Raio de sol.

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Domingo, 9:15 AM, Rio das Ostras, Rio de Janeiro.

Acordei com o som de pratos indo em direção ao chão e gritos. Ela berrava no telefone discutindo com seu namorado feio e calvo. Não tive coragem de levantar, sabia que minha mãe estava irritada e não queria brigar, já tínhamos brigado na noite passada, vivíamos em pé de guerra.
Continuei deitada até os barulhos cessarem, ouvi o bater da porta e pela paz, concluí que Aurora tinha saído, finalmente, um pouco de paz.
Eu não tinha muito o que fazer em casa. Já tinha me formado  na escola, não trabalhava, não tinha amigos e o que me restava era fazer faxina enquanto ouvia Radiohead e Deftones. Estaria mentindo se dissesse que sou feliz vivendo assim, não sou feliz, sou apenas acomodada, me acostumei com toda essa merda e não sei o que fazer pra sair desse fundo do poço. É como uma areia movediça, e mesmo que tente sair, só vou me afundar mais e mais.⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀
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Como previsto, não fiz nada o dia inteiro. Minha mãe chegou por volta das duas da manhã, com o Adélio, o namorado calvo dela, que eu odeio. Me senti na obrigação de sair de casa, estar na mesma atmosfera que aquele MegaMente prejudicado era testar demais a minha sanidade, que já não era muita. Como sempre, fui à praia.
O vento estava gelado, o que não é de costume considerando que o Rio de Janeiro tem um sol pra cada cabeça. O vento deixava meus pés e mãos gelados, a fumaça quente do cigarro que estava entre meus dentes me causava um choquinho térmico, o mar também estava mais agitado que o normal. Não era uma noite comum, desde do início.
Estava sentada em uma pedra observando as ondas, no fone tocava o álbum "Faith In The Future" do Louis Tomlinson, já tinha fumado metade do maço, estava imersa no meu próprio mundo quando escuto uma voz me chamar.
— Tem mais um aí? — Era uma garota. Sua pele negra brilhava sob a luz do luar, o cabelo loiro como um pedaço do sol recaia no vestido preto, ela sorria pra mim como se me conhecesse a anos. Acho que ela é a mulher da minha vida.
— Mais um o que?
—Cigarro ué. — Ela riu. Me apaixonei.
— Ah claro, tenho sim. — Tirei um do maço e entreguei a ela, colocou o cigarro na boca, mas não acendeu, e se sentou do meu lado sem falar nada.
— Não vai acender? — Perguntei.
— Eu não fumo.
— E por que me pediu um cigarro?
— Por que te achei bonita e queria falar com você. — Ela disse pra mim, olhando no meu olho, sorrindo, com os olhinhos de jabuticaba quase que sumindo. Cedo demais pra falar que quero casar com ela?
Não consegui falar nada. Fiquei olhando pra ela e sim, leitor, eu sou péssima em falar com mulheres, fico nervosa na presença de uma bela moça e ajo feito uma bobalhona. Mas que culpa eu tenho? Mulheres causam esse efeito em mim.
— O que você está escutando? — Ela quebrou o silêncio, voltando a olhar para as ondas.
— Louis Tomlinson. — Respondi.
— O da banda morta? Você não parece ser do tipo de pessoa que gosta de one direction. — Ela disse rindo. Que sorriso.
— Sim, e não gosto da falecida, mas gosto do Louis.
— Do que mais você gosta?
— Radiohead, Deftones, Slowdive...
— Que isso, tão linda, mas tão triste. — Ela me cortou, mesmo me chamando indiretamente de depressiva, o que não é mentira, não consegui ignorar o "tão linda" e corei. Fiquei envergonhada, mas é impossível ficar normal ao lado dela.
— Qual o seu nome gatinha tristonha?
— Mahina, e o seu?
—Elara. Significa "A que brilha". Seu nome significa lua, sabia?
—Sabia.
—Serei o seu sol, espero encontrar você amanhã aqui de novo, lua. — Ela se levantou e foi embora.
Não pude evitar o sorriso no rosto enquanto voltava pra casa e pensava na menina que tinha acabado de conhecer, talvez eu deveria estar com um pouco de medo por era ter me chavecado tão descaradamente sem nem saber o meu nome, mas ela é linda demais pra isso, apenas vou esperar ansiosamente pra poder me reencontrar com a menina — raio — de — sol novamente.

A Poesia das Águas-Vivas.Onde histórias criam vida. Descubra agora