01. Até Breve, São Valentim

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Eduardo colocou o último livro dentro da caixa. Seu quarto estava vazio, com todas as lembranças dos últimos dezoito anos encaixotadas e prontas para partir. De repente, parou e se permitiu dar uma boa olhada ao redor. Mal podia acreditar que aquele dia havia chegado. Suspirou ao sentir outro frio na barriga, apenas mais um dos vários que havia sentido na última hora. E embora eles estivessem presentes o tempo todo - especialmente com o passar da última semana - aquilo era algo que ele jamais se acostumaria.

"Estou indo para Porto Alegre. Definitivamente." - Pensou, enquanto segurava um riso frouxo em seus lábios.

Suas duas malas estavam prontas próximas à porta. Levou-as desajeitadamente até a ponta da escada, onde avistou sua mãe a alguns metros, próxima da porta da sala. Helena olhou para seu filho caçula com os olhos marejados.

— Mãe, a gente prometeu que não íamos chorar.
— Eu sei, eu não estou chorando. — Ela disse enquanto passava as costas da mão nos olhos.
— Eu odeio esse clima de despedida.
— Eu também, meu filho. Mas quero que saiba que essa casa sempre vai ser sua. Se um dia você quiser voltar, não importa a hora, estarei aqui por você.

Eduardo olhou de forma amável para sua mãe antes de abraçá-la. Seu peito afundou um pouco mais, sentindo a garganta se fechar repentinamente. Reforçou a promessa de não chorar em sua mente e se manteve forte, como havia combinado.

Ao sair para o quintal, Edu avistou Felipe com as costas na porta do Mustang, os braços cruzados, conversando com Paulo. Subitamente, o medo havia diminuído. A imagem do amor de sua vida embarcando naquela aventura lhe deixava um pouco mais calmo. Saber que não estava sozinho lhe deixava menos aflito. Naquele instante, sabia que, se estivesse fazendo tudo aquilo por conta própria, sem Felipe, seria dez vezes mais difícil. Talvez não conseguisse fazer, até. Era a primeira vez que o medo se sobressaía em relação a seus sonhos. Era uma sensação que Edu gostaria de afastar para o mais longe possível.

— Tudo pronto? — Paulo perguntou, quando recebeu uma resposta afirmativa de seu filho. — Vou lá em cima buscas o resto das coisas, então. Você me acompanha, Edu?

Eduardo acomodou suas bagagens no porta-malas do carro, seguindo Paulo até seu antigo quarto. No segundo andar, cada um carregava uma caixa de papelão fechada, sem saber muito bem o que dizer um ao outro. Se despedidas já eram difíceis para Helena, para Paulo era ainda pior. A única diferença entre eles era a forma como conseguiam disfarçar.

— Edu, não vou te dar o típico sermão que seria esperado numa hora dessas, até porque eu confio em você e sei o quão responsável você é. Mas eu quero que me prometa uma coisa. Apenas uma coisa.
— Pode falar, pai.
— Que vai se cuidar naquela cidade. Nunca se esqueça que viveu sua vida inteira em São Valentim, e que Porto Alegre não se parece nada com o que você está acostumado.
— Eu prometo. E eu quero que o senhor me prometa que vai continuar se cuidando. Vá em todas as reuniões do AA, se mantenha firme no seu propósito.

Era estranho para Paulo ter que prometer algo para seu filho. Mas, por sorte, demonstrar vulnerabilidade era algo que ele já estava se acostumando.

— Eu prometo.

Desceram e guardaram o restante das coisas no banco de trás do Mustang, já abarrotado com as coisas de Felipe. Era uma manhã ensolarada no fim de março. As Tipuanas balançavam ao ritmo do vento enquanto algumas folhas caíam ao longo da extensa calçada. Edu olhou para seus pais e soube que o momento havia chegado. Era hora de partir em busca de seus sonhos. Abraçou forte sua mãe, já com saudades.

Os Garotos do Apartamento 13Onde histórias criam vida. Descubra agora