Filha do Nevoeiro

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Dois dias antes da catástrofe em Uwen, Hester aguardava pacientemente pelo artesão de runas que estivera procurando por vários dias. Estava num vilarejo no meio do nada entre Uwen e Mânes, aguardando o artista recluso aceitar vê-la. A feiticeira tinha pressa, mas não se incomodava de aguardar passando o tempo lendo debaixo de uma árvore, sentada na grama.

Seus cabelos eram de um tom bonito de louro, com as pontas manchadas de roxo pela ressonância que usava. Estava sem sua máscara e seus olhos tinham um tom leitoso perturbador, como se ela fosse cega. No entanto, a praticante de magia enxergava muito bem e, quando de máscara, nada escapava à sua visão melhorada pela magia. Também tinha o rosto bastante bonito e de pé provavelmente era alta e graciosa.

Ela parou momentaneamente para apreciar a brisa que a atingia de leve. O vilarejo tinha algumas casas visíveis dali do morro, um mercado de quitandas acompanhando uma pitoresca rua central que se unia com a estrada real.

Hester estava ali para se preparar para uma investigação. Grão-Mestre Syrus D'Averli havia desaparecido e a feiticeira estava preocupada com o paradeiro dele. Havia recebido uma mensagem misteriosa do mago, junto com a instrução de procurar pelo homem que agora visitava.

Ela foi arrancada de seus devaneios e de sua leitura superficial por um pigarro incomodado e um resmungo que se aproximava.

— Uma senhorita bonita deveria procurar serviços nas cidades maiores. — um velho senhor disse ao chegar perto.

Ele trazia consigo uma trouxa grande de tecido escuro que parecia recheada e pesada. Ela sorriu e retrucou:

— A recomendação que recebi sobre o seu trabalho foi de bastante confiança, mestre Umbra.

O velho tinha a barba longa, era careca, tinha uma tatuagem em forma de sol ao redor do olho direito. Era bastante magro, com as mãos de dedos longos. Apesar disso, não parecia ter dificuldade para se mover e nem para carregar a trouxa pesada. Trajava roupas leves, de algodão cru, e andava descalço.

Ele estreitou os olhos e rebateu, rabugento:

— Pff recomendações... Mas, eu tava sem nada melhor pra fazer e não gosto de deixar as pessoas me esperando.

Com isso, sentou-se diante dela e deixou bater contra a grama a grande trouxa de pano. O barulho de dentro era como o de algum tipo de alvenaria, chocando-se. O velho cruzou as pernas de maneira bem ágil para a sua idade aparente e começou a desatar o nó que prendia a trouxa.

Hester reparou que ele tinha pequenos barbantes coloridos prendendo a barba. Cinco deles, de cores bastante distintas.

— Quantas vai querer? — Mestre Umbra indagou, sem olhar para ela.

A maga meneou a cabeça e fechou o livro que estivera estudando. Pareceu preparar-se para a resposta, como se fosse dizer algo difícil.

— Cinco. — ela disse e, depois de uma pausa cautelosa, acrescentou — Permanentes.

A réplica do velho artesão foi categórica e quase instantânea:

— É impossível criar entalhes ressonantes permanentes.

Hester pareceu hesitar por um momento, considerando suas opções.

— Não pra você. Além do mais — ela mostrou-lhe a máscara — o senhor ajudou Jon Neal a fazer as dele.

O velho suspirou e deixou a trouxa se abrir. Haviam pedras de variados formatos ali, todas com um certo grau de trabalho em sua forma, algumas até mesmo com inscrições parcialmente entalhadas na pedra.

— Quem te disse que eu consigo?

— Meu mestre. — Ela respondeu, categórica.

O artesão hesitou.

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