Capítulo 4
O relógio de pulso de Colin marcava 21:13.
Sua visita na casa do seu segundo irmão mais velho durou um pouco mais do que o esperado. Uma conversa atípica sobre uma propriedade rural que Benedict pretendia comprar foi mais interessante do que ele poderia esperar. Não que Colin fosse minimamente experiente em relação à vida no interior, mas seria impossível não contemplar as fotos mostradas pelo irmão.
A verdade é que a conversa sobre os planos futuros de Benedict iam um pouco além de apenas uma uma compra imobiliária. O objetivo de comprar uma casa grande é que ele gostaria de formar uma família em breve e, mesmo que ainda nem estivesse comprometido, o investimento seria apenas uma pequena antecipação daquilo que era planejado.
"Talvez seja melhor o senhor virar à esquerda. Evitaremos aquele semáforo demorado." Disse Benedict ao motorista do táxi.
Quando perceberam que estavam mais de trinta minutos atrasados e que os dois não estavam com o humor fortalecido o suficiente para aturar a reclamação de Eloise, resolveram apenas descer às pressas e chamar por um táxi disponível na rua do que solicitar um carro por aplicativo.
Eles estão a caminho da sua despedida, já que hoje é a sua última noite na cidade. A atmosfera não era uma das melhores, mas a parte da sua família que ele considerava "adulta" iria encontrá-lo no aeroporto amanhã antes do voo.
"Avise que estamos chegando, irmão. Eloise já está me mandando a quinta mensagem e eu nem tive coragem de ler as quatro anteriores." Benedict pediu enquanto ainda mantinha os olhos na tela do celular e um sorriso sarcástico no rosto.
Eles estavam a uma quadra de distância da boate que Eloise sugeriu.
"Nós vamos ficar aqui mesmo." Disse ao motorista enquanto segurava uma nota de vinte libras na direção do mesmo.
Benedict olhou para ele meio desconcertado e apenas se apressou para abrir a porta traseira do carro e sair no meio do trânsito na direção da calçada.
"Pra quê tanta pressa?" Perguntou Benedict enquanto fazia uma breve corrida para alcançar os passos longos do irmão mais novo. "A parte que eu disse que Eloise te mataria era apenas uma brincadeira. Aposto que ela não fará nada em agradecimento ao fato de você permanecer perto de casa desta vez."
Colin era um rapaz bastante paciente e calmo, pelo menos na maioria das vezes. O assunto sobre a sua permanência na Europa fez com que o mesmo quisesse fugir para algum país do sul da Ásia e só voltar quando todos parassem de fazer comentários sarcásticos sobre sua vida, suas viagens, seus relacionamentos, sua maturidade e até mesmo sobre a porra do seu cabelo. A última parte claramente não era a mais irritante, mas sua mãe sabia ser insistente ao ponto de quase cortar o cabelo do filho enquanto ele tirava um cochilo em uma espreguiçadeira quando estavam em Aubrey Hall no último final de semana.
Ao virarem a esquina, conseguiram avistar o prédio de tijolos escuros com uma placa neon acesa e uma pequena fila de pessoas esperando para entrarem.
"Fala logo o que está acontecendo." Ordenou Benedict com impaciência.
Ele não sabia sobre o que, especificamente, o irmão mais velho queria que ele falasse sobre, já que sua vida parecia mais uma quebra-cabeça com peças perdidas do que qualquer outra coisa.
Há dúvidas sobre sua ambições futuras, seu relacionamento com Anthony (que não ia tão bem quanto ele queria), a publicação de seu próximo livro, a mudança no seu estilo de escrita, o fato de que ele ainda não tinha investido parte do dinheiro que herdara em quase nada, sua mudança para Portugal, a finalização do seu projeto de Mestrado e a questão de que todos os seus amigos da faculdade já estarem encaminhamos para terem suas famílias e lares fixos. Claro, não podemos esquecer de que há pouco mais de um mês ele ficou extremamente (e muito vergonhosamente) duro após deparar-se com ninguém mais e ninguém menos do que Penelope Featherington de cabelo molhado e um vestidinho casual branco enquanto ela o esperava para terminarem de finalizar um texto que ela precisaria publicar na próxima coluna da Lady Whistledown.
"Olha, Benedict, não tenho a mínima ideia do que você está falando." Respondeu de maneira simplória.
Ao ouvir a frase do irmão, Benedict apenas olhou para ele com uma expressão de indignação estampado no rosto. Era óbvio para todos que Colin estava passando por alguma situação que fazia com que ele parecesse, na melhor das hipóteses, um esquisito. As saídas repentinas durante as conversas, os devaneios exageradamente longos, a falta de atenção e até mesmo a aparência. O último ponto foi resolvido após os irmãos fazerem uma reunião de intervenção para falarem sobre as camisas amassadas que o terceiro filho exibia pelas ruas da cidade.
Após algumas semanas monitorando o comportamento desleixado do irmão, Benedict supôs que o baixo astral poderia ser resultado de algum conflito com Penélope, mas essa possibilidade foi descartado quando o mais novo anunciou que passaria as duas últimas semanas morando com a amiga por conta de problemas no acordo de extensão da sua permanência no apartamento que tinha alugado. Sua segunda aposta para aquilo tudo foi a possível falta de dinheiro, mas somente o início desse pensamento fez com que ele fosse descartado de imediato porque as economias de Colin eram, possivelmente, tão satisfatórias quanto as dele.
"Então quer dizer que a razão de você parecer uma criança desatenta andando sozinha pela Disneyland e querer fazer cosplay de Rapunzel não passa de coincidência?" Benedict tentou dar ênfase na sua postura de questionamento e cruzar os braços na frente do peitoral, mas foi impedido pelo segurança que realizava a revista.
"É sim."
Se por alguma razão Colin estava mal humorado antes, ter outro homem apalpando seu corpo em busca de objetos inflamáveis ou cortantes não ajudou muito na sua auto busca pela estabilidade de emoções.
Milagrosamente os dois foram liberados sem precisarem levar broncas da equipe de segurança, já que Benedict aceitou o fato de que o consumo de maconha era proibido de verdade dentro daquele estabelecimento. O mais engraçado é que eles deixavam as pessoas entrarem com alimentos comprados em outros lugares, o que facilitava bastante o consumo de cannabis de formas mais discretas.
Quando os dois cruzaram o longo corredor enfeitado com lâmpadas de led brancas e neons coloridas e finalmente deram de cara com a pista de e bares, perceberam que não havia mais do que vinte pessoas presentes. Olhou para Benedict e percebeu a expressão de entendimento que ele fez.
"Hoje é sexta-feira" disse como se Colin não soubesse qual era a data. "Eles abrem às nove e meia, mas..."
"A galera só chega por volta das onze." Completou Colin com total desânimo.
Ele já estava bastante frustrado com as coisas que vinham acontecendo em sua vida e faltava muito pouco para que ele desistisse de tudo e voltasse para o conforto do quarto de hóspedes do apartamento de Penelope e ficasse lá até a hora de ir para o aeroporto.
Suas saídas do país eram tão constantes que ele já nem entendia a necessidade de fazerem uma despedida toda vez que isso acontecia.
"Não fomos os únicos a chegarmos mais cedo, irmão." Constatou o mais velho enquanto apontava para o canto esquerdo do balcão do bar.
Colin foi nocauteado quando seguiu o direcionamento do irmão.
Penelope andava na direção dos dois, atravessando a pista de dança vazia com tamanha discrição e elegância que era capaz de tirar o fôlego de qualquer um que desse de cara com ela e aquele maldito vestido.
Ele conseguiu ouvir Benedict exclamando um "Caramba!" ao seu lado e logo cutucou-o com o cotovelo para que ele ao menos demonstrasse o mínimo de respeito pela garota, já que ele mesmo não estava fazendo isso.
Penelope tinha comentado sobre uma sessão de coquetéis na editora para comemorarem o alcance da meta das vendas digitais daquele trimestre e a chegada de uma equipe de apoio que auxiliaria a transição da produção de conteúdo 100% online para uma disseminação mista que incluísse cópias físicas, o que era um plano experimental já que o restante do mundo parecia ir na direção oposta.
O vestido preto de comprimento mid estava espetacular nela. O decote reto, baixo o suficiente para destacar os seios, o colar curto com medalhinhas prateadas, a fenda na perna esquerda que acabava na metade da coxa, as mangas que cobriam até a metade do seu antebraço, as sandálias de salto também pretas. Tudo aquilo, mesmo que de modelos simples, contribuíram para que Penelope parecesse, ou melhor, se destacasse como a mulher mais atraente que estaria presente naquele lugar.
Uma voz muito parecida com a de Colin respondeu o "boa noite" que ela disse aos dois, mas ele ainda estava desconcertado demais para pensar em começar um diálogo (mesmo que fosse um diálogo simples).
"Tenho certeza que Eloise perturbou vocês para que chegassem mais cedo, certo?" Questionou a mulher enquanto tentava segurar a risada "Eu tive que praticamente fugir de um evento do trabalho durante o discurso do meu chefe. Era certo que se eu não saísse naquele instante, eles arrumariam várias desculpas para tentarem me fazer ficar lá até mais tarde."
"Pior que você está errada." Começou Benedict "Eloise me ligou algumas vezes, mas não atendi com medo de levar uma bronca porque pensamos que estávamos atrasados também."
"Isso só pode significar que ela também está super atrasada." Resmungou Colin.
Penelope tentou disfarçar uma risadinha colocando a taça em sua mão na frente dos lábios, mas sua natureza estabanada não poderia ser ignorada somente porque ela estava usando um belo vestido, fazendo assim com que derramasse um pouco do seu cosmopolitan em seu decote.
Involuntariamente, os dois rapazes fixaram os olhos no busto da moça, mas permaneceram vidrados ali por mais tempo do que os bons modos permitiriam. Não que houvesse algum livro de etiqueta que sugerisse um tempo respeitoso para a admiração de partes íntimas de qualquer outra pessoa.
Penelope tentou virar para o lado e esconder seu pequeno acidente, mas ao perceber que os dois olhavam fixamente para aquela parte específica de seu corpo, mal conseguiu controlar-se e apenas esfregou a mão na pele molhada enquanto pigarreava alto para chamar a atenção deles para qualquer outro assunto.
"Então, Colin, animado?" Perguntou tentando chamar a atenção alheia para qualquer outra pessoa que não fosse ela.
Colin não tinha tido a conversa sobre as inseguranças que essa próxima viagem causaram (e continuam causando) com ninguém. Não fez isso porque sabia que a primeira reação de quem escutasse suas lamúrias seria dizer para ele desistir de toda a ideia para ficar, mas ele também estava inseguro em relação a isso.
"Estou ansioso" Respondeu enquanto olhava para um ponto distante do balcão do bar "Sempre fico assim antes de sair da cidade." Completou por fim.
Ele não estava mentindo em nada. Sempre ficou ansioso antes de viajar e sentia-se assim na hora de voltar para casa, entretanto, o sentimento de ansiedade geralmente era acompanhado com bastante animação e senso de aventura.
Na mente de Colin, Penelope fez aquela pergunta sem pensar muito. Os dois tinham conversado sobre o assunto de deixar lugares semanas atrás quando ele foi ao apartamento da amiga para ajudar na escrita de uma de suas crônicas. No dia em questão, ele explicou detalhadamente sobre quais eram as sensações que tinha em relação ao assunto e, de certa forma, tentou comunicar Penelope de que ele não se sentia assim dessa vez, mas ele não poderia culpá-la por não decifrar charadas porque nem ele mesmo seria capaz de entender, muito menos de explicar, o que estava acontecendo.
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Precisamos crescer, Colin
FanfictionPenelope e Colin são amigos há anos. A proximidade e lealdade entre os dois jamais seria questionada até o momento que Colin percebe que Penelope não o incluiu em seus planos de vida a longo prazo. A dificuldade que os amigos possuem em alinhar sua...