Prólogo

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Girei a metade da minha sexta-feira e todo o meu sábado meticulosamente planejando cada detalhe, ansiando por uma perfeição irrepreensível. Minhas horas foram consumidas em um esforço cauteloso, como se desenhasse uma obra de arte onde até o mínimo detalhe precisa estar em harmonia. Calculei cada gesto, cada escolha, como o que fazer, suas preferências, a roupa adequada. Eu sabia exatamente o que ele amava e faria tudo ao meu alcance para ver seu sorriso de satisfação.

Hoje, comemoraríamos o nosso terceiro aniversário de namoro. A conexão entre nós era sólida e genuína, ou ao menos sempre acreditei assim. Afinal, nunca brigávamos, exceto por pequenos desacordos – discussões triviais sobre quem teria o controle remoto da televisão ou sobre o par de sapatos que ele deixava casualmente fora do lugar. Jack era uma pessoa organizada, meticuloso em tudo o que fazia, talvez até mais do que eu, que sempre gostei do toque leve do improviso. Mas hoje, este dia, eu estava pronta para superar a mim mesma em precisão. Hoje, tudo seria calculado, sem espaço para falhas.

Cheguei à sua porta no final da tarde, trazendo comigo uma torta de maçã feita com os melhores ingredientes que pude encontrar. Sabia que aquele era o seu doce favorito, assim como o vinho francês que, há algum tempo, não dividíamos juntos. Quanto tempo teria passado desde nossa última taça compartilhada? Talvez cinco, oito meses. A vida parecia ter se acelerado, e o momento que eu tanto aguardava finalmente chegara.

Diante da porta, avistei o interior do apartamento. Algo estava... fora do lugar. A sala, que sempre transpirava ordem e aquela fragrância sutil de avelã misturada a notas amadeiradas, agora parecia desordenada. A sensação era sutil, mas desconfortável. Uma pequena dúvida brotou, mas logo a suprimi, como uma chama que sufocamos antes de se espalhar. Jack não era de esquecer compromissos. Ele sabia que hoje seria especial. Eu não deixaria qualquer incerteza obscurecer o brilho daquela noite.

Inspirando fundo, segui para a cozinha, onde depositei com cuidado duas taças de vinho sobre a pia, ajeitando o reflexo delas ao lado da minha própria imagem no espelho. Meus cabelos estavam cuidadosamente finalizados, e, embora preferisse deixá-los rebeldes, ondulados e naturais, escolhi alisá-los e domá-los para combinar com o gosto dele. Aquela noite, ele veria a versão que sempre amou em mim. Era o nosso dia, e tudo deveria ser perfeito.

A chuva suave do lado de fora parecia dar o toque final ao cenário. A sensação era revigorante; o clima exalava frescor e prometia um início auspicioso. Passei uma camada extra de gloss de morango nos lábios, saboreando o aroma e o toque suave, enquanto retocava os detalhes do meu vestido. A peça, em um tom profundo de vinho, com um elegante decote em V nas costas, era longa e delicada, cobrindo minhas pernas em um caimento gracioso. Ele me presenteou com aquele vestido no meu aniversário de vinte e um anos. Nunca me esquecerei daquele dia, em que ele não pôde estar presente, mas fez questão de enviar o vestido, em uma prova de afeto. E eu, de bom grado, aceitei.

Tudo parecia estar pronto. Tomei as taças, segurei o vinho com mãos firmes e caminhei em direção ao quarto de Jack. Pelo corredor, o silêncio parecia abafar qualquer eco dos meus passos. Sem enviar mensagens ao longo do dia, achei que a surpresa daquela visita inesperada tornaria o momento ainda mais memorável. Sorri, imaginando que ele entenderia a brincadeira.

Entretanto, quando cheguei perto da porta entreaberta, algo capturou minha atenção. Um perfume peculiar pairava no ar, doce e distinto, contrastando com a fragrância usual de Jack. Era feminino. Nunca senti aquele aroma antes. Teria ele comprado um perfume novo? Talvez fosse um presente para mim, uma surpresa para celebrar nosso dia. Contudo, eu sabia que ele não faria essa escolha – sou alérgica a perfumes adocicados, e ele conhece essa minha restrição.

Antes que pudesse recuar, uma risada suave ecoou do quarto. Parei. A risada não era a dele, mas de uma mulher. A primeira reação foi de negação. Não podia ser. Evellyn, pensei, talvez fosse Evellyn, sua irmã, uma explicação racional que meu coração, hesitante, abraçava. Era sua irmã. Tinha que ser.

No entanto, conforme avancei, cada vez mais próxima do cômodo, os detalhes ao meu redor começaram a desmoronar qualquer justificativa ingênua que eu pudesse criar. Pela fresta da porta, avistei algo que jamais poderia ter imaginado. Um par de sapatos femininos jogado casualmente pelo chão. Sapatos que definitivamente não eram meus.

Respirei fundo, tentando conter o redemoinho de emoções que surgia, como uma tempestade sufocante dentro do peito. Decidi que era hora de encarar a realidade. Abri a porta, talvez com uma força que nunca soube que tinha, e o quarto revelou a cena que destruiria o que havia de mais belo em mim.

Jack, o homem que até então julguei conhecer melhor do que a mim mesma, estava ali, entregue aos braços de outra mulher. A visão deles juntos – o seu toque, o beijo – era um golpe devastador, roubando de mim qualquer força que ainda restasse. Meu peito queimava, uma dor aguda e implacável, enquanto meu corpo paralisava, incapaz de reagir. O perfume doce dela se sobrepunha ao aroma de avelã e madeira, engolindo qualquer traço da familiaridade que Jack costumava evocar.

O impacto daquela traição era como uma lâmina, fria e afiada, perfurando-me lentamente. Uma força que eu desconhecia, quase instintiva, me fez derrubar as taças e o vinho que carregava. O som estridente do vidro quebrando e do líquido escorrendo sobre o carpete branco foi suficiente para interromper o que estavam fazendo. Ambos voltaram seus olhares para mim. Os olhos de Jack, que tantas vezes achei que poderiam me ler por completo, estavam agora cheios de algo que identifiquei como piedade e surpresa. Talvez um toque de arrependimento.

Senti-me destroçada, como se ele houvesse quebrado algo irreparável dentro de mim. Por um instante, desejei ter forças para dizer qualquer coisa, para expor a tempestade que ele havia desencadeado em meu coração. Mas as palavras não vieram. Fiquei ali, imóvel, paralisada pela traição e pela dor, encarando o homem que prometeu ser meu, mas que agora se tornava um estranho.

Minha saída foi silenciosa. Caminhei até a porta, o som dos meus passos abafado pelo pulsar de minha dor. Na rua, a chuva descia pesada, mas eu não me importava. As gotas misturavam-se com minhas lágrimas, enquanto sentia o frio da noite envolver meu corpo e a água escorrer por meus cabelos agora despenteados e molhados. Jack havia destruído aquilo que havia de mais belo em mim: o desejo de amar e ser amada. Com cada passo dado, eu me distanciava daquele homem e de tudo o que ele representava.

A partir daquele momento, Jack Hall não seria mais nada.

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