Capítulo 1 - o massacre

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Flâmulas coloridas estavam dispostas em fileiras no estreito gueto de Girtu. Homens com peles verdes tocavam gaitas de fole e acordeões. As crianças dançavam em volta da fogueira, segurando cordas presas a estacas altas, e giravam, formando um ciclone de cores e sonhos.

Esse era o típico lugar em que uma pessoa sã jamais ousaria andar à noite. Mas hoje, nenhum estrangeiro poderia notar isso. Porque, hoje, aqui era um lugar seguro para aqueles que não se sentiam seguros o ano todo.

Os moradores de Girtu (as olemeias) eram as criaturas mais bonitas do planeta. Tão bonitas que podiam colocar uma pessoa em um sono mortal com um sorriso e roer seus ossos enquanto a vítima admirava seus olhos. E elas adoravam encontrar novas vítimas, exceto neste dia.

Animanos e simpatizantes de nossa causa se reuniram para celebrar a Festa dos Encantados, uma celebração para todos aqueles que são diferentes da sociedade: as feras com coração, aqueles que sonharam com um futuro em que todos nós poderíamos viver sem medo de ser quem somos. 

Um futuro em que, talvez, eu pudesse revelar ao resto do mundo que eu era um deles. Mas, por hoje, eu estava disfarçado de simpatizante. Minha melhor amiga, Sabrina, era a única que sabia quem eu era.

"Você gostaria de tomar um gole de rum?" Sabrina sussurrou em meu ouvido, inclinando-se em sua cadeira para se aproximar. Ela estendeu uma garrafa.

"Você não deveria ficar bêbado."

Sabrina, minha melhor amiga, cruzou os braços, com os cabelos castanhos caindo do coque. Ela era uma das garotas mais bonitas que eu já havia conhecido. "Erya, quando foi que você já me viu perder o controle e ficar bêbada?"

Eu sorri e dei de ombros. "Nunca."

Sabrina virou a cabeça, olhando para meus guardas reais. "Quanto tempo esses caras vão ficar aqui?"

"Até eu ir para o palácio."

"A vida das princesas parece ser uma droga", disse ela, enchendo sua xícara.

Lembrei-me dos rituais pelos quais passei. Tentei fingir um sorriso, mas ela já sabia o que eu pensava sobre isso.

"Sim, é."

Ao cair da noite, as fogueiras eram as únicas luzes que iluminavam a festa. Enquanto Sabrina e eu batíamos palmas, um humano agora cantava uma canção de ninar. Sua voz era rouca, suave e enérgica ao mesmo tempo.

"Nana neném, a Cuca vai pegar. Ela está vindo atrás de você. Sugando sua alma, rasgando seus ossos. A Cuca vai te pegar."

Quando Sabrina e eu cruzamos os olhos, rimos.

"Essa é a música que costumávamos ouvir quando éramos crianças", disse ela.

"Quem escreveu essa canção de ninar não gostava muito de crianças", respondi.

Ela riu, abraçando meu braço e deitando-se em meu ombro.

A cuca vai pegar.

Eu me virei para olhar para Sabrina. E a música cessou, dando lugar a uma cacofonia de gritos.

Uma flecha perfurou a testa do cantor, o sangue escorreu pelas têmporas, mandíbula e pescoço. Ele abriu os lábios e caiu do palco, rolando no chão até chegar aos meus pés.

Senti meu coração bater forte em meus ouvidos. Levantei-me e puxei Sabrina pelo braço. Ela tropeçou.

"Erya, que diabos é isso?", perguntou ela, com as mãos abanando.

Meus guardas se prostraram ao nosso redor e tive que me abaixar para ver o que estava acontecendo.

Vinte homens empunhavam arcos e flechas, atirando em civis. Uma flecha atingiu um animano idoso que estava se transformando. Meus olhos lacrimejaram ao ver seu corpo, metade cobra e metade homem, agora morto.

Selvagem HerdeiraOnde histórias criam vida. Descubra agora