O céu estava mais nublado do que nunca enquanto corria até o poço atrás de nosso pequeno chalé. Minhas mãos tremiam e meu coração acelerava enquanto prendia o balde e o descia até o fundo para buscar água fresca. Meus braços doíam ao puxar a corda, emergindo o balde efim cheio. A corda machucou minhas mãos por conta da força que exercia, mas eu não parei. Puxei até conseguir alcançar o balde e corri para levá-lo para dentro.
Minha mãe estava desesperada, assim como eu. A cabeça de meu irmãozinho repousava sobre o colo dela enquanto uma tosse horrível o assolava.
— Rápido, Emalie!
Ela exclamou para mim e eu rapidamente mergulhei um pedaço de pano na água e depois o torci antes de colocá-lo sobre a testa pelante de Lirion. Ele estava tendo outra de suas crises de febre e tosse. Mas desde que me lembrava, sempre foi assim, como se uma maldição tivesse caído sobre ele no momento em que nasceu.
Aproveitei a mesma água para pegar um copo e tentá-lo fazer beber um pouco, mas ele apenas virou o rosto e resmungou. Seus olhos fechados e as bochechas tão vermelhas como dois tomates.— Vá chamar a curandeira, agora!
Minha mãe berrou, me fazendo levantar em um sobressalto e correr para fora, tomando rumo para o centro da vila.
O céu se tornou ainda mais escuro enquanto corria desesperadamente. Som de trovões ecoaram. Consegui ver a luz deles em meio as nuvens carregadas e não demorou muito para que eu sentisse a primeira gota de chuva, seguida por várias outras.
Meu vestido enroscou em meus pés e eu quase caí, mas consegui me equilibrar e agarrar o tecido para continuar. Meus pulmões inflaram e queimaram conforme eu avancei mais depressa, seguindo o caminho de terra. Manchei meus sapatos com o barro que se formava aos poucos pela umidade.
Quando finalmente cheguei na porta da curandeira, meu cabelo pingava e o tecido do meu vestido grudava contra a minha pele. Dei batidas fortes contra a porta de madeira, o som ecoou alto e não demorou muito para que a mulher carrancuda me atendesse.
Eu nem precisei dizer nada para que ela entendesse o que eu estava fazendo ali. Pegou sua bolsa e respirou fundo antes de me seguir na chuva, de volta para o chalé. Não havia muito o que ela pudesse fazer. Eu e minha mãe sabíamos disso depois das incontáveis vezes que a chamamos. Mas sempre a chamávamos, como se esperássemos algum tipo de milagre repentino.A velha senhora amassou algumas ervas e misturou com a água que peguei no poço. Depois ferveu em nosso antigo caldeirão — mais velho que eu e desgastado pelos anos de uso. Lirion se recusou a beber isso também e só depois que eu prometi o ensinar a lutar com espadas, que ele permitiu mamãe de colocar o copo de barro em sua boca. Fazendo uma careta quando precisou mastigar as ervas para as engolir.
Seu cabelo loiro claro como o de minha mãe e padrasto estava grudado em sua testa molhada de suor. Suas feições eram de pura dor. Saber que ele estava sofrendo fazia meu peito doer, meu coração se apertando como se uma mão o estivesse esmagando com toda a força, me roubando o ar. Saí de casa por conta disso, não aguentando mais o ver de tal forma e sabendo que não podia fazer nada para ajudar.
Já tentei curandeiras. Todos os tipos de plantas e tratamentos malucos. Nada nunca funcionou e só serviram para esgotar a esperança que eu ainda tinha.
Eu poderia perder meu irmãozinho à qualquer momento e essa era a única certeza que tinha. O que me tirava o sono à noite.
Retornei para o interior do chalé com paredes de pedra apenas para pegar meu casaco felpudo e minhas botas de caçada. Consegui notar o olhar furioso de minha mãe em minha direção, sabendo que eu partiria por dias sem dar nenhuma explicação. E sabia que ela tinha toda razão para se zangar, mas não podia ficar ali vendo uma doença – ou maldição, como todos insistiam em chamar – misteriosa arrancar meu irmão de mim.
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Onde as Fadas se Escondem - 𝐴𝑙𝑦 𝐾𝑙𝑒𝑖𝑛.
FantasyO primeiro contato de Emalie com uma fada aconteceu quando ela ainda era apenas uma menina. Mas sendo proibida a interação de humanos com qualquer ser mágico, ela teve sua memória apagada, perdendo o único amigo que já tivera. Anos depois, Emalie é...