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*Tenho um aviso para os leitores dessa fanfic, serão duas pessoas escrevendo essa historia, eu e minha amiga YABE0202(esse e o nome da conta dela).

 Durante muito tempo acreditei ser a realidade que poderia engolir, as falas, as risadas e piadas, tudo eu conseguia suprir da melhor forma possível. Fazia isso para manter tudo no controle, aguentava para conquistar meu espaço. A minha vida foi uma completa e inacreditável obra de teatro perfeitamente desenhada do jeito que quisessem apreciar. Meus pais trabalhavam muito e ganhavam pouco para equilibrar as contas, sempre transparecendo cansaço nas expressões e no corpo. Então, no meu mais novo papel de pequena boneca, abandonei a minha paixão e vocação para ajudar a minha família. Eu faria tudo por eles, quer dizer, sempre fiz. A verdade nua e crua é que eles nunca tiveram culpa pelo que aconteceu e nunca teriam.

Me assustei com o cheiro da fumaça e imediatamente larguei a faca em cima da mesa e corri até o fogão de quatro bocas com pano de flores como enfeite para desligar o fogo.

— Ai, merda...!!! - meu pequeno resmungo veio acompanhado de tosses por conta da fumaça, minha calda quente foi direto para o lixo, infelizmente.

Quando terminei de lavar as vasilhas cheias de massa e de arrumar a mesa cheia de ingredientes, em uma cozinha muito menor para caber quatro pessoas nela, ouvi passos de uma pessoa.

— Já é a quarta vez que isso acontece Aisha, sabe que não gosto quando cozinha no meio da noite - minha mãe aparece descendo as escadas que dão acesso à cozinha e a sala, com um olhar irritado e voz de repreensão.

— Eu sei, mãe, só estou fazendo algo para o Josh comer amanhã na escola - disse sem olhar para ela, guardando os recipientes e ingredientes que sobraram no armário de madeira, a única coisa que meu pai fazia direito nessa vida, construções inacabadas.

Ouvi minha mãe respirar fundo

— Obrigada por ajudar Aisha, mas não precisa se preocupar com isso agora - ela sentou na cadeira após falar - sente comigo, quero conversar com você antes de dormir - eu sei que não é um pedido, isso tem se repetido muito nas noites que eu tenho insônia, ultimamente não estou conseguindo mentir com facilidade, isso é uma droga.

— Tudo bem, mãe - tive que respirar fundo, porque sei que não tenho escolha, dessa forma, puxei uma cadeira para me sentar.

— Sabe que você não precisa fazer isso, você não tem culpa de nada, nunca teve, e precisa dormir para amanhã - ela disse olhando nos meus olhos com a voz embargada dessa vez, perdi as contas de quantas vezes parávamos só para conversar sobre tudo.

— Pessoas como nos não podem parar de fazer algo ou não precisar por escolha mãe, eu preciso continuar, mesmo que eu queira o mundo não vai pausar - toquei nas mãos da minha mãe, as quais estavam juntas em cima da mesa - Você me ensinou a ser forte e eu sempre consegui ser, não vai ser hoje que vou falhar - disse levantando para guardar o resto das coisas, fiquei de costas para ela de novo, mas ouvi o fungar do nariz dela e os passos característicos em direção ao quarto.

— Só falta lavar essa panela nojenta - disse para mim mesma, sabendo que daria trabalho tirar a calda queimada. E tão inesperadamente como um raio senti a sensação de novo, uma coisa dentro de mim se formar.

— Não, não, não! - digo indo direto para a geladeira para beber água - Isso de novo não! - digo sentindo uma eletricidade me invadir desde o meu peito se espalhando por todo o meu corpo, algo pesado, forte e intenso.

Quando olho para o meu corpo tive a certeza de ser tarde demais, uma dor intensa passa pela minha cabeça como se estivesse derretendo-a. Uma sensação forte demais para controlar, até ouvir os móveis tremerem, a mesa, as cadeiras, os copos em cima da mesa, tudo começa a tremer.

Corro em direção ao banheiro, me olhando no espelho com os meus olhos amarelos, coloração da mesma energia elétrica que rodeia o meu corpo.

— Tá bom, Aisha, se acalma - declaro em sussurro para mim mesma - Isso vai passar, é temporário, você está segura aqui, está tudo bem - respirei mais fundo que posso e fecho os olhos - está tudo bem, está tudo bem - Sinto que a sensação estava menor a cada palavra dita por mim, que estava voltando para o meu peito como se estivesse me escutando.

Abri meus olhos e encarei meu reflexo, os olhos sempre castanhos estavam visíveis outra vez.

Desde muito nova, sempre fui considerada a mais inteligente da classe, a esperta que acertava quase todas as questões. Entretanto, tinha algo que era sempre posto na mesa, um momento que fazia eu me lembrar diariamente o porquê de me dedicar tanto, a resposta estava bem na minha cara o tempo inteiro, literalmente, a verdade posta e escancarada por muitos. Não importa o quanto eu tente, vou ser sempre a mulher preta com cabelos diferentes da maioria, minhas falas inteligentes e tudo que eu disser ou faça é reduzido a nada, principalmente se morar em um dos bairros mais precários do Estado, além de ter uma casa pequena demais.

É por isso que não posso descansar, não posso me dar ao luxo de desistir, não agora. Mudei meu jeito de ser, de vestir, meu cabelo preto e cacheado demais, estava agora liso, sempre dizendo sim quando, na verdade, quero e muito dizer não.

— O que foi esse barulho Aisha? - minha mãe grita do quarto para eu ouvir.

— Nada, mãe, já estou subindo - falo a ela limpando minhas lágrimas e lavando meu rosto com água. - Você é perfeita, sempre foi e sempre vai ser, amanhã a gente tenta de novo - sussurro para mim mesma, então eu choro em frente ao espelho e me sinto péssima ao perceber:

Como um mantra que sempre funcionava para mim se tornou tão ineficaz?  

Metal & AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora