"A Casa" pagode de Arlindo Cruz

2.7K 199 726
                                    

Quem diria que três carros teriam tal diferença em energia.

No carro em que Pernambuco dirigia eles cantavam uma música alta enquanto de minutos em minutos discutiam algo. 

Onde o Rio Grande do Sul dirigia tudo estava tão sereno e calado que até um piscar de olhos poderia ser escutado.

Já no carro onde o carioca estava, por incrível que pareça, tudo parecia bem calmo. O único som que se podia escutar era do pagode tocando baixo na rádio do automóvel e as conversas aleatórias das duas garotas. 

Rio batucava o dedo no volante e mexia a cabeça na batida da música. Sampa estava com a metade da cabeça pro lado de fora da janela, sentindo o ar fresco bater em seu rosto e o som das folhas nas árvores se chocarem entre si.

A viagem até que estava nutrindo uma certa felicidade…que durou pouco.

O som das buzinas frenéticas era o que mais se conseguia ouvir no breu da estrada.

— Bora!

Trânsito.

— Será que demora muito pra gente chegar? – A capixaba pergunta para ninguém em específico, descansando a cabeça nos ombros da garota ao seu lado.

— Puta que pariu... – O carioca bufa, apertando a buzina descontroladamente.

— Apertar essa porra até estourar nos tímpanos não vai adiantar de nada! – Sampa comentou, com os dedos nos cantos dos olhos enquanto tentava não se estressar. — Cinquenta minutinhos…

— Olha, você não me estressa, se não te pego aqui mesmo! – Enraiveceu batendo no volante e se virando pro paulista que tinha as bochechas tão vermelhas quanto um tomate. — Na porrada… te pego na porrada, o que passou na sua cabeça?! – Sampa nada respondeu. Desviou o olhar, tentando controlar as bochechas rubras.

Rio olhou para as duas meninas no banco de trás que logo desviaram o olhar pro celular que Espírito Santo segurava. "Olha que interessante" "Uau, que massa" "calculadora, né?" "Muito interessante". Até Manaus, a ararinha azul que sobrevoava o trânsito entrou pela janela se sentando no ombro da dona e fingindo prestar atenção na conversa. 

Rio voltou à posição inicial, batucando os dedos com raiva no volante. 

— Olha o sacolé!...moço caiu. – O vendedor que passava ao lado do carro cutuca o loiro e aponta para o chão. O carioca passa a cabeça pela janela olhando na direção onde apontava mas nada via. — O preço do sacolé, moço.

O carioca riu baixo negando com a cabeça.

Ia responder, se o paulista ao seu lado não tivesse sido mais rápido.

— Queremos não. Obrigado. – Dispensou o vendedor, que saiu a procura de outro cliente.

Rio estava com uma interrogação em cima da cabeça.

— Tá louco de comprar isso uma hora dessa? Sabe nem quem fez. Com que água foi usada. – O moreno se endireita no estofado do banco e cruza os braços olhando os faróis brilhantes dos carros na frente. — Tem que ser muito burro pra tomar um negócio desse!  

Enquanto isso…no outro carro:

— O teu é de quê? – Sergipe pergunta apontando para o picolé que o outro segurava ao seu lado.

— Goiaba. E o teu? 

— Coco.

— Quer uma chupadinha, é? – Maranhão perguntou, segurando um sorriso que pelejava para sair de seus lábios. 

— Êei rapaz… – Os dois não se aguentaram, caindo na risada. — Quero não. 

— E tu? Vai querer mesmo não? – Pernambuco ofereceu o picolé de maracujá para a baiana ao seu lado, que apenas fez que "não" com a cabeça e continuou a mexer no Google Maps no telefone.

Os FarofeirosOnde histórias criam vida. Descubra agora