𝓪𝓾𝓰𝓾𝓼𝓽𝓲𝓷𝓮

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Eu lembro muito bem de como o verão daquele ano aconteceu. Eu tinha acabado de completar 17 anos; o sol brilhava como nunca, parecia que até o céu estava ao meu favor. Se fecho os olhos, ainda consigo sentir o vento trazendo o gosto salgado do mar, a areia escapando pelos meus dedos e posso ouvir o som das ondas quebrando nas rochas. Eu estava distante de tudo, vivendo em um mundo pequeno que tinha sido roubado apenas para nós... Tinha a sensação de que seria assim para sempre porque pensar no fim nem era uma opção. Mas agosto se transformou apenas em memórias perdidas no tempo.

Quando minha mãe precisava de dinheiro, decidiu vender a nossa casa de praia. Apesar de todas as dificuldades, ela nunca teve coragem de fazer isso, porque aquele lugar guardava lembranças, especialmente do meu pai e de uma época em que tudo era novo. Nenhuma dessas lembranças eram minhas, no entanto, todas eram dela, mas eu gostava de ouvi-la contar e imaginar meus pais naquela casa, mais jovens e ingênuos. Pensava nas festas na piscina, nos amigos, nas escapadas à noite, nos boatos que criaram por uma divorciada estar casando com um herdeiro. O que deveriam pensar? E no que deveriam acreditar?

Mas a hora do adeus sempre chega em algum momento. Por isso, depois de tanto adiá-la, concordamos em nos despedir do meu pai.

– Ele está orgulhoso de nós. – ela falava enquanto me abraçava de lado, olhando para a fachada da casa. Os novos donos estavam prestes a chegar e nós já havíamos terminado toda a limpeza do lugar.

– Principalmente de você. – dei um beijo em sua bochecha e avisei que iria andar pela praia. A casa ficava há poucos minutos do mar, o que amávamos, por isso, não queríamos abrir mão de passar as férias ali, mesmo que em outro lugar. Iríamos ficar na casa de veraneio da minha amiga Mary. Nos conhecíamos há anos, já que estávamos sempre ali no verão.

Eu estava disposta a transformar aquele no melhor verão de todos. Não importavam todas as mudanças, eu iria fazer com que nada fosse em vão. Seria uma oportunidade de fazer tudo ser diferente, como um recomeço. Eu estava vivendo por essa esperança. E foi por isso que, quando vi um garoto de cabelo encaracolado, segurando um violão e um skate, enquanto o outro ao seu lado carregava as coisas que poderiam ser consideradas realmente importantes, como as malas, eu não poderia pensar em outra coisa senão: é ele. A minha esperança.

O mais velho foi em direção a minha antiga casa, enquanto ele veio até mim. E com aqueles olhos hipnotizantes, apresentou-se como James. Abri um enorme sorriso instantaneamente. Ele estava prestes a fazer novas lembranças no mesmo lugar. Então, eu pensei: talvez eu também possa fazer as minhas.

Ele também sentiu? Era só nisso que eu pensava. Quando os dias iam passando e íamos nos aproximando como os barcos na costa, eu pensava se apenas eu sentia aquela eletricidade, as faíscas sempre que sua mão acidentalmente tocava na minha, o coração ficando descontrolado ao chegar perto de você ou as mãos tremendo ao ouvir sua voz. Você também sentiu? Era nisso que eu pensava sozinha no meu quarto porque não podia contar para ninguém. Quem entenderia? Além disso, era como se fosse o nosso segredo, um acordo implícito entre nós de que ninguém deveria saber. Apenas nós percebíamos os sinais, os risos, os olhares. Foi assim por muito tempo. A maior parte do tempo.

Descobri que o garoto mais velho era seu irmão John e que vocês se davam bem na maior parte do tempo, menos quando ele tentava te controlar. Você que me contou.

– Ele é assim: A pessoa mais legal que você pode conhecer, até discordar dele. – você disse entre risos. Eu ri também. Pensando agora, boa parte do que você contava não soava tão engraçado, mas parecia um crime não rir com você. Se você achava engraçado, quem seria eu para dizer que não?

Nesse dia, estávamos sentados na varanda da, agora sua, casa de praia, olhando o mar. Você me mostrou seus poemas e disse como tinha dificuldade em transformá-los em música. Falavam sobre guerras ou, talvez, amor. Você gostava de parecer inteligente e eu acreditei. Li cada um daqueles versos imaginando como seriam os que você escreveria para mim. Na verdade, eu só precisava de um. Sonhei com o dia em que eu estaria na praia, você andaria em minha direção, sentaria ao meu lado e me diria: essa música é para você. Então, tocaria seu violão decorado com os adesivos que eu mesma colei e sua poesia percorreria todo o lugar, chegando aos meus ouvidos, mas atravessando os oceanos. Mas tudo o que eu consegui foram os adesivos.

folklore (triângulo amoroso)Onde histórias criam vida. Descubra agora