Para: Marília.

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Este texto é uma inspiração em cima de cartas trocadas entre Clarice Lispector e Fernando Sabino, retiradas em fragmentos do livro "Cartas perto do coração".
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Goiânia, 25 de abril de 2023.
De: Carla Maraisa Henrique Pereira.
Para: Marília Dias Mendonça.

Marília, sinto a necessidade de te escrever mesmo que não vá responder minha carta. Sinto a vontade de te ver, já senti vontade de ir com você, de sumir do meu novo mundo cinza sem sua presença. Tínhamos tantos planos.
Devo admitir que tenho falhado em muitas coisas desde o dia que em que minha vida se tornou um eterno labirinto sem saída. Tenho escrito muitas cartas para você. Tenho dormido muito pouco. Tenho xingado muito todo mundo. Tenho tido muito medo de morrer. Tenho faltado muita missa aos domingos. Tenho tido muitas oportunidades de ficar calada. Tenho tido muita decepção com amores. Tenho tido cansaço, saudade e calma. Tenho bebido muito, muito, muito. Tenho trabalhado muito, muito mesmo. E tenho sentido sua falta. Marília, estou perdida no meio de tantos particípios passados. Passo os dias procurando enganar minha angústia. Compor músicas sem você ao meu lado é como se tudo faltasse seu toque final, mas nossos amigos são ótimos. Escrevi e reescrevi letras sobre você e nunca mostrei á ninguém.
Estou com vontade de fumar e o meu charuto acabou, estou com vontade de namorar de tarde numa pracinha cheia de árvores, estou com muitas saudades do seu cheiro.
Eu fui à última cafeteria que você me acompanhou, sozinha, sentei na mesma mesa e pedi o item 25 do cardápio, como você naquele dia. Eu apertei muitas vezes o play dos áudios em que você ria, fechando os olhos para que o momento se tornasse mais real. Eu abracei a Maiara como em todas as vezes que você nos abraçou. Eu recebi flores, mas não eram como as suas.
Marília, eu me arrependo. Eu me arrependo pelo medo que tive, do tempo em que desperdicei. Ora, ouso cantar que estou em busca do felizes para sempre, mas não acredito no sempre desde que você foi embora. Eu tenho muitos medos. Eu tenho medo de entrar em um avião. Tenho medo de deixar Maiara sozinha. Tenho medo de perder a vida tentando me encontrar novamente. Ainda tenho medo de palcos altos e posso ouvir você rindo de mim. Eu tenho medo de nunca mais te encontrar.
E eu choro.
Eu choro pensando em você, no seu filho, em toda sua família. Eu choro pensando nos seus fãs, que não passam um dia sem sentir a dor da sua falta. Eu choro pelo que não realizamos, choro pelas nossas promessas interrompidas. Eu choro pelos beijos não dados, pelos abraços faltados. Eu choro pela presença da sua ausência.
Eu me sufoco por não falar das nossas juras de amor.
Ainda fecho os olhos e sinto suas mãos em meu rosto, me recordo da sua respiração próxima e dos seus sussurros dizendo que me amava, dizendo que tudo daria certo, que nosso destino era ficarmos juntas. Só não disse que não seria nessa vida.
Marília, como é aonde você está?
Você ainda toca violão dizendo que é ruim na única coisa que faz da vida, mesmo fazendo com maestria?
Você ainda compõe músicas?
Sua risada ainda ecoa pelo ambiente?
Você ainda é brega?
Você já falou com alguém sobre nós?
O que é que você faz às três horas da tarde? Quero saber tudo, tudo.
Pode ter certeza de que não te esqueci. Ainda ontem me lembrei muito de você porque um fã me deu um relógio igual ao seu. Você acredita em coincidências? Me escreva, Marília.

Do seu amor, Maraisa.

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