03. Espátula de Ouro

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Já era fim da tarde quando Edu chegou em frente ao imponente prédio da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre. O céu misturava-se em tons de violeta com nuances alaranjadas quando Eduardo olhou orgulhoso para o edifício de cinco andares, cravejado com extensas fileiras de janelas espelhadas distribuídas de maneira uniforme.

Mesmo depois de passar o dia inteiro desbravando a cidade em busca de emprego, Edu sentia que ainda não havia passado por seu maior desafio ainda, não até aquele momento; seu coração batia fora de compasso ao encarar a personificação de seu maior sonho, bem em frente aos seus olhos. Não conseguiu segurar o sorriso de orgulho, que se misturava com o buraco em seu estômago, que naquela altura não daria para saber ao certo se era fome ou medo. Talvez fosse um pouco dos dois, mas não havia nada naquele instante que Eduardo quisesse mais do que dar seu primeiro passo rumo à concretização daquela nova fase de sua vida.

Se misturando entre os outros alunos, calouros e veteranos, Eduardo seguiu pela entrada principal e se sentiu vislumbrado com a beleza no interior do prédio: a modernidade das instalações, a agitação dos estudantes, os diversos estilos de pessoas se misturando em um só lugar, sem motivo de olhares e de perguntas... Tudo aquilo era uma fascinante celebração à vida para Edu, que sempre foi acostumado com a tranquilidade e a discrição de uma cidade do interior, onde ser diferente era totalmente fora de cogitação. De repente, seu coração se sentiu em casa.

Procurou sua sala no mural da entrada do seu bloco e costurou entre a pequena multidão em direção às escadas. Conforme subia cada degrau, refletia como que, apesar de imaginar aquele momento todos os dias nos últimos anos, nunca poderia saber a real sensação de estar tão próximo daquilo que sempre almejou. Ao entrar na sala, guardou seu lugar próximo à janela e se sentou, observando discretamente enquanto seus colegas de turma chegavam, um a um. Em determinado momento, se deu conta de que a faculdade parecia muito com uma escola, mais do que ele imaginava. Edu esperava pelo sinal de início das aulas, mas se deu conta que aquilo não existia na faculdade e sorriu de si mesmo; se sentia como um verdadeiro caipira.

O pensamento se dissipou ao ver o primeiro professor cruzar a porta, usando calça social xadrez, polo preta e um óculos com armações redondas que automaticamente lhe deixava com um aspecto simpático. Edu não deixou de notar, também, que em sua mão esquerda, carregava uma espécie de troféu dourado em forma de espátula, grudada em uma base preta com alguma coisa escrita, mas estava longe demais para que Edu conseguisse enxergar com clareza.

- Boa noite, turma! Me chamo Conrado, serei o professor de vocês na aula de História da Gastronomia. Eu sei que a parte de se apresentar e dizer a idade, signo e o que fizeram durante as férias é um mico, por isso, eu criei uma tradição muito mais descolada para os primeiros dias de aula. Não sei se vocês checaram o e-mail nas últimas duas semanas – eu acredito que não, pois férias e e-mail não combinam na mesma frase, mas eu espero que tenham checado – pois eu mandei um material curto para fazermos uma dinâmica de grupo, ou, como vocês preferirem chamar, gincana. Serão grupos pequenos, assim dá pra cada um se conhecer melhor e decidir quais vocês vão amar e quais vão odiar, e cada grupo vai escolher seu representante para correr até o começo do auditório, apertar o botão imaginário no centro da mesa e responder as perguntas que eu extrai do texto que está na caixa de entrada de vocês.

De repente, o silêncio abismal havia se alastrado pela sala tão rápido quanto a animação de Edu para o primeiro dia havia ido embora. Atreveu-se a olhar em volta, e a devastação era quase unânime nos rostos antes tão cheios de vida de seus recém-colegas. Conrado tirou uma breve pausa para absorver o caos que havia instalado na turma, e prosseguiu, satisfeito:

- Por que tantas caras pálidas assim de repente? Gincanas são legais, tanto que, pra premiar o grupo vencedor, teremos o troféu Espátula de Ouro, no qual vocês terão que decidir entre si quem vai levar pra casa, pois a verba não permitiu fazer mais que um. E pra provar que eu sou muito bonzinho, podem formar 3 grupos de... — Conrado parou alguns segundos para contar a quantidade de alunos, enquanto Edu percebeu que definitivamente a faculdade era igualzinha a escola — seis alunos.

Os Garotos do Apartamento 13Onde histórias criam vida. Descubra agora