O prólogo do fim

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Meu coração pulsava descompassado, desafiando os limites dos batimentos saudáveis, pois aquela sensação angustiante havia se tornado meu novo padrão. O simples ato de respirar parecia uma tarefa impossível, como se mãos invisíveis comprimissem meu peito com uma força sobre-humana. Enquanto eu lutava para manter a lucidez, percebia que todas as pessoas ao meu redor, mergulhadas em suas rotinas e preocupações, desconheciam por completo a tormenta que se desenrolava dentro de mim. Essa é a essência de toda a minha história: a percepção tardia de que ninguém realmente percebe até que atitudes drásticas sejam tomadas, é uma jornada solitária, rodeada de indivíduos, mas com a responsabilidade final repousando inteiramente em meus ombros.

Os intervalos eram limitados a 15 minutos, como para todos os outros funcionários que passavam seis horas diárias imersos em suas obrigações. Ao sair para respirar um pouco de ar fresco, em meio a ruas escuras que caracterizam a região central da cidade, deparei-me com um sentimento avassalador de desespero. Naquele instante, tudo o que eu desejava era render-me, desistir de tudo que me aprisionava. Lembro-me de suplicar ajuda ao meu namorado, perguntando-lhe o que ele estava fazendo e se poderia estar ao meu lado, mas a resposta refletiu seu próprio estado de saturação por estar envolvido em meu caos emocional.

Caminhei solitário pelas ruas, inundadas de sombras e permeadas por diversas pessoas que transitavam sem se dar conta da tempestade que rugia dentro de mim. Cada passo era uma batalha árdua, enquanto eu lutava contra a determinação inabalável de abandonar tudo. Naquela avenida, diante de um imponente edifício, vislumbrei a figura do meu namorado. Ele se aproximou, buscando acalmar-me com gestos silenciosos, envolvendo-me em abraços repletos de ternura. Contudo, já era tarde demais, minha determinação de desistir havia se solidificado. Com uma firmeza que não conhecia antes, afastei-me dele e, em um tom firme, declarei que não desejava sua presença ao meu lado.

Nesse instante, meu namorado fez uma ameaça que sempre funcionava: ligar para minha mãe, que residia distante, no interior do estado. Normalmente, essa ameaça fazia-me recuar, pois evitava a amplificação dos acontecimentos, muitas vezes preferindo o isolamento quando perdia a noção da importância de uma ajuda. Contudo, algo dentro de mim havia mudado. Eu já não me deixava dobrar tão facilmente pelo medo e pela dor.

Apesar de seus esforços para me segurar, fui tomado por uma força inesperada e me libertei de suas mãos. Corri o mais rápido que minhas pernas permitiam, ele acompanhando-me em desespero, lágrimas manchando seu rosto enquanto implorava para que eu parasse. As palavras do meu namorado ecoaram em minha mente enquanto corria, misturando-se com meus próprios pensamentos tumultuados. Eu sabia que ele estava desesperado para me ajudar, mas naquele momento sombrio, a escuridão dentro de mim parecia intransponível. Cada passo que dava era como uma fuga desesperada de algo que me perseguia implacavelmente.

Enquanto as ruas pareciam se fundir em um borrão de sombras, meu coração lutava entre o desejo de ser salvo e a vontade de desistir de tudo. Era uma batalha interna tão intensa que mal conseguia raciocinar claramente. Em meio ao caos, avistei duas pessoas saindo de um centro espírita, um vislumbre de esperança em meio à minha escuridão.

Meu namorado, chorando e exausto, correu até eles e implorou por ajuda, mas as duas pessoas apenas me observaram com olhares compassivos. Uma faísca de esperança brilhou em meu íntimo. Ponderei a possibilidade de adentrar aquele centro, caso me convidassem. No íntimo, uma parte de mim ainda ansiava por ajuda e aceitação, mas outra parte estava determinada a encontrar uma solução definitiva para a escuridão que me atormentava. Seus rostos transmitiam uma compreensão silenciosa, mas eles não intervieram.

Em meio ao caos do tráfego frenético, aproveitei a distração e pisquei com coragem, acelerando meu passo até desaparecer nas sinuosas ruas internas do bairro. Cada esquina era uma promessa de liberdade, uma fuga dos grilhões invisíveis que me aprisionavam. Finalmente, encontrei abrigo em uma calçada solitária, onde a proteção discreta de um carro estacionado me ocultava do mundo. Ali, sentei-me, com o peso das minhas angústias pressionando meu corpo e alma.

Olhei de relance que minha gestora havia me enviado diversas mensagens, nesse momento, minha pausa de 15 minutos provavelmente já havia ultrapassado uma hora.

Foi alí que comecei a pensar em quem poderia sofrer com minha ida, porém, seria realmente egoísmo continuar sofrendo para que outras pessoas não sofram? Não seria mais fácil entender que eu havia escolhido não viver mais? Outra coisa que martelava minha cabeça era sobre o que viria depois.

Naquele ponto, minha fé era quase nula, porém, será que eu poderia estar errado? Estava eu assinando minha entrada para o inferno? Queimar eternamente no inferno me fazia estremecer, provavelmente foi esse medo que me manteve vivo até aquele momento, entretanto, a origem desse medo foi um dos principais motivos de eu desistir de tudo.

Entre diversos pensamentos, achei um pedaço de vidro na rua e aquilo me parecia um sinal, o momento era ideal, ninguém me veria e eu me livraria de toda aquela dor. Segurei o objeto cortante e comecei a passar por minha pele do braço.

Confesso que essa não foi a primeira vez que eu tentava tirar minha vida, nesse ponto essa ideia passava todos os dias da minha vida, eu não sabia ao certo o que havia me levado a aquele ponto mas poderia chutar diversos motivos, incluindo o que citei anteriormente.

Por esse motivo, vou interromper essa narrativa aqui e voltar á minha infância, talvez vocês consigam entender como cheguei até esse ponto, sentado em uma calçada de uma rua desconhecida, com o sangue desenhando um caminho em meu braço.

Dei uma rápida olhada no brilho desafiador do meu celular e vi uma enxurrada de mensagens da minha gestora. Era evidente que minha breve pausa de 15 minutos já havia se estendido muito além do esperado. O tempo parecia escorrer pelos meus dedos como água, enquanto eu lutava comigo mesmo, debatendo-me em uma batalha interna que ignorava as limitações do relógio.

Não sentia culpa alguma, apenas mergulhava em pensamentos sobre quem poderia sofrer com minha ausência. Seria egoísmo continuar sofrendo apenas para evitar que os outros também sofressem? E o que aconteceria depois? A fé que eu tinha era quase nula, mas será que eu poderia estar errado? Estaria eu assinando minha passagem direto para o inferno? Só de pensar em queimar eternamente no fogo do inferno, meu corpo estremecia. Esse medo, contraditoriamente, era o que me manteve vivo até então, mas também era uma das principais razões que me levaram a desistir de tudo.

No meio desses pensamentos confusos, encontrei um pedaço de vidro na rua, como se fosse um sinal. Aquele momento parecia perfeito, ninguém me veria e eu me livraria de toda aquela dor que me atormentava. Peguei aquele objeto afiado e comecei a deslizá-lo pela minha pele do braço.

Confesso que essa não era a primeira vez que eu tentava acabar com minha vida. Essa ideia rondava meus pensamentos todos os dias, mesmo sem saber ao certo o que me levou a chegar a esse ponto. Poderia ser uma combinação de diversos motivos, incluindo aquele que mencionei antes.

Sentado em uma calçada de uma rua desconhecida, o braço marcado pelo fluxo de sangue, decido interromper a narrativa e voltar à minha infância. É lá que as sementes do meu sofrimento foram semeadas em segredos e memórias silenciosas.

Não garanto que a estória da minha jornada até explorar os caminhos que me trouxeram até aqui, sentado em uma calçada desconhecida, tenha uma resposta clara e definitiva. As conclusões extraídas dela podem variar, dependendo da forma como ela ressoa na mente, no corpo e até mesmo na alma de quem a lê.

Esta narrativa é uma busca incessante por compreensão, significado e aceitação. Ao compartilhar minha jornada, espero que você também encontre reflexões pessoais, inspiração e talvez até consolo ao descobrir que não está sozinho em sua própria jornada.

Não chegarei aos 30Onde histórias criam vida. Descubra agora