28; Firefly

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The evil it spread like a fever ahead
It was night when you died, my firefly
What could I have said to raise you from the dead?
Oh could I be the sky on the Fourth of July? (...)

Fourth of July by Sufjan Stevens.

O mal se espalhou como uma febre à frente
Já era noite quando você morreu, 'minha vaga-lume
O que eu poderia ter dito para 'ressuscitá-la dentre os mortos?
Oh, eu poderia ser o céu no Quatro de Julho? (...)

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[Aviso de gatilho: menção de suicídio, estupro, luto, aborto e depressão. Se qualquer uma das coisas descritas o/a deixa desconfortável sinta-se livre para ignorar este capítulo/fanfic.]

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Quantos sentimentos uma pessoa era capaz de sentir? Ou melhor, quantos deles eram passíveis de ser digeridos?

Eu não sei assim como não sei de muitas coisas e assim como, até então não sabia mas soube logo que meu cérebro processou minimamente o que saiu da boca de Sun mais cedo, eu não queria saber o que aconteceu com Heaven.

Todos nós temos certa participação na vida das pessoas que nos rodeiam ou um dia nos rodearam; minha participação na vida de Heaven, tudo o que eu fui para ela e tudo o que ela é para mim apenas diz respeito a nós mesmas.

Portanto, tudo o que devia saber sobre a história do fim dela já sabia. Queria ter parado no suicídio e na perca do nosso bebê porque isso era tudo o que me cabia.

Uma parte de mim grita que é egoísmo.

Egoísmo querer apagar o estupro que ela sofreu, a briga acalourada com a irmã dela e tudo aquilo que a sucumbiu a sua escolha por findar aquilo que a ela foi dado mas... Quantos sentimentos uma pessoa é passível de digerir?

Meu psicológico estava transtornado, meu coração tão apertado que me ocasionava um fôlego muito curto, minha garganta dolorida, meu estômago revirava a cada segundo. Sentia cada parte do meu corpo ao mesmo tempo que as sentia dormentes.

Heaven me causava tanta dor que chegava ao ponto de questionar se um dia ela foi uma pessoa, alguém de verdade, alguém que de fato dividi minha vida. Se ela sequer existiu porque fazia tanto tempo que tudo o que sentia associado a mesma era dor que a memória do sentimento sereno e doce que vagamente me recordava de ter ao lado dela parecia agora tão distante, tão embaçado.

No começo tinha raiva do mundo inteiro: Como os dias continuavam passando? Como ainda existia o Natal? Como as pessoas viviam? Eram perguntas recorrentes na minha mente porque eu estava quebrada demais para seguir em frente.

Eu estou quebrada.

Existe solidão, medo, desespero e tristeza correndo junto ao meu sangue. Eu sou tão triste que todas às lembranças boas, com ou sem Heaven, são embaçadas junto a tudo que me cerca. Tão triste que não sobrou nada além da melancolia.

Eu não quero ser triste.

Meu corpo inteiro clamava por Heaven, só mais uma vez, queria lembrar como era a tocar e sentir sua pele quente, sua respiração, a ponta dos seus dedos correndo pelo meu rosto ou qualquer lugar que ela pudesse tocar, queria sentir o corpo dela esmagado contra o meu só mais uma vez.

Eu não conseguia mais lembrar dessas sensações, não tinha nada para me segurar e continuava constantemente em queda livre no nada.

A27. A27. A27.

Era tudo que minha cabeça ecoava em um certo momento das longas e longas horas dirigindo.

— BILLIE! — Finneas pega em meu braço me forçando a parar de andar, interrompendo meu percurso ao meu carro até então no estacionamento do tribunal.

— Me deixa. — Digo direta puxando meu braço de seu leve aperto.

— Você não pode digirir desse jeito! — Maggie se intromete visivelmente preocupada pois gesticulava de maneira afoita. — Não tem condições nenhuma de pegar um carro! — Continua.

— Billie. — Maeve chama naquele tom de voz recorrente regado com uma meiguice que transbordava da sua voz pelas suas feições, sua mão se estendia em minha direção lentamente se aproximando de mim.

— CARALHO! ME DEIXEM EM PAZ! — Me afasto bruscamente do quase toque que recebi da mesma. — Por favor. — Sussurro. Minhas sobrancelhas me traiam se franzindo em tamanha dor. — Eu preciso de um tempo. — Murmuro antes de me virar e continuar meu caminho até o carro.

Estaciono o carro de qualquer jeito na frente da casa de campo conhecida por mim, saio do mesmo e adentro a propriedade.

Observo o A27 que demarcava a numeração da casa, esta completamente fechada e escura, antes de ignorá-la e adentrar os equitares de terra que a compunham.

Caminho por longos minutos. Era uma noite quente e estrelada, nada mais era ouvido além do som produzido pelos grilos.

Após muito caminhar paro exatamente no local onde Maeve e eu nos sentamos para fumar maconha no final de semana ao qual fui convidada, sento ali e ergo a cabeça encarando o céu.

Observava a imensidão estrelada que tão bem descrevia meu interior se menosprezarmos às estrelas.

Alguns novos quentes rastros feitos pelas lágrimas que deixavam meus olhos foram recriados. Não era um choro barulhento e nem silencioso pois continuava puxando o ar sempre que meu corpo achasse necessário.

— Sinto muito. — Sussurro. — Eu sinto tanta saudade. — Digo em voz baixa ainda sem desgrudar meu olhar do vasto céu estrelado. — Eu te amo tanto Heaven. — Declaro deixando minha cabeça ceder enquanto o choro se intensificava, minha testa se apoia em meu joelho como suporte. — Eu estou esquecendo Heaven, por favor, não me deixa esquecer. Por favor, por favor, por favor. — Murmuro devagar escondendo meu rosto com as mãos.

Escutei ao longe um carro estacionar e um suspiro trêmulo deixa meus lábios antecipando que todo mundo viria para cima de mim tentar me convencer a ir embora mas nada veio.

Após bons minutos passos calmos sobre a grama nublou levemente o estridular.

Ergo meu rosto minimamente encontrado Maeve que me encara de volta e nada diz, sua feição estava impossível de ser lida, não tinha nada.

A observo cuidadosamente se agachar de frente para mim, seu perfume estava forte apesar da essência ser suave, não era como nada que havia sentido antes mas não era estranho ao mesmo tempo.

Lentamente a mesma se aproxima ocupando o espaço vago entre meus joelhos e de um forma cautelosa cede seu peso contra o meu me abraçando e se aninhando contra mim.

Ficamos paradas por um momento até Maeve erguer o rosto e deixar um beijo sobre a minha bochecha, quando meu olhar acha o dela seus lábios se curvam para cima e uma lágrima solitária escapa de seu olho direito, antes que eu pudesse fazer ou falar qualquer coisa seus lábios estavam contra os meus.

Aquele perfume me embriagava e antes mesmo de processar meus dedos correram pelos cabelos de Maeve e sua língua retribuia minhas investidas até que ficássemos sem oxigênio.

E assim que nos afastamos ela sorriu para mim e sem dizer nada apoiou sua cabeça em meu ombro. Um suspiro deixa meus lábios e ergo minha cabeça voltando a encarar o céu.

A respiração ritmada e o leve ressonar que Maeve fazia contra o meu pescoço denunciava que havia adormecido.

De repente eu lembrava, lembrava como era beijar Heaven e um vaga-lume voou para longe de mim e da garota em meus braços.

Astronomy [Season 2] • Billie Eilish [G!P]Onde histórias criam vida. Descubra agora