Era estranho, Aki pensava.
Ele tinha passado o fim de semana inteiro pensando em como tinha salvado Angel.
Foi um abraço sincero.
Angel também pensava nisso, em como nunca tinha recebido um abraço antes.
Nunca tinha sido tocado.
Na verdade, a sensação era boa. Era diferente. Ele queria sentir aquilo de novo.
Foi por isso que a porta do Hayakawa tocou naquela noite.
- Quem é?
Aki pergunta, sem esperar uma resposta específica.
Sem resposta, ele simplesmente levanta do sofá, onde estava deitado.
Power e Denji estavam dormindo, então, ele se dirigiu a porta devagar, e a destrancou.
Quando abriu, surpreendeu-se com a figura que estava em sua frente.
- Angel?
O mais baixo o fitava, pensativo.
- É. Posso entrar?
Se arrependeu no momento em que fez a pergunta, e começou a se questionar, se era melhor ter ficado em casa, dormindo em sua cama macia.
Afinal, era uma noite chuvosa, tem coisa melhor do que dormir em uma noite chuvosa?
Aki o encarava, pensando se era uma alucinação, ou se o garoto estava mesmo ali.
Já que o mesmo reclamava só de ter que se mexer, imagina se dar ao trabalho de ir na casa dele?
Mesmo assim, ele deu espaço para Angel.
- Claro.
Angel esperou uns segundos, olhou para dentro da casa de Aki, analisando cada móvel.
Até que decidiu entrar, andando até a sala, e sentando no sofá.
Aki o seguiu, sentando ao seu lado.
O silêncio dominou o ambiente, já que nenhum dos dois sabiam bem o que dizer.
Angel olhava para a cozinha, e Aki olhava para o chão, pensando no que dizer.
Então, decidiu quebrar o silêncio.
- Tem algo que eu possa fazer por você?
Angel move sua cabeça lentamente na direção de Aki, e o encara.
"Fazer algo por mim". Ele pensou.
Ele sabia o que queria ali, mas não se sentia confortável o bastante para dizer.
Quem aparece do nada na sua casa, e simplesmente pede para que você apenas o toque? Ou que o abrace?
Imagina você dizer que só a companhia de seu "amigo" já é o suficiente para que você se sinta bem?
Amigo. Ele era seu amigo? Se conheceram há pouco tempo. Já eram amigos?
Essa dependência fazia sentido? Era a primeira vez que ele sentia que precisava estar ali.
O que ele iria responder?
- Não.
Responde, simplesmente.
Aki o olhava, confuso.
- O que você quer, então?
Mais outra pergunta que ele não saberia responder.
- Eu quero saber... O motivo de você ter me salvado...
Aquela resposta não fazia sentido, Aki já tinha dito para ele que ele não queria perder mais ninguém, e que Angel o tinha ajudado naquela vez. Então, ele apenas o ajudou também.
- Eu já disse o motivo.
Dessa vez, seus olhares se encontraram.
Se encaravam, tentando entender um ao outro.
- Mas... Você é um humano estranho, sabia? Ninguém chega perto de mim, nem conversam comigo. Ninguém quer morrer, mas você não. Você segurou na minha mão e me abraçou. Isso não faz sentindo nenhum!
Aki suspira.
- Eu poderia pegar em sua mão de novo, e te abraçar também. Sabe por que? Porque tudo depende da situação. Eu já vi morte demais, Angel. Acha que tenho medo dela? Penso nisso todas as noites, sobre como sou um homem condenado, posso morrer a qualquer momento. Perder dois meses de vida ou mais não importa. Se for para salvar alguém, eu faria o que fosse preciso. Esse é o significado de ser um caçador de demônios.
Angel arregala os olhos, a resposta foi bem escolhida. Mas ainda não fazia sentido.
- Eu sou um demônio, Aki. Você me salvou mesmo assim...
Aki estava perdendo a paciência, estava ao ponto de dizer algo que nem sabia o que era.
- Um demônio que faz parte do esquadrão. É meu parceiro.
Angel não podia acreditar no que ouvia, poderia um humano o considerar seu parceiro?
- Não sou seu parceiro, eu já disse que odeio humanos.
Aki deu de ombros.
- Não me importo.
Angel se levanta do sofá.
- Não posso ficar ouvindo coisas assim, coisas que nenhum humano diria! Você tem pena de mim, Aki? Eu não preciso da sua misericórdia!
Ele anda em direção a porta, mas ouve passos atrás de si.
- Não tenho pena de você... Eu só... Perdi pessoas demais. Não quero perder você também.
Angel paralisa segurando a maçaneta, parecia forçado. Eram palavras loucas vindo dele.
- A gente perde pessoas o tempo todo.
Ele se vira para Aki, que estava centímetros de distância dele.
- Sim.
Aki concorda, e Angel percebe o que ele estava querendo fazer.
Antes que o fizesse, ele passa por baixo de seus braços compridos.
- Não pode me tocar, Aki! Você já perdeu dois meses...
Aki se vira para ele, com um olhar vazio.
- Eu vou morrer em breve.
O mais baixo não entende, então fica em silêncio.
- Vou morrer para o Denji. E a Power vai morrer também.
Angel sente seu queixo cair, então, tenta assimilar aquilo.
- O quê?
Aki se aproxima dele de novo.
- O demônio do futuro me mostrou como vou morrer.
Dessa vez, Angel deixa que Aki chegue perto.
Estavam tão próximos, que o abraço que ele tanto queria estava logo ali.
- Você não pode...
Ele sente a respiração de Aki perto de seu rosto, e quanto se dá conta, ele estava segurando em seu queixo, e a outra mão acariciava suas bochechas.
- Me deixe morrer de uma forma que eu possa me lembrar de você.
Angel estremece, e sente seus olhos marejarem. Ele não queria que Aki morresse.
- A gente pode impedir... Aki...
Seus rostos se tocam, assim como seus corpos já estavam entrelaçados, Aki coloca sua mão em sua cintura, enquanto a outra segurava seu rosto.
- Não tenho salvação.
Seus lábios se tocam, e Angel se entrega totalmente.
Aki o envolve em seu abraço quente, e Angel esquece totalmente do mundo ao seu redor.
Apenas quer que aquilo dure para sempre, o beijo, o abraço, tudo.
Era tão egoísta, que queria Aki para si, para sempre.
O beijo se aprofundou, suas línguas se tocavam, enlouquecidas, num desejo sem fim.
Quando seus rostos se separam, ofegantes, Angel segura firmemente em seu rosto.
- Aki... Fique comigo... Por favor...
Aki sentia sua vida sendo sugada violentamente pelo Angel Devil. Mas era a sensação mais bonita que já tinha sentido em sua curta vida. Que iria acabar em poucos minutos.
- Fico... Fico sim...
Ele sorri, tentando acalmar o pequeno ser que o abraçava, desesperado, sabendo que estava matando outra pessoa que amava.
Eles se deitam no sofá, e ficam abraçados por um tempo.
Às vezes, trocavam selinhos, alguns beijos mais intensos, mas não passava disso.
Acariciava os cabelos do Anjo, e esperava que o mesmo adormecesse, para que não visse o que iria acontecer.
E dá certo, Angel adormece em poucos segundos, abraçado nele.
Aki sente suas forças indo embora cada vez mais rápido, então, fecha os olhos, esperando sua hora chegar.
Estava feliz, pelo menos, sua morte seria agradável.
A chuva já tinha parado, e a lua tinha sido trocada pelo sol.
Os passarinhos cantavam, como se fosse um dia bonito.
Angel abre os olhos, sentindo seu corpo sendo abraçado. Sorri, pois a sensação ainda era boa.
- Bom dia, Aki.
Ao ver que ele não respondia, tentou mexer nele. Nada.
Entrou em desespero, pois se lembrou do seu maldito poder.
Vendo que ele não podia fazer nada, se levantou rápido do sofá.
- Não... De novo não... Aki...
Sentiu seu rosto sendo inundado por uma dor inexplicável, seu peito apertado, suas mãos trêmulas.
Na tentativa de parar aquela sensação, passou suas mãos pelo seu rosto, tentando secar aquela dor.
Vendo suas mãos molhadas, percebeu que havia chorado.
Sem saber o que fazer, correu para fora da casa dele.
Correu como nunca tinha corrido em toda sua vida.
Só parou quando viu que não fazia mais sentido.
Nada fazia mais sentido.
Porque agora, estava sem ele.