tem sido difícil ler esse livro.
parece que as palavras me rasgam e a dura realidade que as compõe, e me atravessa, joga sal nas feridas abertas que dilaceram o meu peito.
esses cortes que de alguma forma marcam quem eu sou, parecem nunca deixar de sangrar.
de repente, sou acometida por uma ansiedade terrível e sinto que vou sucumbir.
me sinto tão pequena diante das estruturas seculares que compõe o nosso processo de subjetivação enquanto mulheres e legitimam a violência contra os nossos corpos que me embrulha o estômago e o corpo se retrai, repulsa, recusa.
eu me dou conta: não há como voltar atrás.
assim como no conto do "barba azul", no livro "mulheres que correm com os lobos", quando a irmã mais nova abre a porta proibida e enxerga o quarto cheio de ossos das mulheres que o barba azul matou antes dela.
eu abri essa porta.
não tem como desver tudo o que eu vi e de mãos dadas com a coragem, quando girei a fechadura, evoquei a força dessas mulheres.
essas mulheres que não puderam ser.
que não puderam falar.
convoco essas mulheres em mim e escuto essa voz que vem de dentro, do fundo das minhas estranhas, porque é aí, na minha intuição e na minha memória que reside o mapa que me guia nas florestas que preciso e ainda vou desbravar.