O sol esquentava meu braço e, com o rosto apoiado na mão preguiçosamente, eu utilizava a mão livre para deslizar o lápis pelo papel, fazendo curvas e interligando linhas. Apesar do professor estar falando ativamente na frente da turma, já havia uma série de minutos que eu havia deixado de escutá-lo e passado a prestar atenção apenas no meu desenho. À medida que eu chegava nos últimos detalhes, começava a desenhar mais lentamente para observar o resultado.
Encarei as costas da garota com uma mão em chamas e a outra segurando uma espada. O que eu deveria colocar de fundo? Deveria deixar daquela forma? Já havia bastantes elementos? Encarei o cabelo preso em um rabo alto e que ia até a metade das costas, imaginando o desenho coberto por cores. É, me parecia bom. Apenas uma cor dando textura ao fundo seria suficiente. Dei um leve sorriso, contente com o meu trabalho.
Suspirei, e coloquei o lápis ao lado da bolsinha. Não devia faltar muito para a aula acabar. Encarei o professor para poder me situar no que ele falava, mas me surpreendi com um quadro que estava quase completamente coberto de anotações.
— O quê? — Falei de olhos arregalados, que utilizei para observar toda a sala. Todos os alunos em silêncio, alternando o olhar entre o quadro e seus cadernos, copiando o que o professor escrevia. Quando ele havia parado de falar?
— Voltou para a terra agora, Maria? — O professor, sem se virar, chamou a minha atenção. No silêncio, minha voz havia se sobressaltado e alguns alunos olharam para mim. Uns viram minha cara surpresa, riram e voltaram para os seus afazeres. Eu constantemente me perdia nos meus desenhos e escritos, e todos os professores já estavam acostumados com a minha distração após verem que era impossível me consertar.
Além disso, eu não atrapalhava ninguém, e isso era tudo que eles desejavam.
Peguei o celular no bolso e tirei uma foto do quadro o mais discreta que conseguia. Guardei meu desenho na pasta que seus semelhantes estavam, e retirei o caderno da mochila. Com a caneta na mão, comecei a copiar adoidada para alcançar o professor e os outros.
O sinal não demorou a bater. Todos já haviam terminado e começaram a sair. Novamente, retirei o celular para tirar foto do quadro que, dessa vez, tinha as instruções para um trabalho. Só que com todos os corpos bloqueando a visão, tive que esperar que saíssem. Quando pôr fim a minha visão estava livre, metade do escrito estava borrado e inteligível. Marcas de dedos no pó de giz mostrava ser obra de algum engraçadinho.
O professor não estava mais na sala, indisponível para que eu o questionasse sobre as especificações do trabalho. Maravilha.
— Atrasou de novo, foi? — Quando olhei para trás, vi Júlia sentada na sua cadeira, as pernas sobre a mesa e olhos fixos no celular. Com cabelos escuros, jeans preta e delineado felino, seu estilo era uma mistura de descontraído e feroz, como um gato que te arranharia se chegasse muito perto e balbuciasse as palavras erradas.
Júlia era quieta, calada e vivia daquela forma: no celular — que, inclusive, devia estar bem interessante naquele momento para que ela preferisse ficar ali a ir embora.
Fui surpreendida com uma vibração do meu celular na minha mão.
— Te enviei uma foto do meu caderno. De nada.
Ela se levantou e colocou a mochila nas costas. Seus olhos perfeitamente delineados desviaram para mim e ela me deu um sorriso e uma piscadela, antes de caminhar para fora da sala.
— O-obrigada — agradeci, gaguejando por um motivo incerto. Ela havia me cantado? Eu devia estar vendo coisas.
Bom, pelo menos agora eu tinha as informações sobre o trabalho e podia ir embora em paz. Coloquei a mochila nas costas e deixei a sala vazia.
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Ramona - de um outro mundo nasce uma heroina
FantasiaSer superheroina era o sonho que Maria tinha e não sabia. Não sabia até sua vida tomar um rumo totalmente inesperado, e ela se ver vivendo em duas realidades: um em que era uma estudante comum do ensino médio - e outro em que salvava pessoas das gar...