Cansado

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Deixe-me reimaginar a cena: é de manhã cedo. O sol ainda não brilhou totalmente, mas o dia já está ganhando vida. Como qualquer adulto que trabalha cedo, eu me levanto, com as olheiras inchadas, com o corpo que se encontra consideravelmente tenso e suado depois de um pesadelo terrível. Meu coração fica pesado e o ritmo de suas batidas são fortes e constantes, como se fosse uma maquina velha emperrada de ferrugem, tentando desesperadamente funcionar regularmente. O cheiro desagradável do meu próprio hálito polui as minhas narinas. "Há quanto tempo eu não escovo os dentes?"...eu me pergunto enquanto eu tento checar se realmente aquele cheiro de putrefação estava vindo da minha boca. Sim, realmente era da minha boca. Eu me sento na beira da cama tentando evitar engolir minha própria saliva. Eu sabia que se eu engolisse ela, eu vomitaria. Pois nem sequer minha própria saliva estava agradavelmente "engolível".

Eu fico sentado na beira da cama, com os cabelos atrapalhando a minha visão, sujos, cheios de nó, oleosos e com cheiro de mofo. Talvez seja porque eu não os seco direito depois do banho. Há quanto tempo eu não tomo banho?? Merda. Meu rosto estava sujo, com pedaços de pele descascadas nele. Meu cravos estão mais visíveis que antes.

Eu percebo que estou usando a mesma roupa há semanas. Elas estão fedendo a suor, perfume forte masculino e cerveja com um toque de whisky. Minha barba já estava crescida e meus cabelos não estavam diferentes. O relógio marcam exatamente 03:44 da manhã.

"Certo, Apollo, você não pode se deixar na mão novamente."- Eu digo para mim mesmo, tentando me levantar lentamente para não abaixar minha pressão.

Eu sigo em direção ao banheiro do meu apartamento bagunçado. O banheiro era o pior de todos. Não estava muito bagunçado, mas cheirava a urina. Há quanto tempo eu não lavo a porra desse banheiro???

De repente, eu me pego me olhando no espelho novamente depois de evitá-lo por tanto tempo que até me deixou curioso sobre o quanto minha barba cresceu. Eu olho para a minha figura a minha frente. Caralho...eu estou horrível. Por um momento, eu não me reconheci.

Eu perecia bem mais velho, talvez uns 10 anos a mais...Acho que ninguém iria conseguir acreditar em mim se eu falasse que eu tenho 21 anos. Talvez zombariam de mim dizendo o mesmo de sempre, como: "haha!! Só se for 21 anos de cadeia". Sem graça.

Eu pego a espuma de barbear velha no armário do meu banheiro, uma navalha que costumo usar para me machucar e enfim, depois de possivelmente 1 mês e meio, a navalha foi finalmente usada para tirar barba, e não para tirar sangue.

Quando eu finalmente lavo o meu rosto, eu me vejo com meus 21 novamente. Mas ao mesmo tempo, a dor, o cansaço, a anemia e as noites mal dormidas eram claras no meu rosto.

Depois de cuspir a saliva nojenta da minha boca, eu finalmente tomo coragem para escovar meus dentes. Eu pego a escova de dentes que estava suja com pasta seca e finalmente escovo os meus dentes nojentos. Eles estavam cheios de tártaro, placa bacteriana...estavam em estado deplorável. Enquanto eu escovava os meus dentes, eu senti uma dor aguda vindo das minhas gengivas avermelhadas. Quando e cuspo a espuma, eu vejo sangue. As minhas gengivas estavam sangrando. Merda. Eu começo a ficar com os olhos marejados, cheio de lágrimas...a dor era insuportável.

No que eu me tornei?...

Eu não estava conseguindo escovar os dentes, EU NÃO CONSEGUIA ESCOVAR OS DENTES!!!!

Tentei manter a calma. Engoli o choro e continuei escovando, tentando suportar a dor. Eu percebi que estava chorando novamente enquanto escovava os dentes como um verdadeiro marica, como meu pai costumava dizer.

Depois de tomar banho e me lavar bem, coloquei um uniforme limpo do meu trabalho e fui finalmente comer algo. Eu estava a dois dias sem comer, então, eu já estava sentindo minha boca tremendo para comer algo. Mais tarde, ás 4:50, eu estava lutando para comer um simples pão com queijo.

Às vezes, sinto como se tivesse sido destinado a um destino que não estou preparado para enfrentar.

Depois de gastar o meu tempo fumando um cigarro, eu finalmente sai de casa e fui pegar um maldito metrô. Eu sinceramente odeio locais públicos, principalmente lugares públicos apertados e cheio de gente. Me sinto vulnerável dês da ultima vez que uma mulher bêbada roçou a mão dela entre minhas pernas. Foi horrível.

Quando finalmente chego no trabalho, eu não deixo de notar o quão o trabalho parece ser uma carga opressiva, uma obrigação que eu aceito com birra. Todos os dias, a mesma rotina tediosa se desenrola. Eu me sinto preso em um looping interminável, como se estivesse condenado a viver o mesmo dia repetidamente.

E despertar todas as manhãs é um desafio para mim mesmo. Eu não quero sair da cama. Eu não quero sair de casa. Eu não quero enfrentar o mundo lá fora. Parece que estou preso em um estado de letargia, olhando para o vazio sem nenhum propósito real.

Às vezes, me pergunto se seria mais fácil reencarnar como um animal. Não ter que lidar com as complicações e expectativas da vida humana. Não ter que desvendar o labirinto de emoções e responsabilidades que me cercam.

A ideia de não ter sobrevivido também passa pela minha mente. Seria tão mais fácil, não é? Não ter que lutar para encontrar significado em uma vida que parece vazia.

Quando chego no trabalho depois de pegar aquele metrô horrível com aquelas luzes esverdeadas, eu finalmente me sento na cadeira em minha mesa, encarando o teclado do computador como se fosse a coisa mais complicada do mundo. Meu chefe vem até mim, questionando se está tudo bem.

Apollo, está mais péssimo que ontem, você está bem? - ele pergunta. Eu sabia que ele não se importava. Ninguém se importa nesse trabalho de merda.

Balanço a cabeça em sinal negativo, sem conseguir pronunciar uma única palavra.

O dia parece arrastar-se lentamente, a sensação de opressão cada vez mais sufocante. À noite, voltando para casa, encontro um antigo amigo que me convida para sair. Recuso educadamente e continuo meu caminho. Talvez eu pense em sair só quando eu ver um peixe morrer afogado.

- Caralho Apollo, você é um cuzão. - eu falo sussurrando enquanto caminho em direção da portaria do meu apartamento. Eu odeio subir elevadores. Dentro de elevadores, eu fico sozinho com meus pensamentos e espero a chegada do meu andar até quase enlouquecer com a minha própria cabeça.

Ao entrar no meu apartamento, tudo estava bagunçado e fedendo a mofo. O som alto da geladeira resfriando era ainda mais insuportável. O chão gorduroso cheio de manchas de café seco no chão reforçava ainda mais esse ambiente nojento que eu mesmo causei. Talvez eu devesse limpar uma hora. Mas agora não. Eu estou cansado demais pra isso.

De repente, eu lembro da minha fonte de alegria escondida em um pequeno pacote no bolso do meu sobretudo fedido. 10 gramas de cocaína e 2 baseados preparados. Agora sim eu posso descansar em paz. Quando eu deixo minha maleta de lado e tranco a porta, vou direto pro sobretudo e pego a cocaína e os baseados.

Depois de uma grande tragada, eu sinto meu corpo finalmente relaxar de verdade.

- merda! Eu estava precisando disso há tanto tempo... - eu digo para mim mesmo como forma de alívio.

Depois de horas fumando e cheirando até meu nariz não aguentar e sangrar, eu ligo em um canal aleatório na tv. Não tinha nada de interessante como sempre. Eram sempre canais entediantes sobre notícias chocantes de outros estados e outros sobre vida selvagem. Que tipo de pessoa chapada pra caralho ia querer assistir esse tipo de merda? Me erra...

Esses tipos de canais bregas me fazem lembrar do meu pai. Um homem cansado, infeliz, sentado de uma forma desconfortável assistindo esses canais enquanto respirava pesado, fumava palheiro e reclamava do trabalho e da sua falta de tempo para uma criança. Eu.

Eu honestamente nunca entendi o motivo das reclamações, até porque eu sempre estava ocupado no meu próprio mundo dentro do meu quarto enquanto discutia comigo mesmo, desenhava e criava cenários falsos de uma família perfeita para mim. Eu nunca conseguia idealizar tudo.

- Augh! que infância de merda! - eu disse para mim mesmo enquanto sentia aquele mesmo aperto de sempre no meu peito. Aquele sufoco, como se estivessem mais de 40 fios enfarpados em minha garganta. Era horrível.

- as drogas não estão adiantando. Preciso de mais...eu não quero sentir isso!!! De novo não!! Vai embora!! - eu chego na minha conclusão de merda enquanto caminho em direção do casaco, pegando os baseados e o saquinho de cocaína reserva que seria para mais tarde.

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⏰ Última atualização: Oct 03 ⏰

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Apollo - Uma vida miserável de lutaOnde histórias criam vida. Descubra agora