Capítulo 1 - A garota que veio da cidade

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Ela corria, corria e corria. Seu rosto estava suado, seu coração acelerado, o cansaço espalhado por todo o seu corpo, arfando descontroladamente. Mas suas pernas pequenas não paravam de correr, como se sua liberdade dependesse daquilo. Porque afinal, dependia. No meio do caminho uma pedra intrometeu-se, levando Mira a tropeçar e cair de encontro ao chão frio da floresta de Fraden.

E ali ela ficou. Pequena, trêmula, rosto e pernas ralados, cabelos desgrenhados e acompanhada por seu sujo vestidinho azul. Desmaiada ao relento.

No dia seguinte alguém a encontrou e ela foi levada para um quarto quente e seguro das atrocidades do mundo externo.


•••

Ao acordar, Mira se vê coberta por um cobertor feito de retalhos e percebe que não está mais na floresta. Ao olhar para o lado vê um menino e uma menina sentados à uma mesa pequena enquanto comem alguns pedaços de pão. E com medo e timidez volta a se cobrir, dessa vez, de forma que não consigam ver seu pequeno rosto.

- Sei que está acordada - uma voz ressoa em seus ouvidos 𝑎𝑏𝑟𝑢𝑝𝑡𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑒. Ao levantar apenas os redondos olhos para ver quem era a tal criatura, a menina enxerga uma garota magra, alta, loira, com um nariz arrebitado e um rosto comprido repleto de sardas.

- Pode juntar-se a nós se quiser, não vamos machuca-la - ela falou e logo saiu ao encontro do restante de seu pão. Então, timidamente, a garota sai de seu conforto e vai até a mesa.

- Oi

Mesmo diante de um "oi" tão distante, ela recebeu de volta um sorriso complacente do garoto que estava à mesa. Ele era idêntico à menina. - Oi, me chamo Charles, e essa é minha irmã gêmea Catherine. Prazer em conhece-la! - ele esboçava uma expressão gentil, já a garota continuava neutra e muito dedicada em comer - Pode sentar-se conosco. Deixamos um pouco de pão para você, pode comer.

- Obrigada - comia caladamente.

- Não vai falar seu nome? - Novamente de forma inesperada, Catherine chama a atenção de Mira com uma das tantas perguntas que viriam. A menina relutou, por um breve momento, antes de responder - Mira. Me chamo Mira.

- De onde vem? Por que estava na floresta? E quem são seus pais?

- Paciência Catherine! Ela acabou de acordar.

- Eu sei, mas temos que saber quem ela é. Ou acha que vamos ficar conversando calmamente com uma completa estranha? - Mira observava em silêncio os dois irmãos enquanto se preparava para falar.

- Como eu já disse, meu nome é Mira. Venho da cidade, estou perdida e meus pais são John e Elizabeth.

- Com essas roupas... Você tem cara de burguesa - disse Catherine apontando para as roupas aparentemente caras, porém sujas, de Mira.

- É filha de algum senhor feudal Mira?

- Si- Sim. Charles.

- Sabia.

- Por favor Catherine - O garoto volta-se novamente para Mira após encarar a irmã com um olhar de "tenha educação". - Lembra a localização da sua casa? - Negando com um meneio de cabeça, a garota baixa a visão e volta a comer.
- Bom... Você tem que voltar para casa não é? Seus pais devem estar preocupados.

- Meus pais morreram. - Nesse momento, o silêncio não ficou somente envolvido em Mira, mas os três participaram.

- Me perdoe. Mas você precisa voltar para casa. Quem lhe cria? Avós, tios, primos?

- Agora é a minha madrasta. E eu não posso voltar para casa.

- Por que não menina? É a SUA casa, como assim "não pode" voltar? - perguntou Catherine enquanto levantava-se da mesa.

- Estou fugindo. - Os olhos de Charles se arregalaram e Catherine olhou com desconfiança para a mocinha.

- Mas você não havia dito que estava perdida? - Com certeza Catherine não deixava passar nada.

- E estou. Me perdi enquanto tentava fugir.

- Fugir do que exatamente?

- De ser mandada para trabalhar no campo do senhor feudal Richard Brown.

- Mesmo assim precisa encontrar um lugar para ir, se não irá morrer de fome e frio.

- Mas eu não tenho para onde ir! - De repente Mira levanta-se de sua cadeira com os olhos marejados - Meus pais morreram, minha madrasta me detesta, meu primo mora longe e eu sou pequena! - lágrimas quentes começam a rolar sobre suas bochechas agora ruborizadas.

- Acalme-se. - falou Charles levantando-se e passando a mão nos cabelos castanhos da garota. - Vai ficar tudo bem.

- Como?! - agora as lágrimas haviam se intensificado e Mira estava sentada na cadeira novamente, mas agora com as mãos trêmulas e repleta de ansiedade.

Ela não havia percebido antes, mas diante das tantas perguntas sua consciência finalmente clareou. Estava sozinha. Tinha somente o Papai do Céu como seu familiar naquele triste momento.

Então, ouviu-se um bater na porta de madeira rígida.

- É a mãe Aldara! falou Catherine apressadamente enquanto corria para ir abrir a porta. - "Mãe Aldara?", pensou Mira, "Quem será?". Ao abrir a porta, Catherine recebia a mulher com um intenso sorriso nos lábios, e Charles também compactuava do mesmo sentimento. Ela era bonita. Possuía uma longa cascata de cabelos castanho-escuro e vestia uma roupa característica das empregadas de famílias ricas. De repente, a mulher percebe a presença de Mira.

- Quem é a mocinha?

- O nome dela é Mira. É uma garota que veio da cidade. - Respondeu Catherine como um disparo de flecha.

"Mãe Aldara" entrou em casa, sentou-se à mesa e deu um longo suspiro. Aparentemente de cansaço. E então começaram as temidas perguntas.

- É amiguinha de vocês?

- Não, senhora.

- Não devia estar em casa pequena? O sol logo irá se por.

- Não posso voltar.

- Ora essa, qual o motivo? Não vá me falar que recebeu um sermão de seus pais? Isso é para o seu bem querida. - Mira olha para os lados e vê as expressões apreensivas de Charles e Catherine. Porém, mãe Aldara também percebe a intensificação do momento.

- Ou existe algo mais que vocês queiram me contar? - Disse a mulher com uma das sobrancelhas arqueada.

Charles contou tudo para Aldara. E a mulher escutava atentamente, com expressões de questionamento e surpresa.

- Só pessoas de um coração ruim COGITAM enviar crianças para Richard Brown. Aquele homem é horrível. Trata as crianças pior que esterco de gado.

- Então o que faremos mãe Aldara? - perguntou Charles.

Mira sentia um misto de euforia e medo. Medo do que viria. Medo de permanecer sem um lar. E de repente, ao ouvir a pergunta de Charles, algo automático sai de sua boca.

- Posso ficar com vocês? - Sua voz sai audível e clara. Mas as lágrimas logo retornam e ela fica novamente em silêncio. Esperando o veredito final.

Notas da ✨autora✨

𝑎𝑏𝑟𝑢𝑝𝑡𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑒: De modo inesperado, repentino.

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⏰ Última atualização: Oct 16 ⏰

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Saden: Prefácio - Maria Eduarda M.Onde histórias criam vida. Descubra agora