-

394 47 55
                                    

A tempestade vista do vigésimo andar se tornou cada vez mais forte, batendo contra o vidro e ecoando na sala vazia e escura cuja única iluminação eram os flashes ocasionais dos raios seguidos pelo reverberar violento dos trovões.

Estava frio mesmo que nenhuma janela estivesse aberta, como se a felicidade tivesse sumido do mundo. Rin assistia à chuva, mas sem olhar a nenhum ponto específico, inconscientemente correndo um dedo pela borda da taça de vinho.

Desde que Isagi terminou com ele, beber sozinho e observar o nada se tornou um hábito. A solidão era excruciante e o apartamento em que eles costumavam morar era grande demais para uma pessoa só. O relógio na parede havia há muito sido quebrado, reduzido aos pedaços contra o chão depois de um ataque de raiva causado por aquele tic-tac sem fim, aquele tic-tac que o lembrava que a cada segundo que passava, era mais um segundo que Isagi não estava ali.

Ele não voltaria àquele apartamento, nem à vida de Rin, eles não acordariam mais lado a lado. Rin não sentiria mais a maciez daqueles lábios, não tocaria mais na pele quente, nem o abraçaria.

Após um tempo separados, era apenas natural que algumas memórias se perdessem, levadas como fumaça no ar. E isso é algo que aterroriza Rin centenas de maneiras diferentes. Ele não queria esquecer do que experienciou com Isagi.

Como ele pôde terminar tudo tão cruelmente?

Estava um dia lindo, do jeito que Isagi gosta. Eles estavam fazendo compras, rindo e se divertindo até que Rin, por todo arrependimento que sentiria depois, perdeu a paciência com algo que ele nem sequer conseguia lembrar, dando início a uma discussão.

Ele realmente não se recordava o motivo, apenas que era algo trivial.

Eles não discutiram por muito tempo, afinal, eles estavam em público. Os dois permaneceram em silêncio daquele momento até chegarem em casa, persistindo em ignorar um ao outro como sempre faziam. Como eles têm feito cada vez mais.

No começo da noite, Rin estava preparando o jantar quando ouviu o som de rodinhas rolando no chão do corredor, se deparando com Isagi puxando uma mala de viagem.

Ele franziu e olhou para o relógio, "Outra viagem à trabalho? Está tão tarde, você não pode ir pela manhã?" E então, lembrando-se que estavam no meio de uma guerra fria, Rin não insistiu mais, "Que horas é seu voo? Vou te levar ao aeroporto."

"Rin, estou indo embora."

"Estou vendo, Isagi. Para onde dessa vez? Você vai demorar para voltar?"

"O que eu quero dizer é... Estou terminando com você."

Rin congelou, olhando para o outro sem nenhuma reação. Ele claramente ouviu e conhecia aquelas palavras, mas nesse momento a junção delas não fazia sentido algum.

Isagi deu um suspiro cansado e continuou, "Você sabe que era só uma questão de tempo... Nós temos discutido quase todos os dias, você não me escuta, e eu também não quero te escutar."

"Isagi..."

"...Estou cansado, não quero mais viver assim. Não aguento mais sua arrogância, seu mau humor, o jeito que você fala comigo como se eu fosse menos inteligente que você. Estou indo embora."

"Então vá! Eu não preciso de você! Vá embora, Isagi, dê o fora!" Rin gritou, seguindo Isagi até a porta da frente como se estivesse o expulsando, "E não volte mais!"

Isagi não voltou.

A primeira semana não foi difícil, Rin ainda estava bravo enquanto via Isagi removendo todos os seus pertences do apartamento, apagando a própria existência. Se ele queria ir embora, foda-se, que seja.

Um mês depois, Rin sentia que a duração dessa guerra fria já tinha ido longe demais, Isagi usaria a chave reserva e entraria pela porta a qualquer momento.

Três meses mais tarde, Rin aceitou o que ele sempre soube, mas não queria admitir: Isagi não é alguém que mudaria de ideia facilmente depois de tomar uma decisão. Ele não era assim com pequenas coisas, muito menos com coisas importantes.

Desde esse dia, Rin tem tomado pelo menos três garrafas de vinho aos finais de semana, se não mais. Era relativamente suportável durante os outros dias pois tudo que ele precisava fazer era se jogar de cabeça no trabalho, mas quando era hora de retornar ao apartamento vazio...

Ele frequentemente pensava o que poderia ter sido diferente se não fosse tão impaciente e explosivo, se fosse mais compreensivo, mais tolerante. Isagi ainda assim se cansaria dele?

Se eles tivessem conversado mais, tudo teria se resolvido? Poderia tudo voltar à simplicidade de dia após dia quando jantavam juntos, assistiam filmes deitados no sofá, quando eles olhavam um nos olhos do outro e quando sentiam os batimentos cardíacos sincronizando logo antes de adormecerem?

Rin bebeu mais uma taça.

Ele não sabia mais nada sobre Isagi. Não sabia seu endereço, se estava bem, se mudou de emprego, se tinha outro namorado...

As fotos que eles tiraram ao longo dos anos ainda estavam no seu celular, num álbum que Rin tentava fingir que não existia. No entanto, mesmo sem essas fotos, era impossível fugir do rosto dele, já que todos os dias antes de dormir, Rin observaria por um longo tempo o único retrato que Isagi esqueceu de levar, memorizando cada detalhe do sorriso e da felicidade que haviam ali.

Rin olhou para a tela do celular, tentando focar nos ícones que já se embaçavam pelo vinho.

Ele engoliu em seco, decidindo que, pela primeira vez, ele passaria por cima do seu maldito orgulho e ligaria para Isagi.

Mas já faz tanto tempo...

Ah, foda-se.

Rin segurou o celular contra a orelha, sentindo o coração bater extremamente rápido. Isagi só precisava atender uma vez, apenas uma. Ele diria tudo que estava sentindo e então desligaria, simples assim.

Por favor, Isagi, atenda.

Chamada perdida.

Rin ligou mais uma vez.

Chamada perdida.

Mais uma vez.

E mais uma vez.

Até Isagi atender.

"...Hmm?"

Rin parou de respirar. O celular estava no ouvido e o relógio estava quebrado, ele não sabia que horas eram. Já é madrugada?

"Isagi."

"...Rin?"

"Eu amo você. Mais do que tudo no mundo. Sinto sua falta a cada minuto do dia, não posso viver sem você." Rin disse tudo de uma vez sem nem parar para respirar, encarando a tempestade lá fora, derramando as lágrimas que ele tão desesperadamente tentava não deixar caírem, "Tudo me lembra você, seu cheiro, seu sorriso. Eu tentei seguir em frente, tentei... Te deixar em paz... Eu posso mudar, eu vou mudar. Não vai mais ser como antes, eu juro. Eu... Eu queria perguntar se podemos tentar de novo, eu..."

"Rin..."

"Eu te amo."

"Rin..." Isagi suspirou do outro lado da ligação. "Não me ligue mais."

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Nov 28, 2023 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Vinho [rinsagi] [rnis]Onde histórias criam vida. Descubra agora