Amo recordar um amor não vivido. Sim, isso mesmo que você leu, um amor que não deu certo.
É estranho, mas muitas vezes acontece, principalmente quando se é muito jovem. Você conhece uma pessoa, se apaixona e não consegue ver os defeitos dela, não enxerga a falta de interesse e se entrega a um amor fictício.
Os enamorados têm mania de idealizar seus pares, isso é bom de certa forma, pois assim vivem um amor de faz de conta, mas com sentimentos muito genuínos. E é melhor viver um amor, mesmo que seja de faz de conta, do que nunca ter amado alguém.
Então, se eu digo tudo isso, é porque já aconteceu comigo. Tenho certa experiência em amores de faz de conta e em como acabam.
Há alguns anos eu era uma garota de dezoito anos, já na universidade e estava apaixonada, caidinha, em suspensão gravitacional pelo rapaz da biblioteca e leitora feroz como sempre fui, a amizade surgiu naturalmente.
Era chegar na biblioteca e ser saudada com um lindo sorriso e ouvir aquela voz aveludada dispensando toda sua atenção só pra mim. Arrepiava ate a espinha ao ouvir um simples: Olá, qual será a leitura de hoje? Atualmente eu acho engraçado, mas na época eu vivia essa paixão.
Passados alguns meses, eu já havia lido ou mexido em mais da metade dos livros daquela biblioteca e o rapaz se limitava a me cumprimentar e indicar algumas leituras. Poxa vida, aquela minha paixão já estava me irritando, não tinha mais conjecturas ou fofocas pra discutir com minhas amigas, o rapaz não reagia. Eu sempre fui assim, intensa, ate demais, letargias me incomodam.
Continuei insistindo com minhas leituras e nada do rapaz se dirigir a mim da maneira que eu queria, com um convite, um elogio, um código de amantes, nada. Pois é, nada, nadinha mesmo.
Meu telefone estava mudo, sem respostas do outro lado. Minha certeza não tinha fundamentos e então resolvi enterrar aquele amor de faz de conta dentro de mim. O amor pelo rapaz é claro, pois o profundo, sincero e correspondido amor pela leitura se manteve, cresceu, fortaleceu e vocês não vão acreditar no que aconteceu.
Estava eu, passados três anos na universidade, entretida em pesquisas para minha monografia, no laboratório de informática, quando sou surpreendida com um beijo estalado na bochecha. Aquilo me irritou demais, quem ousava interromper minha pesquisa com a trivialidade de um beijo não solicitado?
Sabem quem era, pasmem, era o rapaz da biblioteca, fiquei meio chocada olhando pra ele, e ele sem muita cerimônia, de um jeito que no passado eu sempre quis e ele nunca foi capaz, foi chegando bem pertinho, olhando no fundo dos meus olhos, me enlaçando em um abraço e dizendo que eu era linda, maravilhosa, inteligente, que ele estava solteiro e se eu aceitava sair com ele.
A resposta obviamente vocês já sabem, um sonoro não. Claro que não, três anos atrás quando eu era uma jovem caloura e idealizava tudo talvez, mas agora depois de tanto tempo na companhia de homens notáveis como Roberto Drummond, Guimarães Rosa, Ruben Alves entre outros, eu aprendi o que de fato é o amor, e o amor se constrói através de reciprocidade.
Entre eu e o rapaz da biblioteca nunca houve reciprocidade e agora anos depois ele me procura? Ou seja, sempre soube do meu interesse no passado e nunca correspondeu, muita ousadia dele querer que eu o corresponda agora.
Há esse dia, memorável momento, acredito que apenas durante a defesa e aprovação de minha monografia me senti tão maravilhosa. Finalizar um amor de faz de conta é uma das coisas que mais nos faz bem.
E esse fim me garantiu ser o que sou hoje, uma mulher realista, com boa estima, leitora feroz, escritora ocasional, casada e com três filhos. Sim, eu encontrei um amor de verdade, daqueles que nos tira do prumo, porém nos coloca em um pedestal, que nos faz sentir amadas, adoradas, encantadas.
Um amor de reciprocidade, de ajuda, de construção. Sinto uma profunda gratidão por ter encontrado esse amor de abundância. Sou e eternamente serei apaixonada pelos livros e seu poder de libertação e por minha família e seu poder de cuidado e proteção.
Vejo lindas mulheres deslumbradas vivendo amores de faz de conta, essa é minha dica pra vocês:_matem esse amor, os afogue ainda no início e abram caminho para que um amor de verdade encontre-as e as arrebatam às estrelas.
Mulheres vivam o que vale a pena ser vivido, dispensem mediocridades, busquem aquilo que realmente merecem. A plenitude de um amor correspondido compensa todas as incertezas e lágrimas vertidas pelo fim de um amor de faz de conta.
Obs.: Eu realmente não sei o nome do rapaz
da biblioteca, já fiz de tudo pra lembrar, mas
não lembro, na verdade com o tempo, ninguém
se lembra de fantasmas do passado.
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O Segredo da FÊNIX
ChickLitAqui você encontrara histórias que representam os ciclos da vida, o recomeço e a esperança num futuro melhor.