lembranças cruéis

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" Esses olhos... O que falta em mim? "

    Os dias passaram tão rápido que pareciam não ter acontecido, Louise se mostrava mais hostil do que de costume em relação a Izzy, porém a platinada não lhe dava tanta atenção, afinal, não poderia ser expulsa, ferida ou ignorada, essas eram uma das vantagens de ser a escolhida.
    Diferente dos dias limpos, alegres e movimentados de sua amiga, os dias de Neera se tornaram tão nublados quanto de costume, silenciosos e carregados de deveres, seus irmãos pareciam travar uma batalha contra sua mãe para que fosse mais branda, falhando miseravelmente todas as vezes que ousaram desafia-la.
    Naquele momento, a morena se encontrava estudando dialetos antigos na biblioteca principal da mansão, em suas mãos, o livro maltratado parecia esfarelar aos poucos em todas as vezes que seus dedos iam de encontro com as páginas amareladas, aqueles símbolos antigos eram tão familiares que ela poderia citar todo o livro detalhadamente, mesmo que passasse semanas sem entrar em contato com o mesmo. Izzy, por outro lado, passeava pela Vila sendo parada a todo instante por famílias, das mais nobres até as mais pobres.
    Já havia se passado uma semana desde a estranha escolha do Dragão, ela estava sendo notada até mesmo quando se esforçava para se esconder, pessoas que antes a olhavam com nojo e raiva, agora beijavam seus pés e lhe ofereciam flores, comidas, tecidos e outras coisas. Toda aquela atenção se sobrepõe a crosta que o medo havia aberto em seu peito e ela sabia disso, sabia que ele ainda estava ali, só estava sendo omitido.
    — Querida, Izzy! — cumprimentou uma jovem de cabelos loiros, olhos castanhos e pele morena — trouxe isso para você, espero que satisfaça suas exigências — com alegria e empolgação, a garota esticou seus braços mostrando que carregava uma caixa pequena e detalhada em suas mãos.
    A platinada olhou para o objeto com interesse, parecia bem feito e extremamente caro, entretanto o pegou rapidamente sem observá-lo com o cuidado necessário. Em questão de segundos ela se viu cercada por senhoras emocionadas, homens ambiciosos, jovens admirados e crianças curiosas.
    A atenção e admiração não era aquilo que ela imaginava, na verdade, aquilo era sufocante, os presentes e palavras gentis eram aceitáveis, porém, algumas pessoas faziam perguntas desconfortáveis e outras lhe tocavam de modo desrespeitoso.

    Neera organizava os livros em suas prateleiras, atenta para não bagunçar a ordem. Seus olhos percorriam as capas velhas dos livros, quase que por admirá-los como algo divino, fontes da maior parte de suas informaçõe.
    O sol já estava se pondo, os brilhantes raios atravessavam as janelas mostrando as partículas de poeira que se agitavam assim que uma brisa passava por elas. Neera sempre prestou muita atenção aos detalhes das coisas a sua volta, não por escolha, mas por necessidade. As mesas redondas espalhadas pela biblioteca são cercadas por bancos longos que as envolvem perfeitamente, as prateleiras são grandes e firmes, guardam em seu interior livros antigos com histórias das mais variadas, as janelas são largas e opacas por conta da poeira acumulada, estás permitem a visão para a floresta pacífica.
    A Monsli nunca teve tempo para apreciar outras histórias, senão aquelas referentes ao dragão, línguas antigas e modos. Sempre que entrava na sala, não tinha realmente tempo para aproveitar a vista ou até mesmo limpar toda aquela poeira, e não teria agora, entretanto, de canto de olho ela pôde enchergar uma figura branca correndo para o centro da floresta, seus olhos negros como a noite se desviaram para a direção do desconhecido e fixaram-se ali por um momento, como se sentisse que aquilo fosse importante, mas Neera é uma mulher racional, sua curiosidade terá de ser apaziguada.
    Terminando de guardar o último livro, a morena bate em seu vestido branco para se livrar um pouco da poeira, mesmo que isso só levanta-se mais ainda.

    A floresta parecia muito mais escura e hostil do que Izzy se lembrava, os galhos pareciam se fechar uns nos outros para que ela não pudesse passar por eles, atravessar aquela barreira foi uma tarefa dolorida e demorada que deixou arranhões em todo seu corpo, até mesmo em lugares cobertos pela capa preta que usava.
    —  Por que?! — exclamou a garota enfurecida e extremamente abalada. Suas vestes se desfaziam cada vez mais enquanto ela forçava sua travessia, pedaços se prenderam aos galhos quebrados — Eu nunca quis morrer! — o motivo de sua insatisfação era clara. Seus gritos não eram ouvidos por ninguém, mas no fundo ela desejava que fossem, ela não poderia desabafar com Neera, por que mesmo a morena estando a favor de sua vida, ela não entenderia seu medo e desprezo por toda essa situação.

criada para o sacrifício, feita para a caça. Onde histórias criam vida. Descubra agora