5 - A FOTÓGRAFA

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Está tarde ou cedo da madrugada.

São duas da manhã e eu não consegui dormir porque pela primeira vez em meses, Jordan tem alguém em sua residência e a boa notícia é que eles não trocaram carícias e beijos, então a possibilidade do cara do outro lado da rua ser gay está oficialmente descartada. Aos meus pés tem quatro garrafas de vinho (fiz questão de pegar mais vinho por garantia),  a taça está cheia em minha mão esquerda, o binóculo na mão direita e meu celular descansando no parapeito da janela.

Até agora tudo o que sei é que a visita que chegou na casa de Elliott aparenta ter uns sessenta anos. Ele é careca, baixinho e fora de forma. Seu terno cinza parece apertado demais e longe de ser confortável.

Os dois conversam tranquilamente na sala do primeiro andar, bem de frente para mim. Agradeço pelas paredes de vidro e pelas luzes acesas me proporcionando vista VIP.

O que seria de mim sem essas paredes de vidro e sem o exagero de luzes acesas dentro de sua casa?

Também sou grata por esse binóculo que me proporciona uma vista do seu lindo rosto bem de perto. A melhor parte da arquitetura da sua casa de vidro é que quem projetou, deixou no andar de cima a sala que hoje ele está usando pela primeira vez, a academia e a varanda que também faz parte da sua sala do andar de cima.

Mas como tudo tem dois lados, a pior parte é que o quarto dele provavelmente fica do outro lado da casa porque infelizmente não tenho acesso a vista da sua cama. Seria bom demais para ser verdade.

Ter a visão de Elliott acordando pela manhã.

Será que ele dorme com roupas ou pelado? Temos mais uma questão para resolver.

Deixei todas as luzes da minha casa apagadas e apenas a suave luz do poste e a iluminação da própria casa do Jordan entram pela minha janela. Não me dei o trabalho de fechar as cortinas, ele também nunca faz isso com as dele, então estamos quites. Se ele me vir, será apenas a minha silhueta, exceto quando vem um relâmpago, aí sim é possível me ver bem por causa da luz forte.

Levanto do parapeito da janela e fico de pé apreciando a beleza de Elliott vestido em um conjunto de moletom preto como quase sempre. A neblina suave  sobrevoa toda a rua. Uma noite sombria e fria demais para uma mulher solitária. Se não fosse por ele do outro lado, eu certamente morreria de tédio.

É triste parar para pensar no quão fodida minha vida é, a ponto de eu preferir viver a vida do homem do outro lado da rua ao invés da minha própria. Depois que James se foi, tudo que me sobrou foi uma livraria estagnada e esta casa tão silenciosa que faz meus tímpanos doerem.

Essa casa me faz sentir como se eu estivesse presa dentro de um buraco vazio, escuro e muito silencioso.  As paredes dela me sufocam, às vezes me esmagam. É por isso que evito ficar sóbria.

O álcool anestesia a dor.

Sou uma fodida quase-alcoólatra dona de uma vida inútil.
É como se nada fizesse sentido depois dele.

Já li muitos livros, mas nunca tive coragem de ler a respeito dos males que a dependência emocional pode causar em uma pessoa.  Mas sei que são muitos. Porque em mim há infinitos males deixados por James, e ele sequer sabe disso.

No início, achei que iria superar rápido. Dereck costumava dizer que um dia a ausência de James se tornaria uma lembrança distante, e que, ao encontrar um novo amor, a ferida que ele deixou para trás seria curada. No entanto, agora percebo que algumas feridas demoraram a cicatrizar, e você simplesmente precisa se acostumar com a dor e com a solidão que a acompanha.

A dor, essa sensação maldita que me atormenta noite e dia, incessantemente, de maneira constante e fria.

A dor.

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