*Esse surto foi originalmente postado no spirit a milênios atrás.
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Stenio Alencar sempre foi um cara meio mimado. Filho único de pais separados, não podia dar em outra. Nunca gostou muito de dividir, mas teve que aprender na prática a fazer diversas concessões em seu casamento com Heloísa. Depois de mais de 20 anos: dois casamentos e um divórcio, ele já se considerava profissional na arte de compartilhar. Naquele ponto, ele já nem estranhava quando a morena roubava garfadas da sua refeição, ou quando ela saía para trabalhar com uma camisa social dele, cuidadosamente colocada por dentro dos jeans e claramente grande demais para ela.
Quando a Drika nasceu, ambos eram muito jovens e inexperientes e tiveram muitas dificuldades em torno da divisão de tarefas e das obrigações de cada um em relação à criança. Muitas das discussões do casal giravam em torno desse tópico. É claro que esse não era o único problema deles naquela época. De qualquer forma, teve que aprender a dividir tudo com a Drika também, seu tempo, o espaço e, principalmente, a própria Helô.
Não que algum dia ele tivesse tido alguma objeção em compartilhar cada pedaço de sua vida com a filha. A partir do momento que a menina nasceu, ele estava rendido para o resto da vida. Tinha sido, sem dúvida, uma das melhores coisas que já fez.
Casar com Helô, duas vezes, também estava nessa lista.
Ambos já tinham amadurecido muito até o momento do segundo casamento. Custou muito para ele recuperar a confiança da mulher, ainda mais depois dos conflitos envolvendo a guarda da filha. Stenio tinha sido muito egoísta naquele ponto e não mediu esforços para mostrar a ela o quanto se arrependia das burradas que fez. Quando tomaram a decisão de se casar de novo, muitas das dificuldades tinham sido deixadas para trás, com exceção daquelas que envolviam suas profissões. Mas o advogado tinha que aprender a dividir cada vez mais.
O casal não planejou ter uma segunda filha, mas dois anos depois do segundo casamento, Helô descobriu a gravidez. Num primeiro momento, a delegada era puro pânico. Stenio lembrava bem da noite em que ela lhe contou.
Flashback
O cansaço tomava conta de cada pedaço de seu corpo quando ele abriu a porta de casa naquela noite. Podia jurar que o ar gelado de julho era capaz de colorir o ambiente em uma escala de cinza que o deixava incomodado. Nem ele e nem Helô gostavam do frio. Desde os tempos de faculdade, quando se conheceram, sempre compartilharam o amor pelo verão, pelo sol e pela praia. Por isso mesmo, suas viagens sempre envolviam esse tipo de programa.
Enquanto fechava a porta, permitiu se deixar aquecer pelo calor das lembranças de seus passeios por Búzios e pelas praias paradisíacas das luas de mel. De cara, estranhou o silêncio pesado que pairava no ar da sala de estar, andou pela casa e não encontrou nenhum sinal de Helô. Era estranho demais que àquela hora da noite ela ainda não tivesse chegado, mas também não era impossível. Descartou o terno e a gravata que usava, pegou o telefone já discando para ela e foi em direção ao banheiro tomar um banho.
