— Quando a imensa escuridão engoliu o sol após o crepúsculo — narrava Benjamim com uma voz teatral e polida como a lâmina de uma adaga bem amolada —, nuvens densas e carregadas, tão sombrias quanto a própria morte, se apossaram do céu, impedindo qualquer manifestação de alegria projetada pelos infinitos astros que brilhavam em sua vastidão. Os ventos, outrora calmos e cálidos, tornaram-se frígidos e arrogantes, anunciando que com eles viria uma tempestade.
Rayane, Gabriel e Sara ouviam atentamente a história contada pelo outro. Os quatro amigos haviam se reunido no velho chalé dos pais de Sara para aproveitarem o feriado estendido naquela primavera. Eles estavam reunidos na sala de estar com a mesinha de centro suja de um pozinho branco, comendo pizza de pepperoni e bebendo cerveja gelada, quando Rayane provocou-os, questionando se eles conheciam alguma história apavorante que fosse capaz de lhe amedrontar.
— Não é tão difícil te assustar — disse Sara com um sorriso frouxo. — Você se tremeu toda quando se olhou no espelho hoje de manhã.
Os dois garotos gargalharam enquanto Rayane xingava a amiga. Foi quando Benjamim manifestou-se, aceitando o desafio.
— O noivo estava vestido com um terno cinzento e usava uma gravata tão prateada quanto as lágrimas, que rolaram em seu rosto poucos segundos antes de encontrar-se como sono perpétuo — continuou o garoto sardento. — Ele se entregou a temida certeza num sabor amargo e melancólico, cortando seus pulsos com uma faca cega no chão do banheiro malcheiroso, ao descobrir que sua noiva fugira do casamento agarrada ao braço de um dos seus padrinhos...
— Uma vaca e um escroto! — interrompeu Rayane, afastando as tranças do rosto.
— De fato — prosseguiu Benjamim, revirando os olhos escuros. — A noiva, com seu vestido cor de gelo, assumiu o banco do motorista de um carro preto, e lançou pela janela seus sapatos de salto alto, ao passo que seu amante sentava-se no banco do carona.
"Eles tomaram uma rodovia federal e saíram da cidade, rumo a liberdade para viverem seu amor. Os amantes estavam tão eufóricos com sua empreitada que podiam sentir a adrenalina correr como cascatas por suas entranhas, sem nem imaginar o que poderiam ter causado ao noivo... Em meio a excitação e aos risos bobos, o amante ligou o rádio e colocou numa estação de rock, quando começou a tocar a música 'Eu Vou Estar', da Capital Inicial..."
— Adoro essa música! — exclamou Gabriel, entrelaçando os dedos atrás da cabeça e reclinando-se na cadeira de balanço marrom.
— Qual é, Ben? — questionou Sara com impaciência. — Já entendemos que você é um excelente contador de histórias, mas quando vamos chegar na parte do terror? Até o quarto do Gabriel assusta mais do que esse conto de corno.
— Se ficarem me interrompendo, não conseguirei terminar nunca — respondeu, ríspido. — Onde estava... Ah, sim... Ao findar da primeira estrofe, a noiva mudou rapidamente a estação.
"O amante assustou-se com a ação repentina da noiva, perguntando o motivo do agir dela. Porém, ela limitou-se a uma resposta genérica, como quem não gosta de rock. Algumas horas mais tarde, longe o suficiente, o casal de amantes decidiu passar o restante da noite em um motel de beira de estrada. Eles alugaram um quarto barato e simples, comum a cama grande, aparelhos de som e tv. A primeira vista, a noiva fizera uma expressão de absoluta repulsa, mas ela desviou seus pensamentos quando o amante enfiou a língua dentro da sua garganta. Ele retirou seu vestido enquanto ela despia-o.
"Depois de transarem, a noiva se banhou debaixo de um chuveiro com água quente e, saindo envolvida numa toalha com manchas amarelas, escovou seus dentes na pia de porcelana escura. Mas, ao desembaçar o espelho, saltou e soltou um grito estridente ao deparar-se com o rosto do noivo, encarando-a bem às suas costas... O amante despertou e correu ao seu encontro, mas ela apenas disse que não havia sido nada. Que estava cansada e precisava descansar... Contudo, o rádio ligou sem ninguém ter lhe dado tal comando e começou a tocar a música que tocara outrora no carro. A noiva apressou-se a desligar o aparelho, mas a música não parou. Ambos se olharam assustados, um tentando buscar coragem no outro, mas o pior ainda estava por vir.
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A Dama Branca
HorrorDurante o período de feriado, quatro amigos se reúnem em um chalé remoto para curtirem longe dos pais. Porém, as coisas ficam estranhas quando eles começam a escutar uma cantiga infantil ecoando pelos ventos: "Se essa rua, se essa rua fosse minha...