Irene havia saído do escritório do advogado onde havia assinado os papéis de divórcio, mas não estava com vontade de ir pela primeira vez para uma casa que não tinha vivido por 30 anos com Antônio. A mulher ficou sentada no carro por alguns momentos tentando digerir o que tinha acabado de acontecer. Não eram 3 horas, 3 dias ou 3 meses, eram 30 anos. 30 anos amando e se dedicando a um homem que não merecia nem a metade dela. Lágrimas começaram a cair pelo rosto da mulher ao mesmo tempo em que uma chuva forte caiu do céu. Foi estranho, mas reconfortante pensar que o céu parecia sentir sua tristeza. Ela sabia que não podia ficar pra sempre ali, Antônio logo sairia e ela não queria que ele a visse ali, lambendo suas feridas. Dando partida no carro, Irene começou a dirigir sem rumo pela cidade.
Pelo que parecia ser a décima vez, Irene passou pelo mesmo lugar, e pela décima vez, se sentiu atraída a entrar. Ainda não era o horário mais cheio do local, e ela não sabia o que a possui pra querer entrar. Na verdade, ela sabia sim. Ela queria relembrar o momento em colocou os olhos nele pela primeira vez, quando sentiu que o mundo dela já não parecia tão sem. Ela estava tomada pelo saudosismo e se viu entrando no bar que agora era dirigido por Luana.
Aproveitando ser um horário menos cheio, Irene sentou em uma mesa no canto que ela sabia ser o mais solitário do bar, esperando que mesmo quando ficasse cheio, as pessoas não a notassem ali. Alguns minutos após se sentar, viu Kelvin se aproximar e quase revirou os olhos, masse conteve
"Olá, imperatriz do soja. A que devemos a honra da visita? A Senhora quer alguma coisa?" Perguntou ele tentando pescar qualquer informação
"Você já sabe que não sou mais esposa do Antônio, pode parar deme chamar assim. Me traz uma bebida. E me faz um favor, se você ver que estou acabando, traz outra, porque ficarei aqui por um tempo" respondeu a mulher sem paciência
"É pra já, dona Irene"
E com isso, Kelvin saiu e logo voltou com sua bebida, a deixando sozinha. Ela olhou ao redor e tentou se lembrar de como as coisas eram antes. O local havia mudado, tinha passado por algumas reformas, mas algumas coisas não se apagam. O cheiro ainda era o mesmo. Cheiro de bebida, misturada com cigarro e o óleo velho da cozinha. As meninas podem ter sido trocadas, mas no fim, a personalidade era sempre a mesma. As mesmas brigas por quarto, por roupas e por maquiagens roubadas. Aquela era a primeira vez que ela botava os pés ali depois de tantos anos e ela não pôde evitar o misto de sentimentos que estavam dentro dela naquele momento.
O tempo foi passando e o lugar foi enchendo, ficando cada vez mais barulhento e quente, mas ela não conseguia sair dali. Observava a dinâmica do local, que depois de anos não havia mudado. Viu algumas garotas com olhares ambiciosos e sonhadores, como um dia ela já teve. Ela não sabia se podia dizer isso naquele momento, mas ela teve sorte. Sorte de ter conhecido Antônio, de ter conseguido uma vida melhor, de ter sido capaz de sair dali.
Kelvin fez o que ela pediu e continuou trazendo bebidas, e ela continuou bebendo, tentando afogar no álcool todos os sentimentos mistos que ela tinha. Ela não sabe quando, mas reparou que o rosto dela já não estava tão seco, que as lágrimas caíam, mas ela não tinha forças para parar o crescente fluxo de água que descia pelos seus olhos. Logo, um vulto passou por ela e sentou a mesa. Mesmo sem vontade, a mulher levantou a cabeça e viu a filha mais nova sentada na frente dela. Com a cabeça confusa, Irene perguntou o que a menina estava fazendo ali.
"Bem, eu... você não foi pra casa, sua casa, e quando eu passei por lá fiquei preocupada. Imaginei que não foi um dia fácil e que talvez você quisesse um lugar familiar. Aí eu lembrei... do que o Caio contou pra todo mundo aquele dia. Era um tiro no escuro, mas estou feliz por ter te encontrado. Ta tudo bem, mãe?" Perguntou Petra olhando nos olhos tristes da mulher.