RUBRO E ESCARLATE COMO SEUS LÁBIOS

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"De certa forma tudo tem sua beleza,

há algo entre as feridas e seus sangramentos,

talvez seja as palavras bonitas dos socorristas

ou o jeito como me torturo entre lamentações.

Injeto picos energéticos blindados na depressão todas as manhãs,

afim de manter a chama intenso dentro de mim sob controle.

No almoço, me alimento de passado e migalhas

daquilo que jamais foi inteiro ou sequer real,

e antes de deitar-me, deixo minha imagem ser distorcida

pelos monstros que vivem debaixo da minha cama.

Eu deveria me preocupar ao deparar-me com estes cortes,

assistindo diariamente o sangue jorrando e jorrando,

totalmente hipnotizada pelo beijo singelo da morte

rubro e escarlate, ele se espalha entre todas as mentiras,

manchando qualquer sinal de esperança do fim,

mas há algo de belo em me assistir morrer".

- A BELEZA DAS FLORES MURCHAS.

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Eles ainda vão me matar. Lógico que se eu dissesse tamanha desesperança em plenos ares, muitos curiosos ouvidos me apelidariam de irracional, devido a guarda real e a maldita invenção das câmeras de segurança limitarem minha privacidade em total lealdade ao meu pai, Rei Christian Di Felice LeBlanc, consequentemente tornando pouco provável (infelizmente), a minha graciosa morte. Sei que muitos irão pensar que meu lamento é pura ingratidão devido a muitos sonharem em estar no meu conforto, segurança e fartura. Pois bem, que o ocupem! Eu não pedi essa vida, ela simplesmente foi forçada a mim desde os meus primeiros dias neste mundo tortuoso, como quem é obrigado a instalar ferros e aços entre os dentes para ser aceito em uma sociedade padronizada e superficial, onde um rosto bonito vale mais à mala que carrega. E se acreditam que estar dentro desses muros luxuosos é um conto de fadas, vocês estão sendo ludibriados pela avareza daquilo que a nenhum homem deveria importar de fato. Eu vivo na maldita casa de bonecas, onde quem brinca quando as cortinas se fecham são as vossas majestades, e eu nem mesmo tive o direito a ser tratada como a porra de uma boneca. Melhor, ganhei o cargo de fantasma!

Eu sou um nada, uma brisa sigilosa na noite de verão que não percebemos seu passar bem debaixo de nossos narizes. Acho que passei tanto tempo desejando ser algo que tudo o que sobrou foi o pavoroso vazio. Às vezes sinto como se corresse em um breu faminto por luz com apenas um mísero fósforo aceso entre meus dedos. Quanto mais acelero meus passos diante a saída, mais a chama agita-se com movimentos de despedida. E quanto mais diminuo meus passos, mais a madeira é despedaçada a caminho de me deixar perdida no escuro. Talvez eu nunca encontre a saída, talvez a chama se apague para sempre. Mas eu não tenho a vida toda para permanecer presa aqui. O tempo está se alimentando da minha alma como um verme traiçoeiro. E aos poucos a chama reduz sua luminosidade. Serei eterna prisioneira da escuridão desconhecida a que carrego ou algum dia farei dela quem eu sou? Ninguém tem realmente medo do escuro, apenas daquilo que não se pode ver.

Quando fecho meus olhos durante as noites, me imagino longe desse manicômio. Quem sabe em um campo ou uma fazenda, uma extensão verde vivo cercada por correntezas de rios lavadores de almas. Neste lugar não há gritos, punições e dor, há somente o soar dos passarinhos anunciando o início das manhãs, o aroma de grama secando ao sol, o assobio da ventania que bagunça meus fios já emaranhados e a melodia da água quebrando contra as pedras. Mas quando eu infelizmente acordo, tudo volta a ser cinza novamente. Joias, vestidos caros, bailes e príncipes não me preenchem, pelo contrário, somente provam o quanto minha breve existência tem sido rasa e fútil.

Minha mãe explicara a mim que meu nome carrega de um enorme significado a ela, alguns dias atrás. Pois, nasci próximo a morte de seu pai, propriamente meu avô, e sua afeição e apego ao mais velho teria sido tão grande que ela perdeu a paixão pela vida após sua morte. Papai acrescenta-me que ela passava horas a fio trancada em seus aposentos sem perceber o tempo passar e quando não estava a dormir, ele lembra de a ver reflexiva na janela com seu olhar perdido e vazio. Então, inesperadamente ou não (prefiro não descrever tamanho ato audacioso e íntimo entre pessoas do meu convívio), eu nasci e como diz meu nome, literalmente Sol, trouxera luz de volta a vida da pobre rainha Grace Valentina, trazendo de volta seu espírito jovial e impulsivo.

Todos nós temos essa releitura do "Sol" como alguém ou algo que traz propriamente luz e alegria as pessoas, mas ninguém nunca observou que ele é o astro mais triste do universo. A estrela passa tanto tempo ocupada expandindo sua luz na escuridão para aquecer e manter os astros ao redor vivos, assistindo como um telespectador as suas danças orbitórias de que maneira fosse sua única motivação de vida e durante todo esse tempo ela está constantemente se queimando e se consumindo a cada segundo que o esgota, até que enfim um dia sua luminescência se apague por completo. O Sol é solitário, já que ninguém se atreve a chegar perto daquilo que é intenso demais pela covardia da auto preservação. Aliás, os planetas ao seu redor não passam de sangue-sugas, longe de serem autossuficientes, necessitando o tempo inteiro do brilho solar para sua sobrevivência, portanto ninguém de fato se importa, prova de que toda relação é por conveniência e convivência.

Já teve a sensação que ninguém realmente te vê ou escuta? Quando você está literalmente gritando pedidos de socorro? Essa é a sensação de ser a princesinha do teatro dos Di Felice LeBlanc. De ser o Sol dessa dança real. Mas tudo mudou quando eu o conheci. Malditos sejam os lábios escarlates!

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⏰ Última atualização: Jan 20, 2024 ⏰

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