One Night Only - Parte 1

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"You want all my love and my devotion
You want my love and soul, right on the line
I have no doubt that I could love you, forever
The only trouble is, you really don't have the timeYou've got one night only, one night only
That's all you have to spare
One night only
Let's not pretend to care"

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O corpo do menino balançava à medida que o carro seguia o curso. Encolhido no banco traseiro não ousava fazer nenhum barulho e se policiava para não se prejudicar ainda mais. Com medo do motorista ver as mãos dele soltas, que eram consideradas femininas para um homem, decidiu cruzar firmemente os braços para evitar repreendas.

"Viadinho!"

"Aberração!"

Tais palavras ecoavam em sua mente acompanhadas pela ardência dos arranhões espalhados pelo corpo, consequências gravadas na pele pelo cinto de quem deveria lhe amar, proteger e aceitar acima de tudo. A dor havia diminuído um pouco, mas a aspereza da roupa contra a pele gerava um estranho incômodo, como se estivesse causando autoflagelo pelo erro cometido. Com as costas apoiadas contra a porta traseira e os pés descalços no assento, recusava-se a encarar o homem quem continuava a dirigir sem diminuir a velocidade. Não soube distinguir há quanto tempo estavam no carro. Uma hora? Duas horas? Não sabia.

Encarou a estrada e se deu conta que anoitecia. Se perguntava se a sua mãe teria forças para enfrentar o marido. A mulher não era ruim. Longe disso. Era amável, carinhosa, atenciosa e nunca insultou o filho por ser quem era. Não exigia que se enquadrasse num padrão e nem rejeitava a essência do menino. Ela era o único consolo que tinha dentro daquela residência. O problema é que não foi criada para o confronto e nem para gerenciar conflitos – sequer tinha o temperamento adequado para isso. Portanto, o máximo que fazia era buscar proteger o filho e amenizar a ira do outro.

"Olhe para mim" – segurava o rosto do menor, completamente avermelhado pelo desespero e banhado em lágrimas – "Você não é ninguém. Jamais será mais do que isso. Essa coisa insignificante e errada que é. Ainda não acredito como a sua mãe foi capaz de parir um monstro"

Pelo reflexo da janela conseguiu enxergar as marcas das unhas deixadas pelo pai na têmpora.

O clima denso dentro do veículo era quase palpável. O jovem o sentia em cada célula do corpo. O medo o fez paralisar desde que o pai invadiu seu quarto tamanho o pavor. Torcia inutilmente para o rádio ser ligado e ele poder ouvir uma música como forma de se distrair e afastar da mente a incógnita do que viria a acontecer nos próximos momentos. Nem teve tempo de pegar seus fones de ouvido, sequer o celular. Tentava em vão buscar o aparelho enquanto era empurrado pelos braços e caminhava descalço aos tropeços. Era a única esperança para acionar a mãe – se bem que, pelo estado emocional do pai, não saberia dizer se a mulher conseguiria controla-lo.

Seu pai era um homem de temperamento terrível, cheio de preconceitos e inflexível. Pautava a vida nos ensinamentos bíblicos e tudo que fosse contra o que estivesse escrito naquele livro que o filho tomou verdadeiro asco, deveria ser erradicado de sua frente, excluído e ignorado – mesmo que fosse a existência de alguém. Para a infelicidade da família, o filho mais novo era a personificação daquilo que era abominado pelo pai.

Nunca foi um menino considerado comum pelos padrões da sociedade. Sempre teve gostos que não condiziam com o sexo masculino. Na escola costumava brincar com as meninas e suas respectivas bonecas, já que, onde morava, isso era impossível. Brincava de maquiar, pentear e de casinha com as demais alunas. Ao menos no colégio não recebia repreendas. Não era apreciador de nenhum esporte e nunca teve inclinação para lutas marciais. O genitor se esforçou para fazê-lo gostar de "coisas de homem", assim como gostava de enfatizar.

One Night Only - Short-fic KelmiroOnde histórias criam vida. Descubra agora