A professora

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Quando olhei para trás, lá estava ele. Era totalmente idêntico à mim, talvez exceto pela cara que exibia um sorriso tão bondoso que eu jamais poderia dar a ninguém, mesmo que eu quisesse ou tentasse.

— Você....

— Vou te proteger. — Ele explicou. — Tudo que tem que dizer quando quiser que eu te proteja de uma pessoa é "Resolva isso, amigo".

Eu engoli em seco, aquela podia ser mesmo a minha chance? Uma lenda urbana poderia me proteger, e eu estava muito feliz com isso.

No dia seguinte na escola, eu estava desenhando Ann, no meu caderno. Ela era minha melhor amiga, antes de tudo isso acontecer e de certa forma talvez tivesse sido meu primeiro amor. Mas a professora Teresa me tirou do transe com uma pergunta:

— Senhor Napier. Você poderia nos dar a sua opinião sobre o assunto?

— Qual assunto? — perguntei, não estava prestando atenção a algum tempo.

— Cuidados que devemos ter na escola contra pessoas suspeitas que podem ser perigosas.

Aquela pergunta, aquela maldita pergunta não era por acaso. A senhora Teresa era uma das melhores amigas da Lenna, a professora de Espanhol, e estava tentando me deixar bem ciente de que se lembrava de tudo. Amassei a folha do meu caderno para responder de forma calma:

— Não sei, professora. — Minha voz saiu rouca. Todos ficaram em silêncio. — Vou ao banheiro.

Me levantei e sai da sala apressado. "Por que todos queriam me fazer lembrar daquilo? Eu queria que todos pudessem esquecer", pensei enquanto as lágrimas quentes molhavam meu rosto. Cheguei no banheiro a tempo de não ser visto e me escondi em uma cabine. Chorar na escola era muito humilhante, ainda mais para um menino, e se alguém contasse a Teddy e Carson, eles certamente fariam a festa.

— Aquela professora parece não gostar de você — pontuou Benedict.

Esse era o nome que havíamos decidido que eu chamaria ele quando disse que não tinha nome. Benedict era o nome que minha mãe queria que eu tivesse, era uma homenagem para meu avô, uma pessoa forte, destemida e que não levava desaforo para casa.

Bem diferente de Max, o nome escolhido pelo meu pai. Uma pessoa que chorava no banheiro da escola porque a professora havia falado que ele podia ser violento.

— E ela não gosta.

— Não chore, ninguém se importa se você chorar. Sorria e eles terão inveja de você. — Ele disse sorrindo para mim. — Agora não se preocupe, eu gosto de você e eu vou protegê-lo. Fique aqui um pouco mais, Max, e se acalme! — Ele disse pondo a mão no meu ombro e depois saindo da cabine.

Fiquei lá até me acalmar, ninguém ia sentir minha falta, era como se eu estivesse enviado e fora do mundo, e que aquelas pessoas não podiam me tocar, era o que eu sentia, como se estivesse longe. Quando o sinal tocou, voltei a mim para poder sair e ir em direção a sala.

Estava no corredor quando vi a senhora Teresa vindo até mim com a diretora do lado.

— Lá está ele! — Ela disse.

— O que aconteceu? — perguntei.

— Não se faça de bobo, garoto! — Ela disse apontando um dedo na minha cara.

— Se acalme, senhora! — pediu a diretora — Senhor Napier. A professora Teresa disse que você arranhou o carro dela no estacionamento.

— O quê? Eu não fiz isso!

— Essa é uma situação complicada. Por favor, vamos até a minha sala.

A diretora abriu caminho, como se não soubéssemos onde a sala dela ficava, então abriu as portas e apontou para as cadeiras antes de dar a volta na mesa e apontar para a janela.

— Aquele carro prata do lado de fora é da sua professora, Max — disse a senhora Rute com uma voz calma.

O carro da minha professora estava riscado de cima a baixo, pelas portas, o capô, tudo.

— Eu não fiz isso! — Jurei o mais rápido possível.

— Você foi o único que saiu de minha aula e devo lembrá-lo que ainda demorou a voltar?

— Mas eu estava o tempo todo no banheiro!

Benedict estava ao lado da diretora imitando os movimentos histéricos que a dona Teresa fazia, enquanto apontava para si mesmo orgulhoso.

— O que faria um garoto tanto tempo no banheiro?

Não respondi, não ia deixá-la ter o prazer de saber que eu havia chorado por causa dela, apertei a calça com a mão.

— Estou esperando, Senhor Napier, e eu tenho o dia todo para isso! — A senhora Teresa disse cruzando os braços.

A diretora olhou para mim como que para me julgar e tentei dar o meu melhor olhar. Estava suplicando que ela acreditasse em mim mesmo que não houvessem provas a meu favor, mas eu tinha certeza que também não haviam contra.

— Senhora Teresa...

— Antes de continuar, devo lembrá-la, Rute, que a psicóloga da escola disse que devíamos prestar atenção em Max? O seu pai...

Olho para ela, tínhamos uma psicóloga na escola que ela mesmo havia me pedido para conhecer, mas eu não imaginava que ela usaria isso contra mim. Olhei para a diretora, ela não podia tirar aquela pessoa que estava duvidando do meu lado, a senhora Rute poderia me declarar inocente. Prendi a respiração.

— Max, eu peço que você faça aulas extras após a aula com a senhora Teresa. Essa será a sua punição — decretou ela se sentando.

— Mas diretora....

— Nada de mais. Podem sair!

Estava na hora do lanche, mas eu me escondi para que John não me achasse, eu não queria contar a ele que tinha tomado uma detenção. Então sentei debaixo da escada.

— Como está, Max? — perguntou Benedict sentando perto de mim.

— A diretora acha que eu risquei o carro da professora. Eu juro que não toquei nele! — Admito praticamente gritando.

— Se acalme! — ele pediu me olhando nos olhos. — Essa professora está sempre implicando com você. Você precisa se afastar dela! — Sugeriu ele.

— Não posso simplesmente parar de vir para a escola!

— Tudo bem. Deve haver outra forma. — Ele disse, olhando para frente igual à mim.

— Você pode fazer isso? — perguntei.

— Se você me pedir, posso.

— Resolva isso, amigo — pronunciei.

Ele se levantou e sorriu para mim antes de colocar as mãos no bolso. Quando ele se afastou, eu me senti cansado, com sono, devia ser pelo tanto que chorei, então me encostei na parede e peguei no sono.

Quando acordei, tive certeza que o horário do lanche já havia passado, mas nenhum zelador havia me encontrado, então levantei e fui em direção a sala. Com sorte a professora acharia que só me castigar após a aula estava bom e me deixaria entrar.

Mas quando passei pelo corredor vi um amontoado de pessoas em volta do almoxarifado.

— O que aconteceu? — perguntei de longe.

Quando ninguém se importou em me responder eu empurrei alguns alunos para chegar na frente e ver a cena. A professora Teresa estava no almoxarifado, mas ao mesmo tempo não estava, só seu corpo continuava lá, imóvel caído no chão.

Seu corpo estava todo furado, pequenos furos, mas que haviam sido suficientes para matá-la e deixar seu sangue sujando o chão. Como se alguém tivesse usado uma arma pequena, talvez até mesmo algo que não fosse para matar pessoas, mas que foi utilizado para tal. Ela estava furada, com furos no braço, na perna e principalmente nos olhos. Eu podia sentir o aviso claramente; ela não deveria ter falado sobre o que não havia visto.

Sujas de sangueOnde histórias criam vida. Descubra agora