Prólogo

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Quando crescemos em um mundo de mudanças, sonhamos com todo o futuro que elas irão proporcionar. Eu, sendo grande sonhador, imaginava que se chegássemos ao ano de 2021 certamente veríamos avanços inacreditáveis e teríamos as mais elaboradas soluções para os problemas da humanidade, esperava algo próximo do que vemos hoje em grandes filmes de ficção científica e por esperar ver todas essas coisas, eu nunca desejei a morte.

Em 1936, quando eu era ainda jovem demais para pensar sobre ela, vivíamos um fervilhão de novidades. Tudo muito mais lento do que hoje, mas naquela época, era absolutamente assustador e fascinante observar as indústrias crescendo como mato, trazendo carros e mais carros à medida que também espalhavam-se telefones de diferentes modelos, aviões... Ah, os aviões...

E em 1939 os rumores criaram formas e rostos. Me lembro de pouca coisa, mas delas a sensação de medo e decepção eram o que me seria mais marcante. Eu tinha 8 anos. Junto de 2 tios (que mais tarde eu entenderia como um casal) muito amigos de meus pais, eu e minha irmã Rebecca viajamos das terras polonesas para esse país, com nomes novos e muitas regras, passamos a viver com eles em Novo Hamburgo – RS e ajudávamos a fazer sapatos de couro para vender, enquanto nos familiarizávamos com a nova língua, os costumes, a temperatura e a incerteza do seria a vida. Eu amadureci antes do esperado e contra a minha vontade.

Em 1945 eu já não sabia se era órfão ou se deveria voltar para a Polônia. Nem eu e nem José e Abner, os tios que cuidaram de nós até então. Minha irmã foi para um convento por escolha própria, foi o seu jeito de lidar com os fatos, mas eu não admitia que aceitássemos assim tão fácil que tudo havia se perdido, acreditava que tivesse sobrado alguém da minha família, qualquer um... Odiava o Brasil e já não via beleza na tecnologia e em revoluções. Esperei pacientemente até ter 18 anos e com o salário da loja de sapatos que recebia e guardava desde os 14 anos, parti de volta para meu país natal em busca de sinais de vida daqueles que antes me eram queridos.

Percebi naquele ano que nossa percepção infantil sobre as coisas aumenta tamanho e importância de tudo, nada era como a minha infância e eu não me abalei como pensei que me abalaria ao descobrir que estavam todos mortos. Por outro lado, tive tempo para pensar sobre a morte de uma perspectiva mais realista e concluí que não temia, mas também não a desejava e, apesar disso, não tinha escolhas porque certamente ela me agarraria e me levaria para suas terras obscuras em algum momento.

Com Rebecca decidida a ser uma freira, minha maioridade finalmente alcançada e dinheiro suficiente para deixar a Polônia em busca de um novo destino que não fosse o Brasil, peguei uma condução que me deixou na Inglaterra, aonde decidi que permaneceria até ter um novo plano. Encontrei trabalho em uma alfaiataria e passei a dividir um quarto pequeno com um jovem chamado Adam, nos tornamos grandes amigos com o tempo, talvez ele tenha sido meu primeiro amigo em toda a história. Juntos aprendemos a beber e a sair para dançar, vendíamos ternos e comprávamos álcool e cigarros, certos de que poderíamos viver de nossa parceria para sempre.

Os anos foram passando rapidamente e quando percebemos, Adam estava se casando com uma francesa chamada Julia e eu tinha 23 anos e um carro velho.

Ficar só, apenas deu espaço para minhas inquietações acerca da vida, e os questionamentos sobre o sentido de tudo me levaram à uma pista vazia numa noite de outono, que incitaram a mais imbecil das atitudes que um homem solitário e infeliz pode tomar, resumindo toda minha crônica maldita ao pé pesado e encorajado pelo bom whisky sob o acelerador do meu único bem, afim de desafiar a senhora de vestes negra que eu pensava reinar no fim de todos os mundos.

Mas ao invés de um grave acidente e a vitória da minha querida e abominável inimiga, ganhei apenas o abraço que estenderia toda a dor para a palavra que ainda me aterroriza: A eternidade.

Neste breve resumo de como atropelei a vida eterna, venho me apresentar como seu narrador e protagonista de uma história sobre expectativas frustradas, amor e dedicação ao caos. Eu me chamo Joshua Oliveira, Oliveira foi o sobrenome que ganhei para me refugiar no Brasil em 1939 (também o único da qual me lembro).

Divirta-se com a merda da minha não-vida.

O Caos de JoshuaOnde histórias criam vida. Descubra agora