burning myself.

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cristalino é uma parte do olho que muitas vezes desfoca sem eu perceber, e quando ocorre, o mundo externo sai da minha mente, sinto meus pés sairem do chão e não sei dizer se é magico ou desesperador. há um formigamento não tão passageiro iniciando desde as pontas dos meus pés, subindo e me preenchendo até minha cabeça. o quebra-cabeça colorido se desmonta e não posso dizer se fechei ou abri meus olhos, eu definitivamente não sei.

a partir daí, só sei que sinto e só sei que existo porque a dor existe, no sentido físico e mental, ela está lá. uma explosão com fragrância de cereja se transforma em um mundo plástico, quase feito de chiclete, mas ao mesmo tempo, é ósseo, nu, inverossímil. a combinação de todos os elementos visíveis se torna numa quimera atrativa. de forma frenética sou incapaz de voltar ao mundo real, incapaz de reagir positivamente, porém não incapaz de existir. a sensação de desconforto vinda do mundo real faz minha mente doer tanto que sou obrigada dissipar uma fumaça doce errônea. tento cavar um buraco entre as terminações nervosas da minha mente, mesmo com os dedos gastos de produtos químicos, e novamente, a dor está presente, sufocando meu pulmão juntamente com a sensação da morte rastejando sobre os ossos da minha costela estrelada.

mãos feitas de ossos são movidas por um caos elétrico, pescoço está sendo sufocado. o cadáver zumbe no meu ouvido, me pergunta sobre o amor e porque ele me mantém viva. não respondo, meu batimento cardíaco faz esse trabalho quando as artérias do meu pescoço pulsam na mão feita de ossos metálicos, como se explodissem em luzes coloridas. então o esqueleto se transforma em poeira suja e flutua no ar, para um lugar que os vivos desconhecem.

sinto meu corpo despencar no chão e de repente, uma energia vinda do universo se manifesta. tenho vontade de colorir uma cidade inteira com tinta aquarela, as nuvens me abraçam e esse desvaneio é quase como uma droga feita de feronômios, meus lábios se arrastam em uma superfície de mármore e sinto vontade de beijar alguém a sabor de licor de cereja. vejo vermelho ao imaginar a sensação, é doce, tão doce que ao se misturar com branco se transforma em rosa. meus dedos continuam doendo por estarem abrindo a porta de uma ilusão quase megalomaníaca.

e a força, me conecto com a realidade novamente, meus dedos estão normais, mas eu posso jurar que sinto eles sangrarem. ofego, uma lágrima escorre na minha bochecha e sei que ela não reflete em tristeza. desejo afundar meu rosto no travesseiro onde a minha nuca repousava mais cedo; desejo mergulhar nos meus cobertores com sensação de mar até voltar ao mundo dos sonhos que não são perfeitos, tais quais quase reais. lembro-me do sonho dessa noite. meu coração aperta e quero amar violentamente, submergir em um amor quase limpo, mesmo que o meu seja calejado, com marcas de cicatrizes e decepções de talvez quase todos os tipos.

então aquela alma cheia de perguntas é preenchida com respostas quase absolutas. um novo eu se molda, lágrimas escorrem de forma intensa, mas não é porque dói, e sim porque é aliviador; porque é como se mais um peso fosse retirado das costas e sei que as estrelas não estão prestes a explodirem tão rápido. a respiração voltando de forma fleumática e a sutileza volta a predominar nas minhas entranhas, avisando-me que minha alma ocupa a carne que me mantém em pé.

eu não sou perfeita, e eu nunca serei, entretanto minhas patologias não me tornam um monstro. eu não fui criada por Deus para ser um monstro.

posso imaginar um arco de cristais e uma flecha pegando fogo. do outro lado da ponte há uma imagem semelhante a minha. mesmo estando no mundo real novamente, eu posso jurar que existe uma ponte pegando fogo junto com um passado que ainda existe, porém não presente.

🫧

a ponte.Onde histórias criam vida. Descubra agora