Capítulo 1: As Raízes da Guardiã

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Em meio ao coração verdejante da floresta amazônica, no seio da tribo Yarumã, uma pequena menina chamada Yara brincava alegremente com as criaturas da floresta. O som do riso dela se misturava ao canto dos pássaros e o sussurro das folhas.

"Vovó Tapi, olhe!" Yara exclamou, correndo em direção à avó com um pequeno tatu em seus braços. "Ele estava com medo, mas eu conversei com ele. Agora, somos amigos".

Tapi, uma venerada pajé da tribo, olhou para a neta com uma mistura de admiração e preocupação. 

"Yara, você tem um dom especial. Você tem uma conexão com a natureza que vai além do que nós conseguimos entender. Este dom está presente em alguns poucos membros que passaram por nossa tribo".

As palavras de Tapi só fizeram Yara mais curiosa, porém um dia elas fariam muito sentido. 

Yara e Tapi eram inseparáveis, ela passava horas aprendendo sobre diversos assuntos com a avó, explorando os segredos da floresta e aprendendo sobre as plantas medicinais. Ela ouvia atentamente enquanto Tapi falava sobre os rituais e as diferentes medicinas: a ayahuasca, o rapé, a cannabis, o kambô e diversas outras. Ela sempre ouvia com muita atenção aos conselhos de sua avó sobre ter prudência e responsabilidade com tudo e a todos:

"Yara, lembre-se, tudo na natureza tem um espírito. Você deve respeitá-los, entender seus desejos e necessidades, e eles irão te ajudar". Tapi disse em uma de suas muitas lições. 

Yara ouvia, assimilava tudo que sua avó dizia, mas para ela era tudo muito natural, ela simplesmente amava e se conectava em um jeito muito profundo com tudo ao seu redor. Passava horas conversando com as árvores, com os bichos e e até com as pedras. Porém, como era ainda muito pequena, nÃo entendia seu próprio poder, apenas ouvia sobre as medicinas, mas ainda não fazia uso de muitas delas, pois não estava pronta ainda.

Uma parte muito importante de sua tribo eram os famosos rituais. Desde cedo Tapi já colocava Yara em contato com os rituais da tribo, onde ela podia ver seus companheiros consagrando as medicinas, se conectando com planos superiores e ganhando conhecimento, que seriam depois transformados em ensinamentos para todos da tribo, principalmente para os mais novos.

Um pouco mais velha, Yara começou a participar dos rituais e teve sua primeira experiência com uma medicina muito conhecida na Amazônia, a ayahuasca.

Yara estava sentada ao redor da fogueira com os membros de sua tribo, e Tapi, sua avó, começou a explicar a importância do ritual que estavam prestes a realizar.

"Yara, o que você vai beber agora é a ayahuasca, o vinho das almas", Tapi disse, segurando a cabaça contendo a bebida sagrada. 

"Ela é feita de duas plantas especiais, a videira Banisteriopsis caapi e a Psychotria viridis. Juntas, elas permitem que entremos em um estado alterado de consciência onde podemos ter visões e experiências profundas."

"A ayahuasca é uma ferramenta de cura, uma forma de enfrentar nossos traumas e questões emocionais mais profundas", continuou Tapi. 

"Mas, é preciso ter respeito e orientação ao usá-la. As experiências podem ser intensas e, às vezes, desafiadoras."

Yara ouviu atentamente, sentindo o peso das palavras de sua avó. Ela sabia que estava prestes a embarcar em uma jornada significativa, e estava pronta para aceitar o que a ayahuasca tinha a lhe mostrar.

"Yara", Tapi disse, estendendo uma cabaça para ela. "Está pronta?"

"Sim, vovó", respondeu Yara, aceitando a cabaça com mãos trêmulas. 

Ela levou a cabaça aos lábios e bebeu. O gosto era amargo e estranho, mas Yara engoliu, fechando os olhos conforme sentia o líquido descer por sua garganta.

O efeito da ayahuasca não demorou a se manifestar. Yara sentiu um calor se espalhar por seu corpo, partindo do seu estômago e se espalhando até as pontas dos dedos. Ela se sentiu mais leve, como se estivesse flutuando, e uma sensação de paz a inundou.

De repente, as cores e sons da floresta se tornaram mais intensos. O chilrear dos pássaros soava como uma sinfonia, as folhas dançando ao vento pareciam vibrar com vida própria. Yara sentiu como se pudesse ouvir a pulsação da floresta, a batida do coração da Mãe Natureza.

As visões começaram então. Yara viu a si mesma, mais velha, mais forte, lutando contra homens com ferramentas de destruição. Ela viu a floresta em chamas, os animais correndo em pânico, e sentiu um desespero profundo.

Mas então, repentinamente, a visão mudou. Yara se viu cercada por luz, emanando uma energia poderosa que afastava as chamas. Ela viu os espíritos dos animais e das plantas ao seu lado, lutando com ela. Sentiu, então, pela primeira vez o peso de sua responsabilidade.

"Eu sou a guardiã", Yara murmurou, despertando de sua visão. "Eu sou a guardiã da floresta."

Quando Yara abriu os olhos, ela se viu de volta ao círculo ao redor da fogueira, mas algo havia mudado. Ela se sentia mais forte, mais conectada à floresta do que nunca. Ela sabia agora qual era seu propósito, e estava pronta para lutar.

"Vovó, eu vi... eu vi a floresta queimando! Nós precisamos fazer algo!". Yara gritou.

"Sim, Yara", disse Tapi suavemente e demonstrando pouca surpresa.

"Você é a nossa esperança. Você é a guardiã. A Guardiã da Amazônia" 

YARA - A guardiã da AmazôniaOnde histórias criam vida. Descubra agora