Capítulo 1

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Dante D'Orso

Cinco anos depois

Não esperava colocar os pés de novo no depósito de La Medusa, muito menos dessa maneira.

Há cinco anos pisei aqui pelo que esperava ser a última vez. Coloquei uma bala na cabeça do assassino de Francesca e dei por encerrada minha participação nos negócios que minha família fundou há quase cem anos. Passei a presidência para Don Delcuore e deixei para trás o nosso império, as amizades que tinha até então e as pessoas que costumava chamar de família.

Larguei tudo pela minha filha e passamos a ser só nós dois.

Não é tão ruim quanto parece. Às vezes, chega a ser bom viver sem a sensação de que está sob a mira o tempo inteiro.

— Quem é vivo sempre aparece! — Pietro Delcuore, meu padrinho de batismo e melhor amigo do meu pai, me saúda com um entusiasmo exagerado.

Deixo que me abrace e dou um beijo no seu rosto. Devo respeito a esse homem. Na verdade, devo mais do que isso. Devo a ele a minha criação, a minha vida e a possibilidade de viver em paz com a minha filha. Terá minha lealdade para sempre.

Ele também sabe disso e está prestes a cobrá-la. Não existe outro motivo para que estejamos todos reunidos aqui.

O lugar costumava ser uma fábrica de móveis, abandonada há tempos. Meu padrinho recebeu o terreno como pagamento de uma dívida, há muitos anos. A localização é perfeita. Longe o suficiente do centro habitado da cidade de Kingsmount para evitar olhares curiosos ou jovens à toa procurando diversão. Perto o bastante para podermos ir e voltar várias vezes durante o dia, se for necessário.

Por fora, o prédio malcuidado tem as paredes desbotadas pelo tempo e marcas de infiltração. Por dentro, uma parte foi reformada e garante alojamentos confortáveis para nossos homens, com quartos, banheiros e uma cozinha bem equipada. Também existe um escritório moderno para tratarmos de negócios e uma sala de reuniões capaz de reunir todos os representantes das famílias associadas a LaMedusa, seus conselheiros e seguranças.

Por isso, o fato de estarmos na parte antiga da construção, é curioso. Algo me diz que essa reunião é mais do que sigilosa e envolve o que chamamos de "espaços de convencimento".

Paredes foram erguidas pelo galpão dando origem a salas que serviam para interrogatórios. Os antigos equipamentos de marcenaria estavam ainda por ali, em todos os lados. Era incrível que, com um pouco de criatividade, pudessem se transformar em instrumentos perfeitos para conseguir as informações que desejávamos quando era preciso.

Ele fez um gesto para que seguisse para dentro da sala. Era um espaço amplo, mas vazio. Havia algumas cadeiras espalhadas, todas ocupadas por conselheiros de LaMedusa e seus homens e mulheres de confiança.

Além de Don Lucatelli, Donna Vaccaro e Don Marino eram herdeiros dos fundadores de LaMedusa, unidos para sempre pelo sangue e por juramentos de lealdade. O quarto fundador havia sido meu avô, Giuseppe D'Orso, um homem corajoso e um pouco cabeça-dura. Dizem que puxei a ele. Levo isso como um elogio.

Não somos mafiosos. Claro que não. A simples referência às organizações que se comportam como centopeias descontroladas é motivo de ojeriza para qualquer um que siga o juramento de LaMedusa. Somos uma instituição sólida e bem fundamentada sobre princípios morais. Seguimos as leis. Bem, na maior parte do tempo são as leis que nós mesmos criamos, mas é melhor assim.

Sempre sabemos o que esperar, como agir e como nos proteger. LaMedusa é blindada por honra e compromisso. Foi assim que assumi a presidência de nossa empresa com apenas vinte e oito anos. E, da mesma maneira, foi assim que me afastei dos negócios três anos depois para cuidar de minha filha, sob a benção de Don Delcuore e dos demais conselheiros.

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