Talvez só uma curiosidade.

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Durante todo o dia ela não tirou o sorriso do rosto. Era mais que um sonho tudo aquilo. Até mesmo quando foi o meu dia de princesa ela foi mais princesa do que eu. Ela estava mais ansiosa e preocupada do que eu.

Quatro vestidos. Quatro sapatos. Penteado diferente para a recepção, dança, fotos e balada. Maquiagem. Unhas. Lembrar os passos de cada dança. Sorrir para o making of com bobs no cabelo... Nossa quanta coisa. Não me lembro de ter feito nem metade de tudo isso.

- Yas? – bati na porta do quarto em que ela estava descansando - Posso entrar?

- Lu... Claro que pode. It all looks. Everything perfect!

- Eu sei... – sorri – Tudo muito louco não é? Também achei no dia do meu.

- É... Muito louco!

- Mas não vim falar dessa loucura... Queria conversar com você sobre outro assunto.

- Okay. Sobre o que é?

- Primeiro: não quero estragar seu dia okay? Então se você não quiser falar nós paramos tudo bem?

- Okay pode falar. O que ta acontecendo?

- Yas... Você era muito pequena, talvez nem se lembre... – respirou fundo e fez a cara de quem já sabia o que estava por vir. Então o celular dela toca. Bernardo. E logo abre um sorrisão.

- Eu... – aponta pro celular sem se conter sorrindo – É Bernardo. Vai ser só um minutinho!

- O que? Atender? Claro... Manda um beijo pra ele.

Fiquei comendo palitinhos salgados enquanto esperava. Pela primeira vez em dezoito anos eu estava tocando no assunto com ela. Quando eu completei quinze anos todas as duvidas e curiosidades que eu tinha quanto aos biológicos surgiram pra mim com mais intensidade. Eu queria saber por onde eles estavam. Porque não estavam comigo. Pra ela não era tão difícil. Nunca a conheceu. Não chegou a viver com ela, mas para mim tinha de haver alguma resposta. E eu achava importante que ela soubesse disso assim como Ângela e Marcos sabiam.

Não demorou muito e ela voltou. Um sorriso que não cabia no rosto.

- Desculpa pode continuar... Fala.

- Okay... Eu não sei o que... Eu não sei se você pensa sobre isso...

- Ah... Já sei qual o assunto. São eles. Os biológicos. Luna, primeiro, você não esta estragando meu dia. Esta estragando o seu. E segundo eu não sinto curiosidade... Não quero saber deles.

- Mas Yas... Você não... Eu não sei, talvez sinta fal...

- Lu... Não me faça rir! Quer dizer falta? Falta de que? De pai e mãe? Não, muito obrigada, mas não. Eu tenho os melhores pais do mundo, não os trocaria por ninguém. Não preciso de mais ninguém e sei que você também!

- Não mesmo? Nada? – ela sentou numa poltrona e me olhou. Sorriu. Um sorriso sarcástico e um olhar vazio em relação a eles. Nada. Nenhum tipo de emoção encontrada. Simplesmente vazio. O que era compreensível. Respirou fundo e me encarou com aqueles olhos enormes e castanhos.

- Nada. O que não é surpresa, certo? Eu entendo que você sinta algo. Não sei talvez curiosidade de saber dela... Afinal você ainda viveu cinco anos com ela, mas você melhor do que eu deve lembrar dos três anos mais difíceis pra nós duas. Indo e vindo de uma casa para outra e de volta ao orfanato. Eu lembro, ainda que pouco, e essas poucas lembranças às vezes me deixam tristes e me motivam a deixar tudo isso lá no passado mesmo. Agora você. Você tem mais lembranças que eu. Será que não sofre com isso? Quanto a eles... Não se importam conosco. Simples. Porque se importássemos alguma coisa, de algum jeito eles já teriam nos encontrado.

- Talvez não saibam onde.

- Luna! – ela levanta e põe as mãos na cabeça como se estivesse impaciente, o que realmente estava – Para! Ele sabia. Sabia onde nos encontrar e não foi nos buscar. E ela pouco me importa porque nunca, a partir do momento em que nasci ela me quis. Aposto como eu fui um acidente. Um erro, para ela.

- Não Yasmin... Nós podemos achar as respostas disso tudo. – tentei em vão convencê-la de algo.

- Não quero respostas. Quem tem duvidas aqui é você. Desculpa Lu, mas eu não quero ir atrás deles. Não quero.

O clima no quarto já não era de felicidade ou ansiedade. Era um clima mais pesado. Embora não tivéssemos discutido não estávamos mais como antes. Eu sabia que falar sobre aquilo iria no mínimo nos dividir um pouco, mas nunca imaginei que seria tão rápido. Imaginava que embora ela nunca tivesse tocado no assunto, já tivesse pensado ou cogitado a possibilidade de procura-los, de encontra-los. Talvez curiosidade. Mas no fundo essa vontade era apenas minha.

- Desculpa Lu... Não quero te magoar, pode ser que você sinta alguma coisa por eles e eu tenha te magoado falando tudo isso, mas é que eu...

- Ta tudo bem. – abraço ela. Forte e apertado. – Desculpa ter interrompido sua preparação. Você tem que esta relaxada por que será uma noite longa. Sua noite. – beijei sua testa – Tenho que ir. Te amo.

- Também te amo.

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