o algodão na sacola para tapar o sangramento, notando que suas mãos ainda tremiam devido aos abalos sísmicos que seus sentimentos causavam dentro do seu peito.

De repente, ao rebuscar a sacola, tirou dali um pirulito redondo. Sunoo ficou o que pareceu uma eternidade encarando a embalagem cor-de-rosa, tentando entender como o doce havia chegado ali. Sentia-se confuso e perdido, mas de repente uma felicidade insuportável subitamente tomou seu coração. E seu estado de espírito era caótico como uma tempestade, mas sua mente estava absurdamente lúcida.

Vou enlouquecer, pensou Sunoo, ele vai me enlouquecer. Pressionou a mão no peito, sentindo o coração prestes a explodir em mil constelações, todas determinadas a queimarem pela eternidade. Se a felicidade tivesse gosto, com toda certeza teria sabor de tutti-frutti.





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Olá, aqui é Vonnie <3

+ Essa história possui dez capítulos e aqui vocês vão conhecer Kim Sunoo como o último romântico existente rsrs

+ A história se passa em 2008, tenham isso em mente


+ Todas as frases iniciais dos capítulos são tiradas de músicas que inspiraram a história. Para o capítulo um, utilizei Yes To Heaven da Lana Del Rey ;)

Ps: Eu realmente espero que alguém tenha lido e gostado, beijinhoss


Mar Leste | SUNKIOnde histórias criam vida. Descubra agora