Memória em azul

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Memórias em Azul

É engraçado como me lembro de 11 anos atrás como se fosse ontem, quando eu ainda era pequenina e tinha uns oito anos
Era uma garotinha com os dias contados para ir ao exército. Você deve estar achando estranho uma criança ser levada dessa maneira. Mas, a explicação é que fui vendida, por ninguém menos que os meus pais. Nós morávamos em um vilarejo e não tínhamos muito dinheiro e, isto, os beneficiaria muito. Não fui e nunca seria uma criança normal.
Porém, tudo mudou dois dias antes do exército cobrar a minha presença no batalhão, quando todos começaram a comentar sobre o fantasma de Gostime, uma aldeia bem pequena que poucos ouviram falar.
De repente, a mesma ganhou visibilidade por conta de um "pequeno grande" acidente. Ninguém sabia o que tinha acontecido e nem sequer poderiam descobrir. Todos os que entravam não conseguiam sair e, com isso, pararam de tentar. Foi naquele momento o qual reparei que quem causara tudo aquilo poderia ser como eu.
E para quem não está entendendo a história: Eu sou Jack, uma garota com poderes. Controlo, especificadamente, o elemento da terra. Não consigo fazer plantas germinarem, mas sou capaz de forjar armaduras. Além de eu ter uma força um pouco sobrenatural, minhas armas favoritas são os punhos de pedra.
E ,voltando à história, foi nesse momento em que eu percebi que se alguém poderia passar por aquela tempestade de névoa e gelo que envolvia a aldeia era eu. Então, assim que fiquei sabendo arrumei as minhas coisas e sai de casa. Fugi de meu vilarejo e de todos que lá conhecia. Nunca sentiria falta daquilo e até hoje não sinto o mínimo remorso.
Para chegar em Gostime levou aproximadamente um dia e ,assim que cheguei, nem se quer pensei duas vezes ou dei espaço para o medo, coloquei a minha armadura de pedra e me aventurei naquela tempestade. Uma pessoa normal com certeza não seria capaz de andar por lá como eu. O vento era extremamente forte, com certeza todos seriam carregados e ficariam gritando de olhos fechados, fazendo com que não conseguissem ver o que havia lá dentro. Ao decorrer da trajetória pude perceber que este muro que a tantos assombrava não era formado somente por névoa e gelo, mas também por memórias, assemelhando-se a um filme com um roteiro desordenado que com esforço conectei coerentemente seus aspectos e mensagens. Neste, notei que o que havia causado tudo aquilo realmente era como eu.
Vou contar a história do Monstro da neve, nome que aquela aldeia determinou para uma garotinha que acabara de nascer. Na verdade, ela não portava um nome porque a mãe não teve o trabalho de colocar, e foi nesta ocasião que os aldeões lhe deram esse apelido. No momento em que ela nasceu, era como se o ódio tivesse sido implantado imediatamente por toda cidade. Com o tempo, seus poderes de gelo, os quais não conseguia controlar, acarretaram em incidentes onde a criança passou a andar pela aldeia e congelar as ingênuas plantações que eram a única coisa que impedia a região de passar fome. Assim, isso acabou sendo a gota d'água para todos.
Foi então que os aldeões se uniram para acabar com toda aquela bizarrice, onde milhares de tochas foram acesas iluminando a aldeia composto de tons de cinza. A pequena teve que sair correndo quando atearam fogo em sua casa. O desespero da garota transbordava pelos seus olhos, e o mesmo fazia com que seus poderes saíssem cada vez mais do controle. Não importava onde ela pisasse ou tocasse tudo congelaria.
Então, se encontrou cercada por todos aqueles aldeões furiosos que buscavam uma solução drástica para seus problemas. Rancor e desprezo motivavam cada um daqueles verdadeiros monstros. Enquanto se aproximavam, mais a então "aberração" se encolhia e começava a chorar desenfreadamente. Com isso, o seu poder mostrou-se ser mais destrutivo do que qualquer um imaginaria, e um por um de todos que estavam presentes foram sendo mortos e congelados até a última gota de sangue.
Quando tudo parecia estar perdido para a menina, do meio daquela multidão de estátuas surgiu um rosto conhecido e acolhedor: sua mãe havia acabado de chegar e por isso não tinha sido congelada. A mulher desesperada se ajoelhou no chão e abriu os braços implorando para que a filha corresse e pulasse neles, e assim aconteceu: a menina saiu correndo e pulou nos braços reconfortantes de sua mãe, a única que poderia transmitir o mais sincero e puro carinho, mas de repente ela já não tocava mais em uma pele quente e nem em uma roupa macia, agora só lhe restava gelo.
Quando a criança percebeu se afastara com os olhos cheios de terror e tristeza, mas quando deu o primeiro passo para trás, percebeu que novamente ela estava encurralada, entretanto, agora, estava entre sua mãe e uma navalha.

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