Ilyan Angelle
Em nossa vida curta ou longa, medíocre ou farta jamais nos atentamos a pior coisa que existe durante todo esse grande processo de mudanças, crescer. De repente a doce infância se torna amarga e madura demais e você se vê enterrado em um poço fundo e escuro e eu posso lhe garantir que seus pais não vão estar ali pra te salvar como fariam quando você era apenas uma criancinha. Demorou mas eu entendi, entendi quando vi os olhos negros dela se distanciando dos meus e daí pra frente o caos dominou, no mundo e em mim. E reencontrar com esses olhos mais uma vez fez meu coração borbulhar mas agora é diferente e eu posso me permitir desdenhar dela, eu devo.
Momento Atual, durante o caos.
Alice Tamura.Quando o breu me atingiu eu pude por um segundo ter certeza que minha cabeça seria cortada fora, é óbvio que pensei. Sou filha do diretor da OCI e eu creio que as gangues livres adorariam provocar meu pai a este ponto, mas quando meus olhos se abriram com lentidão e eu pude me ver em uma cela eu fiquei crente de que eles tinham planos maiores e que iam além do meu corpo frio e da minha cabeça em uma estaca. Meu olhar cai sobre meu próprio corpo, não estou acorrentada pelo menos e o ambiente me aparenta estar limpo apesar de ser velho, eu observo e do outro lado da cela posso ver um rapaz que aparenta ter minha idade, seus fios loiros são iluminados por uma pequena janela no canto do local e se tornam fios de ouro ao olhar de qualquer um que os mire, os olhos são azuis como águas cristalinas, ele é magro e não tão alto além de ter uma grande cicatriz que se estende do pescoço até seu queixo. Ele capta meu olhar confuso, curioso e astuto e um grande sorriso brota em sua face. — Vejamos quem acordou, Alice Tamura em pessoa. — por mais brincalhão que seu tom seja sinto um pingo de veneno no fundo e sei que ele simpatiza comigo por pura educação, sinto. — Você é conhecida por ser filha do diretor da OCI mas devo admitir que são suas ações inconsequentes que dão nome a sua fama. — Deixe de incomodar, Matteo. — Aquela voz que lembro um dia ter sido tão conhecida por mim invade o ambiente, meu rosto se vira e os olhos negros que antes costumam brilhar pra mim estão foscos e com uma chama ardente que não me parece ser amigável, é como se fosse me queimar viva com o olhar e eu sinto isso me atordoar.
Ele me encara e sei que se repreende por seu olhar demorar mais do que deveria em minha figura agora estática e sem uma reação. — Vejamos, finalmente conhecemos a filha do chefe... — "Finalmente conhecemos", isso foi inesperado e minha surpresa mal pode ser encoberta , ele percebe isso e um sorrisinho de canto brota em seus lábios. — O gato comeu a sua língua? — Ilyan pergunta mas nada sai da minha boca, um ruído de choque talvez tenha escapado mas nada além disso. Eu suspiro. — Não comeu minha língua mas comeu sua memória, não é Ilyan? — Minha fala o pega de surpresa, anos se passaram e ele deveria saber que o tempo me tornou mais atrevida e amarga, óbvio que tornou. — Você a conhecia? — Matteo pergunta, as sobrancelhas arqueadas em pura dúvida e depois de alguns segundos Ilyan solta uma risada irônica, ácida. — Eu lembraria se conhecesse a filha do diretor da OCI, ela já deve ter escutado meu nome por aí, não é? — A desculpa não é das melhores mas até que cola bem, Matteo não refuta porém meu olhar pra ele é de um ódio tão genuino que por um segundo eu o senti estremecer diante de minha fúria interna. Eu sei que ele espera um surto porém espera menos ainda a minha reação contida e calma que não combina com os meus pensamentos que estão em puro caos agora. Eu me sento na cadeira dentro da cela, cruzo as pernas e solto uma risada longa. — Adianto, não tenho informações valiosas quanto ao meu pai ou aos planos dele. — Dou de ombros. — Meio difícil de acreditar. — Ilyan solta, desafiador como sempre mas não me abalo. — Não é problema meu se não acredita, não sei de nada. Meu pai não faz questão que eu saiba, e outra... Não costumo esconder oque sei ou oque conheço, não sou uma mentirosa descarada e meu caráter não é do tipo que parece uma balança e cai para o lado que o favorece. — Minha expressão é neutra, Matteo parece captar o clima tenso e da uma risada longa. — Okay, vamos nos acalmar. Tenho certeza que se ela souber de algo com o tempo e confiança ela irá nos contar, certo Alice? — Seu olhar antes em Ilyan cai sobre mim. — Contar oque? Já disse que não sei de nada mas se quiser tanto assim uma informação valiosa eu posso ter falar a quantidade de água em mililitros exata que meu pai bebe por dia, pode ser algo útil não acha? — meu tom carrega um tom ácido e meus olhos se reviram, Matteo solta uma risada gostosa e arrastada. — Gostei dessa. — Ele diz dando batidinhas no ombro de Ilyan. — Vamos, Kanao está nos esperando. — Ele complementa e sai da sala me dando uma última encarnada, ficamos ali, Ilyan, eu e o silêncio constrangedor que logo é quebrado.
— Sua mente apagou minha face de suas memórias mas seu coração ainda guarda a minha áurea. Não é bela ou cativante mas era volátil e era sua. — Minhas palavras não carregam nada mais nada menos do que a verdade e ele sabe, ele sente.
— Está errada, meu coração guarda mais coisas além do que sua áurea Alice, ele guarda o amor que um dia eu senti por você. — Não pude esconder minha face supresa, eu sempre fui péssima em esconder meus sentimentos e eu sempre fui boa em abafar o fato de que eu o amava também.
— E não sente mais? — Arrisco.
— Não — E me arrependo no mesmo instante, já que sua resposta me machuca mais do que eu planejava machucar. Ele sai do local me deixando sozinha e com o coração perigosamente frágil.Ilyan Angelle
Aquelas palavras que saíram de minha boca eram pura mentira, mas eu não poderia dá-la esperanças que não posso. Deu errado uma vez e eu sei que daria de novo. A agitação interna em mim continuava, meus desejos e instintos em desacordo com meu rígido senso de dever. No entanto, na presença de Alice, um vislumbre de vulnerabilidade brilhou sob minha fachada dura e pouco emotiva. Eu me senti atraído por ela, mais uma vez, cativado por sua audácia e espírito inflexível.
Me dirigi para fora daquele local e caminhei lentamente pelo longo corredor até a sala de reunião onde Kanao e Matteo me esperavam. — Demorou. — Kanao diz, poucas palavras, centradas. — Demorei, mais do que deveria até. — Matteo solta uma risada. — Ela é arisca, da pra ver que não sabe de nada mas se soubesse duvido que contaria... — Ele diz, seu tom é divertido, como sempre, transformando aquilo em um joguinho pra ele. — Tortura resolveria. — A loura acrescenta e eu me sobressalto levemente. — Sem tortura! — Minha afirmação parece preocupada demais e retira olhares curiosos de ambos. — Ela é filha do diretor, não é muito inteligente machuca-lá sabendo que ele tem muitos recursos e poderia nos fuzilar. — Kanao revira os olhos e abre a boca pra contrariar porém Matteo a corta. — Ele está certo. Vai querer ela de volta inteira... ela é muito valiosa. Viu a tatuagem no pescoço dela? — De repente ela parece supresa e me olha incrédula, eu apenas confirmo positivamente com um aceno de cabeça. — Ela é...? — Matteo a interrompe de novo. — Sim, ela é. Mas ela não sabe, nem o diretor e o resto das gangues muitos menos.
— Sou oque? — Não poderia estar mais surpreso em ouvir aquela voz e ouvir uma arma ser engatilhada atrás da gente, quando eu me virei Alice segurava uma arma na mão e eu me culpei internamente por ter dado brecha pra ela escapar. Ela não é mais aquela garotinha e eu não a conheço mais, não tão bem quanto eu pensei que conheceria e sei que ela pensa o mesmo de mim.
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Entre o Caos e a Fumaça
Science Fiction(Fanfic pausada) Em um mundo apocalíptico onde uma doença viral terrível que degrada e controla o cérebro do hospedeiro como um parasita o transformando em uma casca oca e violenta, Alice Tamura filha do presidente da OCI (Organização contra infecçã...