Tardes de Outono

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*AVISO GATILHO:
Violência infantil*

PERSONAGENS:

Matias: Mato Grosso do Sul
Miguel: Minas Gerais
Marta: Mato Grosso

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*Estalo*

- Você me ouviu? - O estalo de chicote podia ser ouvido - Responde pivete!!!!

-Sim pai...- Lágrimas se formavam no canto dos seus olhos mas o garoto as segurava com valentia. Nos braços e pernas marcas vermelhas e arroxeadas podiam ser vistas.

-Um homem não deve chorar- sua voz grossa fazia o corpo do menino gelar, o hálito do velho exalava bebida.- Você não é um baitola me ouviu? Amanhã você vai aprender a montar o cavalo! Sua irmã é uma garota e aprendeu primeiro que você!

*outro estalo*

Era um chicote, um maldito chicote para cavalos.

Sua visão estava vermelha, não sabia se pela raiva que queimava em sua garganta ou se pelo sangue de alguma ferida em sua cabeça. A bochecha do garoto latejava e ele apenas abaixou a cabeça em sinal de obediência.

Após a morte de sua mãe, o pai, que já era severo, havia ficado ainda pior. O pai passava o dia bêbado e maltratava o filho.
Toda a vida de Matias girava em torno da fazenda e de seu pai. Tudo já estava planejado e definido. E ele era apenas uma criança, uma criança de 10 anos que não podia brincar (brincadeiras eram coisa de mariquinha).

Sua irmã por sua vez, talvez por lembrar sua falecida mãe, era protegida e paparicada. Matias não a culpava, é claro. Embora recebessem tratamentos diferentes, sempre que Matias se machucava, era Marta que corria para tratar suas feridas. Mas ele sempre a rejeitava por medo de reprimendas de seu progenitor.

Após ser deixado sozinho na sala, sua irmã entrou correndo com a caixinha de primeiros socorros:

-Aquele idiota te bateu novamente?- Ela se abaixou e analisou o rosto ferido do irmão.

- Não o chame assim- Matias empurrou as mãos da irmã- Ele pode te ouvir...

- Irmão... Me desculpe, se eu pudesse eu...

-Não tem nada haver com você...

-Um dia, vou ganhar muito dinheiro e te tirar daqui!- Ela disse com os olhos vermelhos.

Mas o garoto já havia lhe dado as costas e corrido para fora de casa.

Ele andou sem rumo pela fazenda, temendo que sua irmã visse as lágrimas que ameaçavam cair.
Ele era macho, ele tinha que crescer forte para cuidar de sua irmã...
Ele tinha que aprender a cavalgar...
Ele tinha que ser o melhor...

No alto da colina, debaixo de uma velha árvore ele fungou...
"Deus me ajude..."

-Ocê quer manga?-Uma voz infantil disse do alto.

"Deus...tá me oferecendo manga?"

-Essa aqui tá docinha... olha que trem bão e docinho...

Matias olhou pra árvore e se deparou com um menino sorrindo sem um dos dentes da frente. Ele estava descalço, usava uma jardineira suja de terra e tinha o rosto todo sujo de manga.

-Meu nomi é Miguel e o seu? Ocê tava chorando?- O menino pulou do galho da árvore com bastante habilidade.

-EU NUNCA CHORO!- Matias cruzou os braços em desafio.

Menino Dos Pés Descalços Onde histórias criam vida. Descubra agora