Los Angeles, 2006
Naquela noite, me encolhi no meu casaco de pelo falso que mamãe comprou em uma loja de esquina e olhei para o céu negro, que toda hora era iluminado pelos trovões como se estivesse prestes a desabar sobre as nossas cabeças sem piedade. As gotas de água batiam na janela do carro como se implorassem para entrar. Olhei para a minha mãe sem entender por que tínhamos que sair de casa tarde e naquela tempestade, mas ela parecia tão nervosa que fiquei com medo de que gritasse comigo.
Lydia estava sentada na cadeirinha ao meu lado lutando contra o sono que queria envolvê-la a qualquer custo. Segurei sua mão esquerda enquanto a pequena coçava os olhos com a direita, a cabeça pendendo para o meu lado ao mesmo tempo em que se dava por vencida lentamente e me lançava um sorriso murcho, antes de seu rosto ficar sereno e ela, finalmente, dormir.
Mamãe tinha nos tirado da cama no meio da madrugada e dito que iríamos dar um passeio. Ignorei a sensação ruim que passou pelas minhas costas enquanto me vestia e a via colocar a roupa em Lydia. Hoje eu sei que o nome para a sensação ruim é frio na espinha porque algumas vezes nosso corpo consegue prever certas coisas ruins que estão prestes a acontecer com a gente.
Outro trovão soou e minha irmã se assustou, mas logo fechou os olhos novamente para voltar a dormir.
Observei nossa mãe com a mão no volante, ela o segurava com tanta força que seus dedos estavam brancos. Parecia estar em guerra consigo mesma, tive vontade de colocar a minha mão em seu ombro e dizer que tudo ficaria bem.
Só que eu tinha a vaga sensação de que nada ficaria bem.
Perdi as contas de quantas vezes eu me encolhi por causa dos trovões e quantas ruas mamãe virou até parar na frente de uma pequena galeria. Ela me olhou pelo retrovisor e ficamos paradas apenas nos encarando pelo que parecia uma eternidade. A mais velha sempre foi muito expressiva, dava para ver em seus olhos quando sentia qualquer coisa, mas, principalmente, quando estava feliz. Fazia alguns dias que eu via apenas suas expressões felizes, porém, naquele momento, aparentava estar com medo, uma expressão rara para ela.
— Tudo bem, mamãe? — Arrisquei perguntar.
Observei a mulher com cabelo loiro acobreado recém pintado e um bronzeado evidentemente falso fungar balançando a cabeça para frente e para trás, assentindo de forma exagerada. Os olhos dela se desviaram para Lydia e eu acompanhei seu olhar, vendo minha irmã dormir. Minha mãe soltou um suspiro longo e abriu a porta do motorista sem se importar com a chuva, deu a volta no carro e abriu a porta perto da mais nova.
— Saia do carro, Lindsay — mandou enquanto abria a cadeirinha da minha irmã, a acordando no processo.
E, outra vez, senti algo ruim nas costas.
Saí do veículo me encolhendo ainda mais dentro do casaco. Mamãe segurou primeiro a mão de Lydia e depois a minha, caminhando conosco na direção da galeria a passos rápidos.
— Mamãe, o que estamos fazendo aqui? — perguntei, caminhando exatamente ao lado dela e a encarei. Ela respirou fundo.
— Viemos dar um passeio. — Franzi o cenho sem entender por que esse passeio tinha que ser tão tarde.
Depois que nosso pai morreu, nossa mãe não fazia passeios frequentes com a gente, apenas quando éramos muito insistentes no assunto. E vinham antecedendo um castigo. Então era de se estranhar que ela resolvesse sair com a gente no meio da noite para um passeio, principalmente porque não tínhamos insistido em sair.
Quando chegamos na entrada da galeria, a mais velha parou e eu a olhei ainda mais confusa conforme sua mão se desprendia da minha como se ela estivesse queimando a palma da dela, observei enquanto minha mãe repetia o gesto com Lydia.
— Ahn... eu esqueci algo no carro, me esperem aqui. — Foi tudo o que disse sem ao menos nos olhar direito, se afastando lentamente.
Me aproximei da minha irmã, segurando sua mão, enquanto observávamos nossa mãe fazer o caminho de volta para o carro sem ao menos olhar na nossa direção. Naquela noite, Lydia tinha três anos, eu tinha nove e foi a última vez que vimos a mulher que chamávamos de mãe.
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Lux
Romance⚠️ DISPONÍVEL NA AMAZON E NO KINDLE UNLIMITED ⚠️ Lindsay Daves é uma estudante de medicina forçada a trabalhar aos fins de semana como Skylar, a prostituta mais requisitada da boate Lux. Apesar de odiar o que faz, se nega a denunciar a exploração qu...