A faxina de primavera sempre foi o momento mais temido da infância de Camille. Todo ano, quando criança, a garota tinha que se desfazer das coisas que não usava ou não queria mais. Sua mãe colocava quatro caixas em sua frente: roupas para doar e roupas que não tinham mais condições de serem usadas, portanto, lixo, e brinquedos para manter e brinquedos para doar. Camille nunca se importou em se desfazer de coisas das quais não precisava mais, sabia que era importante ajudar aqueles que precisavam. O que a atormentava desde sempre era que, sempre que acabava de separar as coisas, todas as suas alergias estavam atacadas.
Os anos se passaram e Camille cresceu: terminou a escola, saiu de casa para fazer faculdade, se formou, começou a trabalhar e construiu sua vida. Tudo mudou na vida da jovem, menos as faxinas de primavera. A única diferença era que Camille não tinha mais brinquedos para doar.
Foi em um fim de semana tranquilo que a jovem resolveu enfrentar a bagunça de seu closet e separar em uma caixa as roupas e sapatos que iriam ser levados a uma instituição de apoio à pessoas em situação de vulnerabilidade, e em outra o que iria para o lixo.
Parecia que faziam horas que a arquiteta estava dentro de seu closet, mas na verdade tinham se passado apenas quarenta minutos e a ruiva já estava exausta – ela precisava parar de comprar tantas roupas e sapatos. Foi enquanto pensava nisso que Camille se deparou com uma caixa que não via há anos.
A caixa grande e preta, decorada com glitter e adesivos, tinha a palavra memórias escrita em letra cursiva e caneta prata na tampa. Tomada por um misto de euforia e nostalgia pelo que poderia encontrar lá dentro, Camille se sentou no chão bagunçado de seu closet e abriu a Caixa de Pandora da sua vida, mas ao invés de caos e destruição, o que saiu de lá de dentro foram lembranças – tanto boas quanto ruins, mas ainda lembranças. No entanto, antes de começar a revirar a caixa e reviver todos aqueles momentos, Camille decidiu que precisava de algo mais forte do que o chá que estava tomando e caminhou determinada até a cozinha, onde sabia que iria encontrar uma garrafa novinha de vinho na geladeira. Decidiu também que a caixa seria o assunto da sua próxima sessão de terapia; já que ela tinha sido ideia de sua psicóloga, ela que lidasse com as consequências daquela viagem não planejada naquele sábado à tarde. A mulher de meia idade era muito bem paga para isso.
De volta ao closet, munida de seu vinho preferido, Camille se sentou novamente no chão e encarou a caixa. Após respirar fundo algumas vezes, a arquiteta mergulhou em suas lembranças.
Camille tinha organizado suas lembranças em ordem cronológica, então, a primeira coisa dentro da caixa era sua carta de aprovação da universidade. Ela precisou brigar com sua mãe para conseguir pegar aquele papel – a mais velha queria emoldurá-lo e deixá-lo exposto para qualquer um que entrasse em sua casa pudesse ver. Junto com a carta, Camille encontrou um bilhete de seu pai, a parabenizando pela aprovação, e uma cópia do contrato do aluguel de seu primeiro apartamento. Ela se lembrava perfeitamente deste dia, pois foi a primeira vez que se sentiu realmente adulta – não ter entendido nada do que estava escrito e ter pedido para seus pais a explicarem era apenas um detalhe que deixava tudo ainda mais especial. Significava que, mesmo que já fosse adulta e responsável por sua própria vida, ainda podia contar com seus pais quando precisasse de ajuda.
Em seguida, a ruiva encontrou um diário de quando estava na faculdade. A capa estava gasta e a lateral das páginas, manchada de café. No dia do ocorrido Camille tinha esbarrado com um rapaz da sua idade no caminho até a universidade e seu café foi todo derramado sobre o diário. A estudante estava pronta para proferir todas as ofensas e profanidades que conseguia imaginar, mas quando olhou para cima, se deparou com os olhos azuis mais bonitos que já tinha visto. Aquela foi a primeira vez que Camille viu Max Verstappen e a última vez que escreveu naquele diário.
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Memories of Us | Max Verstappen
Fanfic"Honey, I rose up from the dead, I do it all the time"