Serenata para a Chuva

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As jovens no mundo caem, como gotas de chuva; lhes são dadas violões e alaúdes, para comporem então a melodia da vida; quando as cordas se rompem, a melodia se encerra. À chuva elas cantam, para que mais e mais gotas caiam, e mais canções possam ser ouvidas.

Samoa Schmidt é semi-musicista, alemã nascida em Munique, crescida sob as notas do violão e os acordes do alaúde. Para ela, talvez a França fosse uma terra melhor a se nascer, pois o céu da Baviera não tem o mesmo cinza que o de Provença, nem o mesmo claro das nuvens que Paris tem.

O compor das letras tornava possível, em suas músicas, enxergar o céu francês por um todo; dizia ela que: "quem canta para o céu, serenata para a chuva faz".

Samoa avançou na idade, vinte anos agora nas costas ela carregava, cujos mesmos também ditam o tempo pelo qual Samoa na Alemanha esteve. Deixou de compor serenatas à chuva e passou a compor ao arco-íris, pouco após o conhecer de uma tal neerlandesa cujo nome é Nabelle. Samoa compunha canções nas quais diziam com todas as vírgulas e acentos que nem o Mar do Norte enchia mais seu corpo do que o amor que sentia por Nabelle.

De Samoa pouco tempo depois despediu-se, voltaria à Roterdã após o equinócio. Em menos de um mês voltaria a cantar serenatas à chuva, imaginando um breu acinzentado para poder enxergá-lo nas nuvens das quais a água caía. Nabelle era sua tela, agora só restava o pincel.

O arco-íris deixou de raiar sobre seu lar, pois o vale cujo mesmo raiava fica no reino abaixo do nível do mar, cuja sua princesa mais bela que Mona Lisa é.

Então, sem partituras, somente com o violão, um níveo vestido com brilhantes pedrinhas sobre peito e um par de tênis amarelos, Samoa partiria ao vale à procura de sua princesa e de um céu cinza como o de Provença.

Ela não via as cidades e estradas, somente campos e bosques, por mais que eles tivessem sido queimados e cortados por quem quis substituí-los pelos antes citados; Samoa olhava ao céu, em busca de uma mísera centelha de luz, que pertencente ao arco-íris fosse, mas nem em sua bandeira havia as cores do arco-íris que buscava.

Os dias eram de penumbra, as noite de escuridão, e as alvoradas eram tão policromáticas quanto um corvo. Os dias que passavam-se só eram iluminados pelo tocar de seu violão, ou pelo compor de uma nota.

O vale avistado fora. "Alto, quem vem lá?", dito era por pássaros e arbustos pelos quais Samoa passava; e, pela primeira vez durante sua jornada, era possível ver as coisas com clareza e com cores, exceto o céu cinza e utópico pelo qual tanto sonhava e cantava. Em um instante as cores esvaíram-se, o dia tornou-se de penumbra novamente.

Mas, afinal, onde estava o arco-íris? A princesa e sua cidadela? Não eram os tais, pelo que ela via. O céu acinzentado por nuvens tinha, na realidade, extensivas nuvens de fumaça; O vale era queimado por hordas e hordas de negligências, armadas com documentos, vestidas de terno e gravata. O arco-íris era retratado por uma bandeira, cuja mesma incendiada era por engravatados, que, em uma mão seguravam placas e estandartes estampados com "Amor e paz", e na outra tochas que incandesciam como lareira. Ao olhar para o mar, via-se esgoto, ao olhar para o esgoto não via-se nada.

Samoa entendia que, como gota de chuva, caiu no mundo; o seu violão estava a procura de um alaúde, para finalizar a melodia da vida em dueto, mas não o achara. Suas cordas romperam-se, a canção chegava ao seu fim. Talvez, se trouxesse sua partitura, conseguiria ver os caminhos pelos quais deveria dedilhar no violão, durante a sua jornada. Mas tão rápido dedilhou que encerrou a melodia antes mesmo dela finalizar-se por tal.

Com o violão quebrado, ela afoga-o nas águas do esgoto que tomavam o mar, pouco a pouco tomando a si a clara transparência da água; o esgoto ainda estava lá, mas se via apenas água, cuja mesma já não existia mais, morta havia sido por ele. Samoa questiona se deveria ter ficado na Alemanha, ou sonhado mais com Paris e o resto da França.

De qualquer forma, sua canção acabou. Samoa deve, agora, entrar no hiatus que todos entramos quando nossa melodia chega ao fim. Ela vê que tinha, agora, o quádruplo de sua idade, após ter encostado no mar. Samoa mergulhou nas águas, deixou levar-se pelas águas, ignorando o seu padecer; então por lá ela ficaria, para então dizer à sua princesa que somente descansaria.



"A vida não é triste, tem horas tristes."
- Romain Rolland

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