O Solitário Hansel

9 1 0
                                    

Fazia dois dias que Hikari deixou seu ninho. Seu espírito aventureiro duelava constantemente com a saudade do aconchego de seu lar. Querendo ou não, ele tinha de conseguir sua comida e encontrar abrigos seguros até chegar em uma cidade.

Não comeria da comida de seu pai, nem repousaria no colo de sua mãe até chegar ao fim de sua jornada, até o seu objetivo ser concluído. Mas, qual era seu objetivo mesmo?

Ele apenas saiu guiado por uma curiosidade que se acumulou ao longo de anos junto a outro desejo, que o mesmo não fazia questão de contabilizar: Se encontrar.
 
Hikari não sabia no que era bom, nem mesmo o que queria fazer exatamente, nisso ele sentiu que perdia para o Len, que sempre trazia uma novidade quando ia visitá-lo junto com sua irmã, Lin.

- Não posso continuar assim.

Essa pequena frase inundou seus pensamentos, repetidas e repetidas vezes. Seu senso de inferioridade? Sua queda pela Lin? Seu espírito competitivo? Seu ciúme do Len? Sua falta de autoconhecimento?

Sabe-se lá o porquê, mas tudo só reforçava o impulso para sair de casa.

- Liedva deve ficar a mais um dia de viagem, heim? - Suspirou Hikari - Nos livros parecia menos cansativo.

Uma jornada solitária com certeza não era o que o Suirei, muito menos o que a Tenko iriam querer para seu precioso filho único. Certamente o começo é árduo e o Hikari estava sentindo na pele.
 
Sem ter como tomar um banho adequado, refeições mais espaçadas, menos variadas e mais trabalhosas de se conseguir, sem uma cama entre quatro paredes protegidas pelos prováveis maiores heróis do século...
Enfim, longe de sua querida poltrona. Ainda assim, ele se recusou a dar meia volta e seguiu na trilha, por entre árvores e arbustos suspeitos.

- Rumo a Liedva! - Exclamou ele, para espantar seus devaneios e seguiu em frente.

Na mesma da hora, uma lufada de vento violentamente se chocou com sua face, como se desdenhasse de sua determinação. Ele sorriu, ajeitou o cabelo e voltou a caminhar.

Após andar por cerca de 4 horas encontrou uma casa de aspecto suspeito, ripas de madeira coloridas pintadas de forma um tanto quanto desconfortável. Certamente um lugar a ser evitado, principalmente pela placa que tinha escrito:

"Vende-se Doces"

- Estou sozinho, por que não ver? - Pensou ele, consigo mesmo. - Não é como se fosse aparecer uma bruxa do nada.

Hikari era magro e de estatura mediana, mas já havia treinado com seus pais algumas vezes, então garantia ao menos sua defesa. Mas...

- Nah, melhor poupar energia para caçar minha janta. - Disse Hikari aos ventos que ficavam e passou direto pela casa...

Até que outra voz quebrou o dialogo entre o vento e ele.

- Ora meu jovem, o que faz nesse lugarzinho remoto? Está perdido? - Uma janela de abriu e uma senhora, aparentemente em seus 60 ou 70 anos, indagou o garoto que atônito interrompeu seus passos.

- Estou em uma jornada, senhora. - Disse ele sem nem se virar - Passar bem.

Hikari não era de ser tão descortês, muito menos com uma senhora de idade, o motivo para tal comportamento foi apenas um:

Medo.

A senhora fora a primeira a falar com ele em 2 dias de viagem, fora a primeira pessoa que ele vira desde o início de sua jornada na realidade, mas, acima de tudo:

- Eu não senti presença nenhuma até a voz dela me alcançar - Pensou ele. - Será que meu senso de perigo está quebrado?

- Ora, que tal parar para descansar? - Tornou a continuar a conversa ela - Posso te servir chá e alguns doces.

Ele não sabia o que fazer. Simplesmente correr? Rejeitar a oferta? Ignorar e sair naturalmente dali? Aceitar?

- Eu vou ter de re... - Ia respondendo ele, até que...

- "Mal-entendidos podem acabar com tudo" não era, pai? - Pensou ele, interrompendo sua própria voz, e num estalo de coragem, disse:

- Aceitarei de bom grado sua oferta então.

A senhora sorriu e então abriu a grade da fachada da casa onde tinha uma mesa redonda e dois bancos paralelos em cada polo. Fez gesto para que ele entrasse e disse:

- Pode sentir-se em casa.

Assim, o solitário Hansel teve seu primeiro contato humano.

===X===X===

Num lugar próximo, na verdade tão distante que chegava a ser próximo, se fez luz. A partir da luz o mundo se mostrou. A partir da visão do mundo, um julgamento foi feito... Feito por duas silhuetas que conversavam num saguão aparentemente vazio.

- Ele realmente tinha que escolher aceitar? Garoto estranho.

- Espero que não seja o fim da jornada...

Ao som de uma crescente melodia tocada num piano, as vozes se aproximavam como se estivessem a prestes a se chocar.

- Vamos vê-lo no próximo festival, tia Yuu?

A pequena silhueta Ajeitou-se no banquinho do piano e falou mais uma vez, num breve silêncio.

- Cuide primeiro de sua Irmã, Len.

A melodia então voltou a ressoar violentamente.

Aura Master -Cerejeira invernal-Onde histórias criam vida. Descubra agora