Florianópolis

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Notas:

A foto é do Cassiano Psomas.

Éolo estava enfurecido.

Ela sabia que aquela seria uma conversa difícil mas não imaginara o nível.

Logo que saíra do hospital em Porto Alegre, cumprindo sua missão por um fio, subira aos céus pelas rotas que o vento permitia.

Desviou de massas de ar descontroladas por todo o caminho.

Não sendo a procrastinação do seu feitio, solicitara logo uma reunião com quem deveria estar administrando melhor aquilo.

Não conseguira uma imediatamente como gostaria, mas ali eles estavam.

"Estou falando Éolo, seus ventos estavam desgovernados aquele dia. Não consegui passar! E você sabe que sou uma voadora exímia"

"Olha só Nice, aceitei seu pedido de audiência por consideração ao que você tem feito pela minha família. Mas não vou aceitar ouvir isso. Desgovernados?! Eu governo todos os ventos de norte a sul, leste a oeste!"

"Você sabe que às vezes acidentes acontecem"

Não queria lembrá-lo do episódio com Ulisses mas não estava acima de usar aquilo se ele continuasse naquele estado de negação.

Não adiantou muito ter evitado dizer com todas as palavras.

Ele entendeu a referência imediatamente:

"O que você está insinuando? Acha que andei distribuindo presentes aos humanos? Aprendi minha lição. Ao contrário de você, aliás"

"O que quer dizer com isso?"

"Eu sou o deus dos ventos, das brisas das monções. Acha que não escuto coisas por onde passo?"

Ah, céus.

Era o deus da fofoca, aparentemente.

"Não fiz nada de errado"

"Não? Desde quando você pode encostar em humanos que não acabaram de vencer em algo?"

"Encostei em Helena porque ela conquistou minha atenção. Acha pouca coisa?"

Ele bufou em irritação.

"Vamos torcer para que ela seja uma grande vencedora então, para que esteja ganhando em todos os segundos em que você sentir vontade de se aproximar"

Que ousadia.

"Deixe que eu me preocupo com isso. Você se concentre nos seus ventos e estamos resolvidos"

Virou-se furiosa para a saída, batendo as asas violentamente contra o ar.

Éolo não aceitou aquele desfecho:

"Uma última coisa Nice. Vou lhe avisar, já que é iniciante na aventura de se mesclar com os humanos. O tempo deles passa. Para você, não houve quase espaço entre sua Helena e nossa conversa amistosa, sim? Mas para ela já se foi um mês"

Como assim?

Para as duas havia se passado um mês.

Quase nada.

Ele percebeu que ainda não havia obtido o efeito que intencionara:

"Ela está achando que você a esqueceu. Um mês para os humanos é bastante tempo, Nice. Se fosse você torcia para ela já não estar com outra pessoa. Eles são voláteis, totalmente inconstantes"

Trincou a mandíbula.

Que ser irritante.

Virou-se novamente sem oferecer uma resposta.

SamotráciaOnde histórias criam vida. Descubra agora