Conhecendo Helena Faria.

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Meu nome é... Helena. Helena. Helena. Helena. Helena. Repita e perceba o som estranho deste nome. Este nome é estranho. Na verdade, toda a palavra repetida várias vezes perde o sentido, isso porquê o cérebro desiste de atribuir sentido à palavra. Como eu sei disso? Eu li em algum lugar na internet. Eu adoro mexer no celular enquanto estou em um lugar totalmente desconfortável, isso é muito chato. Mas, na verdade, eu penso que pode ser insegurança minha. Eu adoro pesquisar coisas aleatórias nas buscas do Google de vez em nunca, sabe? Talvez eu tenha pesquisado isso em algum momento da minha vida que não lembro agora. Eu não lembro de muita coisa. Meu chefe e a minha mãe sempre reclamam disso, e eu não sei o porquê! Todo mundo tem o seu tempo e eu tenho o meu tempo, será que é difícil de entender? Eu ligo para minha mãe quando eu quero e quando eu lembro, a minha vida é muito bagunçada e rápida: Trabalho, cuidar da Anie, caminhar, observar o nada... Muita coisa! A Anie é a minha Hámster, eu a amo muito, minha única companhia em casa. E sim, eu moro sozinha.
Percebeu que eu sou muito ocupada?! Eu trabalho muito no escritório de advocacia do Sr. Romúlo. Um Senhor de 65 anos que tem muita grana e uma esposa insuportável!!! Ela sempre vem observar o escritório como se ela fosse a dona de tudo, porém ela é, né. Eu sou a faz-tudo de lá, não sou advogada nem nada, faço muita coisa como: Imprimir papéis, receber pessoas e entregar cafezinho, sugerir leitura enquanto o advogado Alberto atende outro cliente ou manda mensagens picantes para a sua ex namorada no Instagram... Eu fico numa sala onde recepciono essas pessoas, mas como eu disse: não sou apenas recepcionista, sou tudo e mais um pouco. Além dessas coisas, eu preciso atender telefone o tempo inteiro, às vezes eu não consigo dar conta de tudo. Ainda tem a parte que eu faxino o escritório quando acaba, é a parte que eu mais odeio. Odeio mais ainda quando o advogado reclama que ficou sujo ou está limpo pela metade. QUEM DEIXA LIMPO PELA METADE? Sabe de uma coisa, eu deveria deixar esse emprego e dizer para a minha mãe que não preciso da ajuda dela e nunca precisei! E para piorar a mulher do dono é amiga de infância da minha mãe, foi ela que arrumou este INFERNO para mim, acredita? Fora isso, com este meu currículo minúsculo eu não consigo muita coisa. Só quero viver minha vida em paz.



— Entendeu, Helena? — Uma voz angelical e calma me tirou dos meus pensamentos.



Ergui a cabeça e olhei para a psicóloga com uma expressão confusa.



— Sim, entendi. — Respondi com um sorriso amarelo.



— Vamos, lá —Ela disse enquanto anotava algo no papel. — Eu quero que venha às sessões todas as terças-feiras, certo? É muito importante que venha aqui no horário, eu preciso te conhecer melhor. Não irei pedir medicação no momento...



— Medicação? — Eu a interrompi — Eu não preciso de medicação. Na verdade, eu nem precisaria estar aqui se não fosse pela minha mãe, eu tenho 33 anos e acho isso ridículo, é o cumulo estar sendo tratada feito uma louca fugitiva! — Levantei demonstrando que não estava nada feliz com aquela resposta. Meus olhos saltaram um pouco para fora.



— Calma, eu te compreendo. Saiba que remédios só auxiliam para o tratamento, apenas.



A minha mãe com toda a certeza falou algo sobre mim para ela. Ela continuou a falar:



— Essa já é a sua quinta sessão e em 4 meses, não estamos progredindo muito. — A psicóloga olhou para mim. O rosto dela me fez perceber que eu não tinha amigos, que eu não me abri para ela em nada. Uma culpa cresceu em mim.



—Tudo bem. Posso ir agora? Eu te ligo qualquer coisa. — Respondi me levantando e puxando a minha bolsa.



— Se você não se identifica com a minha pessoa para te acompanhar, eu te indico outras pessoas e está tudo bem.



— Até semana que vem. — Sorri novamente e fui até à porta, passei por ela segurando as lágrimas e sai daquele lugar. Talvez eu tenha feito algo nessas cinco sessões para que ela jogasse a possibilidade de remédios assim, na minha cara. E eu nem estava preparada para isso.



Semanas se passaram e eu continuei a trabalhar e trabalhar. A tormenta dos remédios me assombrou durante aquele período, um período ruim para mim quando eu ainda estava na minha zona de conforto. A zona de conforto é para isso, é para ser confortável e boa para quem está nela, e eu não quero sair dela.

O fato de não ter amigos para conversar e pedir conselho sobre algo que não quero conversar com a minha mãe me assombra um pouco. O contato com outro ser humano é algo raro para mim, a não ser que seja conversas rápidas com o moço do supermercado: "Pode embalar para mim?" ou um "débito". Talvez role ou tente um flerte com o rapaz da farmácia, mas eu não sou boa nisso. Eu nem me lembro qual foi a última vez que transei, talvez eu tinha uns 25 anos, ou 20, quem sabe? Não lembro. Só sei que foi horrível. O garoto com quem eu saí não sabia me tocar direito e acabou nunca mais saindo comigo, nem uma ligação de desculpas eu recebi. Depois disso eu saí com alguns caras que não me levaram para um lugar além de um bar da esquina. Eu penso que posso ser uma pessoa que desinteressante, todavia, eu não tento ser o contrário. Saudades? Não. Satisfaço-me sozinha, e é um prazer.





Suspirei. Olhei para a Anie, peluda, branquinha e com alguns detalhes meio amarelados em seus pêlos. Talvez ela tenha engordado um pouco.



— Helena? Ainda está aí? — Minha mãe gritou ao telefone.

Revirei os olhos.



— Sim, mãe, eu estou! — Sentada no tapete azul da minha sala estava eu, enquanto alisava Anie em sua gaiola aberta.



— Estava no mundo da lua novamente, ehim? Mas não importa. Foi à médica? Ela disse que você faltou várias sessões, Helena. Eu já te disse inúmeras vezes que você deveria... —Abaixei o meu celular e o segurei contra meu peito. 1,2,3 e joguei o aparelho contra a parede à minha esquerda e em seguida o vi voando até o sofá. Alguns pedaços voaram para lugares aleatórios, porém, isso não importava. Sorri para Annie.



Após tomar um banho longo e quente, decidi ler um pouco. Adoro leituras, elas me fazem me sentir melhor, é a única coisa que poderia me acalmar depois de uma conversa estressante com a minha mãe. Ela não me entende muito bem, sempre diz que fico "no mundo da lua", mas, na verdade só estou tentando me concentrar em algo diferente para não explodir de vez. Ela mora praticamente do outro lado da cidade e só me liga para reclamar de algo ou me pedir algum favor relacionado à documentação. Eu nunca fui tão próxima da minha mãe, na verdade, ela e a minha irmã mais velha de 38 anos, são expert em irritação alheia. Bom, minha irmã sabe como fazer a minha mãe me deixar louca e, em simultâneo, me julgar e sair como a "boa da história". Esse foi mais um motivo da minha saída de casa.



Após retirar os cacos do meu velho celular do chão, ouço batidas frenéticas em minha porta. Ao abrir, me surpreendo com quem estava ali, à minha frente.



—Oi, mãe. — Quebro o gelo.



Ela entra apavorada. Aquela mulher baixa, de cabelos levemente grisalhos, sapatilhas e bolsa Gucci, me dava medo. Como uma pessoa de 1,57 de altura causava tanto pavor? Dona Cintia metia medo mais que qualquer chefe de empresa.



— Eu tentei te ligar após você me ignorar completamente no telefone e desligar na minha cara. — Minha mãe falava enquanto observava o apartamento para poder criticar algo.



— Bom... —Pensei enquanto fechava a porta atrás de mim — Meu celular caiu e acabou quebrando, eu me assustei com uma aranha.



— Aranha? — Arqueou a sobrancelha — Você não é o meu maior orgulho e ainda mente descaradamente para mim, Helena? Deveria ter vergonha! Sua irmã é a melhor coisa que eu poderia ter e enquanto isso você mora nesse ninho de rato com esse rato porco! — Gritou contra mim.



Suspirei, pensei e não consegui agir. Observei o meu copo que estava logo atrás dela, era um copo que comprei no shopping, um copo de plástico com uma tampa simples e um canudo da minha cor preferida, roxo. Como eu amo a cor roxa. Ainda consigo me lembrar deste dia. Assisti a um filme, mas não me lembro qual. Depois disso, comi um hambúrguer enorme na praça de alimentação e observei uma família feliz conversando sobre o parque que eles iriam naquele mesmo dia, observei atentamente e fingia estar lendo, porém, eles estavam na mesa do lado e eu não conseguia não prestar atenção naquela conversa alegre. Era um pai, uma mãe e uma criança que parecia ter seus 7 anos. Uma família invejável e alegre, não me lembro de ter tido isso na infância. Um pai? Nem a minha mãe saberia onde ele estava naquele exato momento.

Após ver aquela cena linda, sai daquele lugar e desci a escada do shopping e me deparei com uma loja de artigos diversos, e lá estava o meu futuro copo, roxinho.



— HE-LE-NA! — Dona Cíntia me acordou dos meus pensamentos.



Pisquei algumas vezes para poder tentar focar no rosto dela, foi a pior coisa que fiz. Seu rosto, coberto por algumas rugas de expressão estava em um tom sério e bravo. Aquela mulher loira, de cabelos na altura do ombro e batom rosa nos lábios estava muito furiosa.



— Mãe, eu... não quero conversar agora, por favor? Você sempre faz isso comigo, eu preciso dormir, amanhã irei trabalhar. — Sussurrei com a voz trêmula.



— Você não vai mudar nunca, Helena. — Ela cuspiu aquilo e saiu pela porta, a deixando parcialmente aberta.



Meu apartamento era minusculo. Um quarto, uma sala e cozinha americana, uma mini varanda e um banheiro social. Mas depois daquela conversa, ficou tudo totalmente menor e vazio.

Chorei em frente ao meu espelho, observei meu rosto e alguns detalhes de mim. A pele escura, cabelos lisos na altura do ombro e a franja que cobria um pouco da minha sobrancelha. Olhos escuros, magra e com os olhos fundos, como se não dormisse há um século. Uma mulher sem expectativa de vida. Eu era igual a Anie? Vivendo em sua casinha confortavelmente enquanto o mundo à minha volta se mantêm e vive? Vazia. Sem esperanças. Sem cuidado. Se essa é a minha história, eu quero escrevê-la do jeito que eu bem entender. Não sei se sou uma protagonista ou coadjuvante dela, talvez eu seja simplesmente uma figurante da minha própria obra, uma obra fracassada desde o princípio. Talvez, só talvez eu devesse ir para essas consultas idiotas em que minha mãe me meteu, esse contato pode ser uma ajuda para mim. A única coisa que me faz não querer essa ajuda é a possibilidade de utilizar remédios, eu não quero.



— Anie, o que você acha. Eu estou pesando em ir à psicóloga e tentar interação com as pessoas à minha volta, o que acha? — Falei para Anie que agora estava comendo na gaiola. Ela roía mais alguma coisa que não sei dizer, talvez poderia ser pedaços de comida estragada, faz alguns dias que não limpo aquele espaço dela. Os olhinhos dela brilhavam enquanto comia freneticamente.



—Penso que você tem toda a razão, devo pensar primeiro. — Esbravejei e em seguida apaguei a luz da sala e iniciei minhas tarefas atrasadas do trabalho. Trabalhar à noite é o meu foco, já que tudo é silencioso e quieto. A noite me faz vibrar de emoção, é um momento onde eu estou em paz comigo mesma, um momento que, posso ser eu mesma comigo mesma. Sabe com quem podemos contar quando estamos sozinhos? Nós.

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