Prólogo

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As folhas farfalhavam com a brisa primaveril. O sol aquecia a grama na qual Emalie pisava com seus pés descalços, rodopiando ao carregar uma cesta de amoras e morangos que colheu no bosque.

Seu cabelo azul-cobalto esvoaçava em ondas como um lindo oceano. Sua risada alegre de criança ecoava entre as árvores esguias da floresta perto do chalé de sua família.

O dia parecia como um sonho dos quais Emalie pouco se recordava ao despertar pela manhã, esfregando seus olhinhos escuros com pupilas mais dilatadas do que as de sua mãe e seu pai. Mas um choro distante dançou com o vento e alcançou a garotinha, que parou de rodopiar e cantarolar para prestar atenção.

Seu coração pequeno, mas cheio de empatia se contorceu com o sofrimento daquele som e ela se pôs a tentar desvendar sua direção. Seguiu o som incessante por entre as árvores, adentrando a floresta cada vez mais fundo. O que sua mãe desaprovaria. Ela não pensou nem por um segundo na desaprovação de sua mãe e muito menos se seria castigada se fosse descoberta, tudo que desejava era cessar com aquele choro que fazia seus ossos doerem.

Ajeitou a alça da cesta em um dos braços e com suas pequenas mãos segurou a saia de seu vestido, a tirando do caminho de seus pés que afundavam na grama e na terra que se infiltrava entre seus dedos.

Ao longe, depois de caminhar por alguns minutos, Emalie enxergou um garotinho que aparentava ter sua idade sentado na grama. Ele abraçava as pernas e chorava contra os joelhos. A garota parou, observando a figura curiosa poucos passos adiante.

Os cabelos bagunçados e espetados do garotinho eram tão claros quanto grãos de sal. Suas vestes estavam longe de se assemelharem ao trapo que o vestido de Emalie era, o que a fez se empertigar e o analisar.

Mas foram as orelhas pontudas que lhe chamaram mais atenção.

Ela tocou as próprias orelhas e com espanto constatou que aquele garotinho não era normal. Antes que pudesse continuar a varrê-lo com os olhos em busca de mais singularidades, ele levantou o rosto assustado e seus olhos alcançaram os dela.

Ambos ficaram paralisados por alguns instantes. Nenhum dos dois teve coragem suficiente para dizer alguma coisa ou até mesmo fugir.

Depois do que deveriam ser dois minutos assim, Emalie inclinou um pouco sua cabeça, agora analisando aquele rosto tão distinto do que estava habituada.

Assim como o cabelo, suas sobrancelhas e cílios eram claros. Os olhos maiores com pupilas dilatadas e íris acinzentadas. Pelos extremamente claros ao ponto de serem quase transparentes se encontravam por todo seu rosto, dando uma aparência aveludada à sua pele.

— Não se aproxime, mortal. 

A voz dele finalmente teve força o bastante para deixar sua garganta, mesmo que em um tom hesitante e choroso. Emalie uniu as sobrancelhas em confusão e com passos cautelosos, se aproximou, mesmo que ele tenha pedido distância.

— Não vou te fazer mal. — Ela garantiu, a voz suave e baixa para não assustá-lo. — Por que chora? — Ele se arrastou pela grama, tomando distância outra vez. — Se perdeu?

— Não estou perdido. — Seu tom era carregado por raiva, mas Emalie também percebeu certa vergonha. — Apenas me feri.

— Deixe-me ver. — Ela apoiou a cesta sobre a grama e tentou se aproximar. Ele cobria o joelho e o protegia como se ela pudesse piorar o ferimento apenas com o olhar. — Confie em mim. — Tentou outra vez. — Me deixe ajudar.

Ela mostrou seu melhor sorriso, com gentileza e cautela, tentando confortá-lo o suficiente para que não tivesse que temê-la.

E por alguma razão — talvez fossem os olhos dela ou o sorriso caloroso ou talvez seu cabelo distinto, mas familiar — ele parou de tentar se esquivar e se esconder, mostrando um corte raso em um dos joelhos. Emalie segurou a vontade de rir. Pelo jeito que ele chorava, ela imaginou um corte maior e mais profundo.

Onde as Fadas se Escondem - 𝐴𝑙𝑦 𝐾𝑙𝑒𝑖𝑛.Onde histórias criam vida. Descubra agora