2 - A Festa de Aniversário Real

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A festa começou ao anoitecer. Quase toda a ilha compareceu para desejar felicidades à princesa, dar presentes, e, principalmente, vê-la receber sua faca de osso de baleia.

Na hora da cerimônia principal, todos ficaram em silêncio enquanto Janaína e Dario estendiam para Inaê uma caixa de madeira lustrosa. Na maioria das vezes em que um jovem recebia sua faca aos dezenove anos, esta era feita e entalhada só para ele ou ela. Mas o pai de Inaê vinha de uma família que passava a lâmina de pai para filho, e como Marisol recusara receber a faca do pai em seu aniversário, a mais nova receberia a dele.

— Inaê Luamar, você hoje recebe esta lâmina como uma parte de você, e ao aceitá-la, se torna também parte indispensável desta ilha – Dario declarou formalmente estendendo a herança para ela.

Inaê abriu a caixa e tirou a faca de dentro, sob os olhares de expectativa de dezenas de pessoas, inclusive da rainha Ondina. O cabo e a bainha tinham uma coloração amarelada enquanto a lâmina era mais branca. E a jovem reparou em algo que não estava ali na última vez que vira a herança: o desenho de um dragão entalhado na bainha.

Dario sorriu para a filha quando ela o encarou surpresa, e retribuindo o sorriso, a aniversariante pôs a faca no cinto, debaixo de uma chuva de aplausos e brados. A arma na cintura destoava do vestido azul de tecido delicado que a jovem usava, mas isso não importava ali.

Então chegou a hora da dança, e como Inaê nunca soube dançar direito, esgueirou-se para fora do salão de festas e seguiu para a praia, completamente deserta agora.

À luz do luar, que deixava a areia da praia acinzentada e o mar brilhando prateado, Inaê desembainhou a faca e a admirou. Trinta centímetros de lâmina reta, afiada como se fosse nova, embora tivesse mais de cem anos. O entalhe de dragão ela sabia que fora feito só por sua causa, seu pai conhecia muito bem a fascinação que ela tinha pelos senhores do mar.

As pessoas tinham certa razão em temer aqueles seres parecidos com serpentes draconianas gigantescas. Há mais ou menos mil anos, sem ninguém saber precisamente quanto tempo, os dragões surgiram das fendas mais profundas do oceano, e como um castigo divino sobre a humanidade, arrasaram a Terra, um tsunami depois do outro. O que sobrou da raça humana sobreviveu agarrada aos pedaços de chão que sobraram.

A Ilha Delfim era um deles, bem como as pequenas ilhas no extremo norte, Lunae, o maior continente, e Lus, a terra mais ao sul, que tinha pouco mais que o dobro do lar delfino.

Inaê nunca sentira medo dos dragões, na verdade chegava a admirá-los. Aonde quer que fossem, as ondas os acompanhavam e a maré subia como se a própria lua comandasse. Seres poderosos o bastante para que o oceano os obedecesse não lhe pareciam monstros, mas sim deuses. Se eles ao menos dessem uma chance aos humanos de se provarem dignos de perdão...

— Ei, Inaê, o aniversário é seu, não vai doer se você dançar só um pouquinho – Marisol apareceu atrás da irmã, que balançou a cabeça.

— Ia doer nos olhos de quem me visse dançar. Se pensar direito, ao sair, estou fazendo um favor à comunidade.

— Se não vai dançar, poderia cantar pelo menos. A sua voz é muito bonita, a comunidade iria agradecer – as duas riram e a mais velha tirou algo do bolso – Eu ainda nem dei o seu presente. Aqui está.

Inaê abriu o saquinho de tecido e deixou cair em sua mão um colar. O cordão era de cetim negro, preso a uma pequena pedra transparente. Segurando-a contra a luz, a jovem notou que era um cristal com o formato de um búzio, igual aos que gostava de catar na areia, quando pequena.

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