Romanos 2:1

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Chegando ao 'Cat's Cradle', as irmãs romperam o silêncio que as acompanhou durante todo o caminho. Já passava da hora de descobrir as reais intenções de Aslan.

"Primeiro a espada, agora a coroa. O que mais você pretende roubar"?, perguntou Camila em tom de acusação.

"Mentir não é a única especialidade dele, afinal", disse Mary, ainda ressentida.

"E eu não sei se vocês notaram...", completou Beatrice. "... mas os demônios levaram a coroa pro Outro Lado".

"Como se já não tivéssemos problemas o bastante", reclamou Yasmine.

Aslan ouvia tudo sem questionar. No fundo, até achava que merecia. Mas então a mãe de Lilith resolveu intervir.

"Garotas, eu não faço ideia do que vocês têm contra esse rapaz. Mas ele salvou a minha vida hoje".

E dirigindo-se a ele, agradeceu. Aslan, meio tímido, apenas devolveu o gesto com um aceno de cabeça. Depois olhou para Lilith que, por sua vez, preferiu não dizer nada. Foi quando Ava finalmente entrou na discussão.

"Ok, pessoal. Vamos deixar a Santa Inquisição pra outro dia". E voltou-se para Lilith. "Quer dizer que você e a tal Joana se conhecem. E nem passou pela sua cabeça de nos contar, não é"?

Lilith deu de ombros e Ava continuou.

"Pode ao menos explicar o que ela tem contra você? Porque visivelmente ela tem algo".

"É, eu também achei estranho", observou Mary. "Parecia pessoal".

Vendo que não tinha saída, Lilith respondeu:

"Eu não diria que chegamos a nos conhecer. Na verdade, quando a tarasca me levou pro Outro Lado, foi a Joana quem me expulsou de lá. Duas vezes".

"E por que mentiu pra nós"?, protestou Camila. "Naquele dia, na Arq-Tech, você disse que não se lembrava".

"Eu só queria que me deixassem em paz".

"Mas o que foi que você fez pra ela, Lilith"?, perguntou Beatrice. "Por que ela não queria você lá"?

"Vai ver ela não gosta de concorrência", brincou Ava.

"Não é só isso", interferiu Aslan.

Percebendo que todas ficaram curiosas, ele fez uma pausa dramática. E então, detalhadamente, foi narrando a história de Joana.

"Joana D'arc, a santa"?, perguntou a Madre Superiora, franzindo a testa.

Aslan confirmou.

"A Igreja devia dar uma checada no Além antes de sair canonizando as pessoas", disse Ava, não resistindo à tentação de fazer piada.

"Ava, por favor"!, rebateu a Madre, censurando-a.

E Aslan prosseguiu.

"Como eu ia dizendo... antes que a Joana morresse na fogueira, Samael abriu um portal e a resgatou. Depois, usou o próprio sangue para transformá-la no que vocês viram... Igual ele fez com a Lilith".

"Espera aí", interrompeu Beatrice, confusa. "Uma vez o Adriel falou algo sobre 'sangue de Reya'. Como se o sangue dela estivesse causando a 'mudança' da Lilith".

"De certa forma, ele tinha razão. Samael foi criado a partir de uma gota de sangue da Reya. Em outras palavras, Samael é o próprio sangue dela".

"Mas, e a Joana"?, perguntou Ava. "O que ela tem a ver com a Lilith, fora o lance do sangue"?

E Aslan retomou a história mais uma vez.

"Então... Com o passar do tempo, a Joana foi se deixando consumir pelo ódio e pelo rancor. Não pensava em nada além de vingança. Depois de alguns anos... acho que 70 no calendário daqui, ela resolveu voltar. Mas àquela altura os velhos inimigos já estavam todos mortos. Exceto um, que não era nem inglês, nem francês...".

"Nem humano", acrescentou Ava.

"Isso mesmo. O arcanjo que tirou o halo dela. Joana sabia que Haziel não estava nesse mundo. Mas, pra acertar as contas com ele, precisaria ter o halo de volta. Só tinha um inconveniente".

"A 'Warrior Nun', adivinhou Beatrice.

De novo Aslan assentiu.

"E é que entra a Lilith. Bem, ela não. A primeira da linhagem dela. Mas, enfim. Se o halo não 'tá' com a Joana agora, vocês podem deduzir o que aconteceu".

"A 'Warrior Nun' deu uma surra naquela otária", calculou Ava, sem disfarçar o entusiasmo.

"É, eu ia dizer que foi uma derrota humilhante. Mas vou ficar com a sua descrição".

Enquanto sorria, Aslan olhou para Lilith como se estivesse orgulhoso dela, mesmo que nunca tenha chegado a ser uma 'halo bearer' de fato. Mas o que deveria tê-la deixado constrangida, na verdade despertou uma paz que ela nunca havia sentido. Porque de repente o legado de sua família já não significava tanto. E nem buscava mais a aprovação de sua mãe. De alguma forma, o que ela encontrou no olhar daquele estranho passou a ser o bastante. Por outro lado...

"Você fala como se tivesse visto a luta", desconfiou Mary, recordando o episódio das docas e fazendo o sorriso de Aslan sumir em fração de segundos.

"As notícias correm", justificou-se ele. "Até mesmo entre os anjos".

****

"Tem certeza de que era ele"?, perguntou Samael à Joana, depois de libertá-la da coroa e ouvir o que tinha se passado na Terra.

"Absoluta. Eu reconheceria aquele maldito há quilômetros de distância".

"Hum... então eu acho que vou fazer uma visitinha ao mundo do humanos".

"Você não acredita em mim"?

"Pelo contrário. Eu vou justamente porque acredito".

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