Quando criança, fui muito incentivado a me conectar com o sagrado. Criança ansiosa e inquieta que era, minha família me dava a certeza de que se eu rezasse, as divindades me ajudariam. Não posso negar que em muitos momentos isso aconteceu. Seja lá o que você acredita que venha a ser a divindade.
Cresci um menino muito religioso. Tinha gente da redondeza que apostava que eu seria padre. Pelo menos que queria muito que eu fosse. Adolescente, a coisa mudou um pouco de figura. Comecei a entender o quanto as pessoas se corrompem por religião, em nome das divindades (que nada tem a ver com isso). E isso foi me afastando e afugentando daquilo que era pra ser um bálsamo de consolo operante e passou a parecer mais um jogo de poder bem humano.
Meu erro, nesse aspecto, foi abnegar de muito do que a fé te empresta: esperança, benevolência, gentileza, senso de comunidade. São coisas difíceis de retomar depois de uma desilusão.
Contudo, nunca deixei de admirar quem tem fé. E sempre senti muita falta de ter fé nas coisas, em Deus, no universo, no que quer que seja.
Olhando pra trás, e lembrando da minha avó, lembro do quanto a fé e a esperança eram inabaláveis. Mesmo nos piores cenários. Mesmo diante da própria finitude. A certeza de que uma força superior sempre esteve ali por nós era uma crença impossível de ser quebrada. E que bom.
Aos céticos, como sou em muitos aspectos, a fé pode ser simplesmente o consolo e a esperança de que não estamos à deriva na vida, suscetíveis a um conjunto de aleatoriedades que podem nos levar da fortuna à sarjeta (em todos os sentidos) em muito pouco tempo.
Mas acredito também que é impossível que a gente tenha vindo do nada, indo para o nada.
Admiro muito quem tem fé. Uma fé operante e contagiante, não restritiva e julgadora. Todos nós temos sensíveis e delicados tetos de vidro. Não temos tanta virtude pra ter o direito de apontar, julgar e ter a presunção de corrigir a vida alheia. Nossas escolhas são individuais e instransferíveis. E isso é uma praga e uma bênção.
Recentemente, tenho tentado me conectar mais com essa fé, que anda meio perdida. E nessa busca, tenho relembrado a alegria que é poder pedir ajuda no íntimo, de um jeito que só uma divindade que saiba realmente quem você é poderia entender.
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BEM-VINDOS À MINHA CABEÇA CAÓTICA
Non-FictionAntônio Abujamra, grande poeta, ator e dramaturgo brasileiro, disse uma frase que me define: caminhando no incerto e idolatrando a dúvida. E acho que é assim que formo insights que, às vezes, me ajudam a ajudar alguém. Pra tentar entender a vida, eu...